UM MATUTO NO TEATRO DA ELITE!!! (Causo)
UM MATUTO NO TEATRO DA ELITE!!!
(Causo)
Veja o que se deu comigo!
Inventei de ir pra cidade
Pra visitar um amigo
De boa escolaridade
Com bom nível literário
Um jovem universitário
De futuro promissor
Rapaz fino de bom trato
Que adora as coisas do mato
E o povo do interior!!!
Marcelo é o celebre nome
Pertence ao clã dos Morais
Que apesar do sobrenome
É um cara simples de mais
Disse a mim: no dia quatro
Vem pra nós ir ao teatro
Pra assistir um festival
De cultura e de lirismo
Com encanto e romantismo
Vai ser lindo o recital
Na data estabelecida
Cedo peguei a estrada
A viagem divertida
Chegou na hora marcada
Desembarquei do transporte
Pra que me desse suporte
Logo Marcelo chegou
Bom amigo não se atrasa
Levou-me pra sua casa
Aonde me acomodou
Eu que nunca tinha ido
Visitar a capital
Também não tinha assistido
Uma peça teatral
Sem conhecer etiqueta
Vesti a minha jaqueta
Coloquei chapéu botina
Lá vou eu na inocência
Sem conhecer a exigência
Que tem na festa grã-fina
Marcelo por sua vez
Também não me disse nada
Com a sua polidez
De pessoa refinada
Sem ter o menor intento
De causar constrangimento
A esse matuto arigó
Deixou-me ir como estava
Porém lá só adentrava
De gravata e paletó
Chegamos à portaria
Foi grande a decepção
O guarda que atendia
E controlava o portão
Olhou pra mim com desdém
Disse, não entra ninguém
Sem ser uniformizado
Marcelo disse amigo
Preste atenção no que digo
Ele é meu convidado!!
O guarda olhou pra Marcelo
E disse aqui tem limite
Não irei quebrar o elo
Da corrente da elite
Que bem capricha na beca
E não vou deixar um Jeca
Um caipira pobre e bruto
Entrar para o auditório
Nesse ambiente notório
Num tem lugar pra matuto
Depois de muita conversa
Pude entrar no ambiente
A situação inversa
Já me deixou descontente
E logo perdi o pique
Naquele lugar tão chique
Fiquei muito sufocado
E sem respirar direito
Passei sofrer o efeito
Do ar condicionado
Aquietei-me num assento
Pus-me olhando atentamente
Não me senti a contento
Nesse lugar diferente
Tinha umas luzes piscando
Acendendo e apagando
Eu fiquei só de pensar
O guarda tinha razão
Um matuto do sertão
Não cabe nesse lugar
Quando a casa tava cheia
Logo o show teve início
Uma poesia feia
Pra mim era um estrupício
O povo todo aplaudia
Um chorava outro sorria
Era aquela confusão
Eu sem achar nada belo
Disse ao amigo Marcelo
Que não senti emoção
Eu gosto é de cantoria
De forró numa latada
Sinto bem mais alegria
Curtindo uma vaquejada
E exponho minha idéia franca!
Essa poesia branca
Dela não sinto o sabor
O letrado acha bonito
Porém eu acho esquisito
Porque não sei dá valor
E não estou criticando
Vou esclarecer o fato
Se me criei escutando
A poesia do mato
O cantador violeiro
O aboio do vaqueiro
Repentista de embolada
Então amigo, acredite
Da poesia de elite
Eu não entendi foi nada
Eu gosto de ouvir poema
Que fala de pé de umbu
Camaleão, seriema
Facheiro, mandacaru
Eu sei que não tem lirismo
Mas retrata o realismo
No qual vivo habituado
E o recital primoroso
Não vale um verso saudoso
De um vaqueiro apaixonado
Esses poemas são cheios
De requinte e elegância
E sei que eles não são feios
Mas a minha ignorância
Não sabe identificá-los
Se não posso apreciá-los
Nunca vou absorver
A sua essência poética
Por desconhecer a ética
Jamais irei entender
Portanto a festa elegante
Serviu-me de ensinamento
Pra mim foi angustiante
Passar por acanhanmento
Gosto é da festa na roça
Pois quem mora numa choça
Lá se diverte também
Sem pompa nem regalia
Mas não perde em alegria
Pra teatro de ninguém
Portanto, poeta nobre
Que escreve com primor
Nossa poesia pobre
Mesmo sendo inferior
Pode ser arcaica, rude
Mas em sua plenitude
Também exibe esplendor
Toda poesia encanta
Por ser Divina, ser santa
E recheada de amor!!!
Carlos Aires 04/06/2011