MEU SONHO...- Cordel Matuto
MEU SONHO...
Literatura de Cordel
Autor: Bob Motta
N A T A L – R N
2 0 1 1
Onte, eu sonhei incontrando,
numa istrada, um véio tristonho.
Cum oiá lacrimejante,
me dixe, munto preconho:
Me arresposte, meu rapaiz;
no peito, o qui você traiz ?
Me fale sobre o seu sonho!
P’ru véíin, alí na hora,
cum munto respeito, ôiêi.
Na paiz daquêle sembrante,
do véíin, eu méigúiêi.
E prá aquêle incião,
do fundo do coração,
in meu verso, arrespostei.
Meu véio, trago in meu peito,
ais lembrança do passado.
Coisa boa e coisa rim,
tudo o qui andô do meu lado.
O qui chorei, qui sufrí,
o qui ganhei, qui perdi,
quando àis fera, eu fui jogado.
Secréla de um aiculirmo,
crué e impiedôso.
Abandono, humiação,
e um sufrimento horrorôso;
quando ainda, eu munto môço,
cheguei no fundo do pôço,
meu véio, era dolorôso.
A mêrma sociedade,
qui infruencía a bebê,
quando nuis vê na disgraça,
finge nem nuis cunhincê.
Sem remorso, sem carêta,
joga a gente na saigêta,
prumode a gente morrê.
E eu, véio; qui nem um ríi,
à meicê da própria sorte,
na correnteza do áico,
do qui eu; munto mais forte;
fui inrrolado na trama,
p’rum oceano de lama,
qui tinha um fim; minha morte.
Mais antes, fui resgatado,
puros irmão do AA.
O amô da minha musa,
num dexô eu me acabá.
Ela foi e é uma guerrêra,
minha amada cumpanhêra,
qui in verso, eu vivo a izartá.
Bebi trinta e um ano,
seis mêis, dizessete dia.
Bebendo mode drumí,
me acordando no ôto dia;
cumo um bebum boa praça,
abedecendo à cachaça,
e ao má qui ela me fazia.
Hoje faiz dezoito ano,
qui num ingiro aguardente.
Nem quaiqué ôta bebida,
aicóolica, naturamente.
Dô inzempro de respeito,
de cumo sê bom sujeito,
num invéigonho minha gente.
Mais trago lembrança boa,
qui da mente, num me sai.
Do colo da minha mãe,
dais viagem cum meu pai.
Do seu oiá firme e duro,
duis seus cunsêio siguro,
qui prá minha tumba, vai.
Trago o jôgo de suéca,
o véio motô de luz,
ais prece prá São José,
a quaiáda e o cuscuz.
O macássa sem mistura,
a farinha, a rapadura,
e ais oração prá Jesus.
Trago a jumenta no cio,
o jumento garanhão,
ais cabra, ais uvêia, ais póica,
bode, carnêro e barrão.
Trago tombém; num me acanho;
fuguêra de Santo Ontonho,
de São Pêdo e de São João.
Ais festa de padruêra,
ais retreta, ais aivorada,
banda de musga tocando,
bem cêdíin, de madrugada;
uis minino acumpanhando,
a cidade se acordando,
e uis pôvo in pé, nais caçada.
Uis páique de divéição,
carrocé, roda gigante,
ais canoa de balanço,
e a difusora falante.
Uis minino aperriando,
e disafôro iscutando,
duis véio mais inguinorante.
Trago junto, o boi de rêis,
a lapinha, o pasturí,
ais festa de apartação,
do meu véio Carirí.
Tombém trago na poesia,
ais sardosa pescaria,
no véio Ríi Potengí.
Trago a burrinca rodando,
ais briga duis fim de fêra,
violêro e canturia,
e uis tiro de ronquêra.
Trago uis vistido de xita,
e uis lindo laço de fita,
dais cabôca mais facêra.
Trago a maiação de Judá,
a gritada de paiáço,
ais rêde aimada nuis tôrno,
nuis aipende, nuis terraço.
Uis gimido nuis acêro,
nais prenumba duis terrêro,
dais cabôca, nuis amasso.
Trago o cavalo de campo,
trago o cavalo baxêro,
uis namôro improibido,
nais sombra duis juazêro.
O canto da sariema,
qui se transfóima in poema,
e o abôio do vaquêro.
Trago ais prosa duis pião,
dento duis alojamento,
o carro de boi cantando,
e a cangáia do jumento.
A professôrinha da iscola,
o açaprão, a gaiola,
mais, sem passaríin dento.
Trago a Budega Véia,
trago o fardo de jabá,
trago o gato da zinebra,
e a agúia de palombá.
A meiota de cachaça,
e uis bebum fazendo graça,
pidindo a arguém prá pagá.
Trago o fole de oito baxo,
o triângo e o melê,
qui era o zabumba de ôtróra,
mode alegrá voirmicê.
Trago o imboladô de côco,
o cachimbo do cabôco,
qui é parte do meu vivê.
O véíin ôiô prá eu,
e dixe: Eu num me acanho.
Sua resposta vêi boa,
e grande; dêxe tamanho.
Mais na resposta, meu sinhô,
o amigo num falô,
coisa aiguma do seu sonho.
Aí... Eu dixe p’ru véio:
Eu sonho cum um País,
adonde izista iguardade,
e uis pôvo seja feliz;
adonde o rico e o pobre,
tenha o coração nobre,
é tudo o qui eu sempre quiz.
Adonde uis gunvernante,
seja pessoas decente,
dê tudo puro seu pôvo,
zele pura sua gente;
dê saúde, educação,
a impregado e patrão,
abastado ô indigente.
Qui arrespeite ais tradição,
idôso e apusentado,
pagando um saláro justo,
a quem já deu seu recado;
e qui uis pôvo, seu minino;
chore quando uví seu hino,
nacioná, sê tocado.
Qui num inzista criança,
nuis siná nem nais caçada,
nem ais jove adolecente,
se venda dispudorada.
Nem qui uis pobrezíin sem nome,
vegete, passando fome,
sem moradia, sem nada.
Eu sonho cum êsse País,
adonde, a bem da verdade,
tanto o rico cuma o pobre,
saiba o qui é felicidade.
Cum derêito a disfruitá,
dela, tu pode apostá,
cunfóime a sua vontade.
Quando eu parei de falá,
o véio foi me abraçando,
pôis a cabeça in meu ombro,
cuntinuô me apertando.
Quando conta disso, eu dei,
qui p’ru véíin, eu ôiêi;
o pobre tava chorando...
Autor: Roberto Coutinho da Motta
Pseudônimo Literário: Bob Motta
Da Academia de Trovas do RN.
Da União Brás. de Trovadores-UBT-RN.
Do Inst. Hist. e Geog. do RN.
Da Com. Norte-Riog. de Folclore.
Da União dos Cordelistas do RN-UNICODERN.
Da Ass. dos Poetas Populares do RN-AEPP.
Do Inst. Hist. e Geog. do Cariry-PB.
E-mail: bobmottapoeta@yahoo.com.br
Site: WWW.bobmottapoeta.com.br
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