Tese resignada do TEMPO

Tempo Matuto e Tempo Urbano

Chuva!!

Do céu despenca a chuva,

Endoidece o telhado.

Na fornalha crepita a lenha em chamas,

Em cima da trempe borbulha o angú,

Do girau desce o fio de picumã,

Sentada no banco da cozinha,

Com os olhos mareados,

A mãe amamenta o filho recém-nascido,

e com as mãos, cofia os cabelos de Nininha,

sua irmã.

Desolado no peitoril da janela,

Manoelzinho observa o horizonte.

Espera a chuva passar,

Para o sol voltar a brilhar.

E poder ver subir a fumaça da terra,

sentir o cheiro de relva molhada,

e com as barras da calça arregaçadas,

botar os pés no chão,

amassar o estrume das rezes,

trabalho que faz com zelo e apreço,

para nunca esquecer das carícias e dos queixumes da menina

que não vê há muitos meses.

Na boca noite,

Deusdete chega da roça.

Traz no embornal, umas espigas de milho,

A marmita suja e umas raízes de mandioca,

Que é para no dia seguinte,

A mulher ralar, espremer o suco,

Separar a massa para fazer o curau,

O beijú de farinha, a tapioca e o mingau.

Para alegrar o coração,

Sob a luz tênue e bruxuleante do candeeiro,

tira uns minutos para pontear a viola.

Enquanto faz isso com prazer,

Restaura a felicidade,

Manda a tristeza para longe,

Que às vezes, o amola.

Vida de matuto, é vida simples.

E resume-se numa mulher para amar,

Em meia dúzia de barrigudinhos para criar,

Em muitos cães campeiros,

Um alazão para montar,

uma viola caipira para pontear

e nas modas, as mágoas desabafar.

Pendurado na parede de barro da casa de taipa,

Os tic-tacs dos relógios dançam salsa, merengue e tango,

Apaixonam-se pelos encantos da vida que passam,

Apurando e refinando o canto noturno do curiango.

Vida de matuto é vida boa!

Pois, todo dia transpira a Natureza,

E a presença de Deus, a cada segundo,

Faz respirar o coração.

Depois da aposentadoria o que mais venero é o enriquecimento devido cada fio metálico do ajuntamento representado no bigode e nos cabelos pela cor da prata, os fundos vincados na cara, as carnes flácidas e despencadas e a sorte de poder respirar a beleza e o olor da flor. Sinto-me realizado e não enclausuro a mente e tapo os olhos para as conquistas que demandaram labor e fizeram-se ao longo do prestimoso TEMPO!

Bom dia!

PA

Mutável Gambiarreiro
Enviado por Mutável Gambiarreiro em 27/04/2015
Reeditado em 29/04/2015
Código do texto: T5221834
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