ANCORADO NO PORTO DA SAUDADE!!!
ANCORADO NO PORTO DA SAUDADE!!!
Nasci no pé da colina
Por entre os vales da Serra
E vou descrever um pouco
Das coisas daquela terra
E até fico indeciso
Talvez, fosse o paraíso
Aquele lugar formoso.
E o que me desaponta
Vivi sem sequer dá conta
Que era tão maravilhoso
Cresci ouvindo os chocalhos
E o canto dos passarinhos.
Sabiás guriatãs
Canários e caboclinhos
Peiticas e bem-te-vis
Inhambus e juritis
Galos campinas craúnas
Ouvindo o mugir do gado
Que ficava acomodado
Nas sombras das baraúnas
O relinchar do cavalo
Por vezes o do jumento
Ouvia o som das cascatas
Sentia o sabor do vento
À tardinha ou de manhã
Gritava forte a acauã
E piava o cordoniz
A ovelha e a cabra berravam
Enquanto os anuns choravam
Cantava o belo concriz
Ouvia o som das rolinhas
A cantiga do vemvem
O canto do azulão
Do papa-capim, também.
O alegre rouxinol
No crepúsculo ou arrebol
Com a cantiga fagueira
Vinha à procura do ninho
Que fazia com carinho
Nos frechás ou na biqueira
Os dois cachorros latiam
Vigilantes no terreiro
O galo batia as asas
No alto do seu poleiro
Abria o bico e, no entanto
Bradava seu belo canto
Com beleza e elegância
E esses sons emitidos
Poderiam ser ouvidos
A quilômetros de distancia
À noite, era a mãe-da-lua
Com seu canto de langor
O bacurau saltitante
Não é tão bom cantador
Mas, mesmo assim bem que tenta
Logo a coruja agourenta
Dá o ar de sua graça
Com aquela sutileza.
E o guará na repreza
Rosna fazendo ameaça
Passarinhos se agasalham
Por sobre as árvores copadas
Afinando suas flautas
Para que nas madrugadas
Se reúnam em coral
E façam seu madrigal
Nessa tão silente hora
Numa hilariante farra
Saudando o quebrar da barra
No romper da nova aurora
Foi nesse clima amistoso
A minha infância feliz
Hoje habito na cidade
Mas, o viver não condiz
Com o da minha tenra idade.
E no porto da saudade
Ancorei a embarcação
Pra ficar chorando à toa
Relembrando a vida boa
Que vivi lá no sertão.
Carlos Aires 29/03/2012