Boi de Carro (Parte 1)

1

Já nasce com a triste sina

Ser macho sem preferir

Com formosura ou sem ela

Não pode se definir

Robusto por natureza

Não vale nada a beleza

Pois não serve pra cobrir

2

Nunca vai usufruir

Do bom prazer sexual

Vão tirar o seu vigor

O bom instinto animal

Na castração perde o nome

É macho mais nada come

Que pro homem é normal

3

Na cruel cena brutal

Arrancam o seu vigor

Outro macho lhe oferecem

Em vez de dar um amor

Morre sem gerar um filho

Guiado só por um trilho

De nome carreador

4

Do nascer ao sol se por

Vivenciando uma guerra

Sem comer e sem beber

Descendo ou subindo serra

Ganha nome de boi manso

Mais nunca tem um descanço

Na trajetória da terra

5

Quando o carreiro lhe ferra

Cum ferrão ponta de agulha

E a ponta atravessa o couro

Em sua carne mergulha

De noite não sente nada

Mas o dono da furada

Suporta a dor da borbulha

6

O malvado nem embrulha

Com gaze ou algodão

Lhe grita quando amanhece

Usa de novo o ferrão

Lhe bate no seu espinhaço

Não pensa no seu cansaço

É de cortar coração

7

E tendo que andar na mão

Não pode fazer desvio

O que come toda noite

De dia causa arrepio

Sem parar pra remoer

Trabalha pelo comer

Té apagar o pavio

8

Pra testar se tá sadio

Dão uma canga pesada

A fêmea só ver de longe

De perto não faz mais nada

Com a canga no pescoço

Envelhece mesmo moço

De tanto levar pancada

9

Quando a terra tá molhada

Puxa o arado lentamente

Pisa firme rasga o chão

Com duas patas somente

Duas na terra ou no ar

Num compasso sem errar

Nem pisa a pata da frente

10

Se acostuma com a gente

No ditado estão fritos

Desconhece a sua força

Seus braços viram palitos

Transformam sua braveza

Convergindo em singeleza

Com as porradas e os gritos

11

Num gesto muito esquisito

Deixa de lado a postura

De herói e rei da força

Pra sofrer na ferradura

Mistério que não se explica

E só quem pode dar a dica

É quem fez a criatura

12

Nessa sua compostura

Vive o boi de noite e dia

Separado pro trabalho

Uma eterna covardia

Recebe um colar e canga

Come preso em vez da manga

Obedecendo ao seu guia

13

Sem contar a harmonia

Que tem que ter ao parceiro

Um vai o outro vai junto

Na areia ou tabuleiro

E o carro de boi cantando

E os dois cansados puxando

Tem fama, mas sem dinheiro!

14

Esquentam igual braseiro

Seu pescoço e o cocão

Um respira com a dor

O outro só grita então

O cocão grita com o peso

E os heróis do desprezo

É quem garante a tração

15

Com cascos firmes ao chão

Se estrupiam sem ver

Pisando em pedra e toco

Pois não dar pra escolher

Pisa lá onde o pé for

Se errar suporta a dor

Pois só nasceu pra sofrer

Jailton Antas
Enviado por Jailton Antas em 03/07/2011
Reeditado em 11/07/2015
Código do texto: T3072711
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