EU NÃO TROCO MEU NORDESTE POR TERRA DE SEU NINGUÉM
Lucas Carneiro
EU NÃO TROCO MEU NORDESTE
POR TERRA DE SEU NINGUÉM
Ê, tempo ruim, que não passa!
A coisa aqui anda é feia!
Até a água anda escassa.
No horizonte, esbraseia
O sol, cozinhando tudo
No céu, zangado e sisudo
Pena de pobre não tem.
Tá dura a vida no agreste!
Mas não troco meu Nordeste
Por terra de seu ninguém!
Seja no campo ou cidade
O sofrimento é um só
Seja criança ou de idade
A gente vendo, dá dó!
Tá é grande o desmantelo
Sem a quem fazer apelo
Sem comida e sem vintém!
Dificuldade inconteste!
Mas não troco meu Nordeste
Por terra de seu ninguém!
No peito, dor já não cabe
A cada amor que se esvai...
De chuva, já não se sabe
Faz tempo que aqui não cai.
E os açudes vão secando
Os recursos se acabando...
A vida não se sustém
Nessa estiagem da peste.
Mas não troco meu Nordeste
Por terra de seu ninguém!
No sertão não tem mais nada
Com a seca tudo acabou.
É uma pobreza danada!
O que a morte não matou
Se mudou de freguesia.
Em busca de melhoria
O povo é um vaivém
Entre a terrinha e o Sudeste!
Mas – eu! – não troco meu Nordeste
Por terra de seu ninguém!
Morre gente e morre bicho
De sede e de inanição.
É estiagem a capricho
Maltratando o meu sertão.
Pra se viver, haja engenho
Haja ideia, e haja empenho
Preguiça aqui não convém
E nem ficar de boreste.
Mas não troco meu Nordeste
Por terra de seu ninguém!
O quengo o sol castigando
Faz pensamento ferver
E assim, se vai ideando
O que se tem por fazer
Pra achar a sobrevivência.
Nordestino tem ciência
E com seu pouco se avém
De valentia se reveste.
Eu não troco meu Nordeste
Por terra de seu ninguém!
A fome é bicho sem zelo!
A gente, às vez, se aperreia
Devendo até os cabelo
E no espinhaço, só peia!
No sertão, nesta sequia
A terra não tem valia.
Socorro algum se obtém...
É esperar no Pai celeste!
Eu não troco meu Nordeste
Por terra de seu ninguém!
A fé é a única aposta
Que ainda resta. A minha gente
Chora e reza sem resposta
O joelho fica demente...
Nesse clima vexatório
Pede a Deus adjutório
Porque não o encontra aquém
Pra tal não há quem se apreste.
Mas não troco meu Nordeste
Por terra de seu ninguém!
Com preconceito e vaidade
Convívio bom não se encaixa.
Vai o povo pra cidade
Buscar serviço e não acha
E quer voltar pro sertão
Porque aqui no meu torrão
Nada ao pobre desconvém.
Quer pouco ou nada me reste
Eu não troco meu Nordeste
Por terra de seu ninguém!
Muita gente já partiu
Deu de garra do que tinha
Vendeu por pouco e saiu
Sem saber que mal lhe vinha.
Na terra alheia, o sofrer
É de botar pra correr
É humilhante e não convém.
Não tem quem daqui me arreste!
Eu não troco meu Nordeste
Por terra de seu ninguém!
É da índole nordestina
Ser valente, ser zangado
Mas meu povo é gente fina
Recebe bem pra danado
E apesar da brabeza
O povo não tem tristeza
Se o sofrer lhe advém
Com um sorriso se transveste.
Eu não troco meu Nordeste
Por terra de seu ninguém!
(Fortaleza, 11 nov. 2017 16h)