DE VOLTA A CASA VELHA (FINAL)
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Comi angu com feijão
Gorgulho, era a mistura
No lanche só rapadura
E assim tirava o verão
Um cuscuz, chamado pão
De milho, era um evento!
Chegar da roça grudento
E comer o que encontrasse...
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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Rapadura era o pudim
A constante sobremesa
No dia de mais grandeza
Sobremesa era alfenim
Colchão cheio de capim
Só palha por enchimento
Coçava ate pensamento
Não tinha o que não coçasse...
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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O remédio era chá
Pra tudo que era doença
Secura dor e “durmensa”
Pra gripe tomei jucá
Usei raspa de juá
Pra o cabelo caspento
O remédio do momento
Não tinha xampu que usasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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No ano que não lucrava
Que desse para comer
Papai saia a colher
No mato o que encontrava
Batata de imbu achava
Servia de alimento,
E “gogóia um complemento
Pra que a fome aliviasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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Comi melancia quente
Tomate braba e urtiga
Pra aliviar da fadiga
No roçado, sol ardente
Cabaça o recipiente,
Água fresca pro momento
Voltar tarde sonolento
Para o lar do meu enlace
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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Não queira me ignorar
Quando eu usava refugo
Pois foi o velho sabugo!
Que eu usei pra danar...
Tinha muito sem comprar
Facim ali no memento
Mesmo sendo “aranhento”
Importava se alimpasse!
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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Vi a maquina de plantar,
Milho, arroz e feijão
Atrás da porta num vão
A ferrugem a estragar
Sem abrir e sem fechar,
Seu único movimento!
Se acabando em passo lento
Não tinha mais quem plantasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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Quando a fraqueza apertava
Pai desleitava a jumenta
Eu bebi fechando a venta
Ele mesmo é quem dava
Um gosto estranho ficava
Só saia com alimento
Se não tinha no momento
Não tinha quem não engulhasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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Galinha botando ovo
Um milagre não ta choca
Da gema fazia paçoca
E a casca era um renovo
Pro velho e também pro novo
Pisadinha no alimento,
Ossos, fortalecimento
E o sangue reavivasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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Galinha,galo e capão
Bem no amanhecer do dia
Comiam com alegria
Quase nem caia ao chão
E naquela animação
Beliscava o documento
Tinha vez o sofrimento
Cada vez que beliscasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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Para sarar as feridas
Meu remedo era o mió
Era a língua de totó
Com linguadas repetidas
E as vezes nas lambidas
Usando de atrevimento
Mordia o ferimento
Impedindo que sarasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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Se totó pegasse um peba
Era a semana de festa
Pior que dava a molesta
“Nós se enchia” de pereba
Pra quem já tinha ameba
Aumentava o sofrimento
Doía até pensamento
Importava que escapasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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Quando o açude secava
Pai juntava a meninada
Uma festa animada
Na lama agente pescava
Uma arupenba eu usava
Piaba vinha de cento
Secava ao sol e vento
E o cheiro que incensasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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Sempre andava mancando
Tinha frieira nos pés
Os dedos rolando os dez
Os joelhos estalando
Os tornozelos inchando
Sem cálcio no alimento
Reumatismo meu tormento
Sem chá que me aliviasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
55
Se chovesse a noite inteira
Era num penico só
Chamado de urinó
A escapatória caseira
Era a melhor maneira
Em noite de chuva e vento
Quando enchia era tormento
Para o ultimo que usasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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Vovô até que ajudava
Mode nós num passar fome
Capava inte lubisome
Com os cunhão retornava
Mãe fervia depois torrava
Fosse de boi ou jumento,
Do barrão, mais fedorento,
Já comi, não tem desfasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
57
Por traz de um pé de araçá
Pai fez o nosso banheiro
La no final do terreiro,
Tinha também um juá,
E um cupim de arapuá
Esperando o bom momento
Abelhas sem vencimento
Quando eu nu me encontrasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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No meio a tanto sofrer
Ficou um que não falei
Pois eu muito que apanhei
Por não saber responder
Só bastava alguém perder
Qualquer coisa, desatento!
Pra eu pagar cem por cento
Do valor que se somasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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Hoje eu vejo a diferença
Dos tempos de antigamente
As lembranças vêm na mente
Sem espaço e sem licença
Do chalé vem a presença
Do antigo regimento...
Não posso dar seguimento
Por mais que eu reparasse
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
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E assim o tempo eu mato
Nas lembranças revividas
Nas entradas e saídas
Ainda afeta o olfato
Nem tudo vivi de fato
Mas vivo no sentimento
Dou nome de sacramento
Cada dia que renasce
Se a casa velha falasse
Contava meu sofrimento
FIM