O BANQUEIRO E O MATUTO!!!
Na cidade eu vou pra feira,
Pra missa ou pra passear,
Ou mesmo pagar as contas,
Pra o médico me receitar!
Mas o campo me fascina
Pois a vida campesina
Traz-me encanto com certeza,
De nada tenho receio
Adoro habitar no seio
Da sagrada natureza.
Ali sou muito feliz
Vivendo por entre os montes,
Comendo os frutos da mata,
Bebendo água nas fontes,
Tomando banho nos rios.
As belas noites de estios
Induzindo a inspiração,
E sob o luar de prata
Faço a minha serenata
Ao som do meu violão.
Nada tenho a censurar
Do que mora na cidade,
Que leva um viver moderno
Com bem mais comodidade,
Praia, shopping, bons colégios,
Além de outros privilégios
Que na brenha não contém!
Podem me chamar de rudo
Porque dispenso isso tudo
Mas aqui me sinto bem.
Nos passeios matinais
Aprecio a alvorada,
Sinto meus pés encharcados
Pela campina orvalhada.
O ar chega com a pureza!
É o aroma que a devesa
Vem oferecer de graça,
Que seja inverno ou verão,
Sem conter poluição
Sem sujeira e sem fumaça.
Numa manhã acordei
Cedo, igual a todo dia,
Saí para olhar o gado
A pastar na pradaria,
Estando junto ao rebanho
Ouvi um barulho estranho
Vindo das bandas da estrada,
Onde um carro novo e lindo
Estava se dirigindo
Lá para a minha morada.
Era um homem da cidade
Guiando o belo carrão,
De paletó e gravata
Com uma pasta na mão,
Bem-educado, bacana,
Perguntou: essa choupana
Lá na encosta da serra
É a sua moradia?
Também saber eu queria,
Quem é dono dessa terra.
Ali vi umas vaquinhas
Lá no cercado pastando,
São suas? Ou o senhor,
Está só delas cuidando
Pra ganhar algum “dindim”?
E aquele açude enfim,
Também pertence ao senhor?
Por favor, fale a verdade,
É sua a propriedade
Ou é só trabalhador?
Quantos hectares têm
A pequena fazendola?
Cultiva alguma lavoura,
Milho, feijão, acerola,
Batata, aipim ou laranja,
Cria galinhas de granja
Ou só produz da caipira?
E ali naquela represa
Deve criar com certeza
Piau, tilápia e traíra.
O senhor tem quantos filhos?
E a esposa é do lar?
Ou será que é empregada
Trabalha noutro lugar?
No café almoço e janta
O senhor come o que planta
No canteiro ou no roçado,
Ou não dá para o sustento
Tem que comprar suprimento
Em algum supermercado?
Eu só estava escutando
Toda aquela indagação,
Mas perdi a paciência
E com muita educação
Disse-lhe assim: por favor,
Diga o que quer meu senhor?
Antes que eu tenha um chilique,
Pois sei que não é daqui!
Quem lhe mandou vir aqui?
Por favor, se identifique!
Eu estava sossegado
Cuidando da minha lida,
Aí me vem esse moço
Aporrinhar minha vida,
Querendo saber demais,
Pois eu sou daqueles tais
Que zela tudo que tem,
Sempre é farta a minha mesa,
Assumo qualquer despesa
Sem dever nada a ninguém.
Não tenho qualquer motivo
Pra lhe dar explicações,
Se nada estou lhe devendo
Então não vejo razões
Pra tanto me interrogar,
Porém resolvi lhe dar
Só uma chance restrita
E de modo decisivo,
Diga qual foi o motivo
Da sua infausta visita?
O rapaz olhou pra mim
Um pouco meio sem graça
Respondeu: eu sou do banco,
Mais forte que tem na praça,
E resolvi visitá-lo
No intuito de cadastrá-lo
Pra lhe deixar preparado
E com total competência
Pra ir lá à nossa agencia
Pegar dinheiro emprestado.
O nosso juro é barato
E cabe bem no seu plano,
Pense bem, é tão somente,
Cinquenta por cento ao ano,
Se quiser ir é agora!
A gente faz a penhora
Da sua terra e seu gado,
Paga uma taxa e talvez
Lá pelo final do mês
Seu dinheiro é liberado.
O campônio olhou pra ele
Com um olhar de ironia,
E disse assim, meu amigo,
Baixe noutra freguesia,
Eu sou um matuto pobre
“Mas, enjeito esse seu cobre”,
E pra ser bastante franco
Vivo só dos meus labores
Dispensando esses “favores”
Ofertados por seu banco.
Vivo do pouco que tenho
Pois dá bem pra o meu sustento!
E nem estou interessado
Em fazer investimento!
Sou bastante forte e bravo
Pra que não me torne escravo
Da sua instituição,
Com ela eu não me assemelho
Pois estou ficando velho,
Porém besta! Ainda não!
Carlos Aires
02/03/2019