A marreta da morte...MOTE
A marreta da morte é tão pesada
Que a pedreira da vida não agüenta. O MOTE
Eu me pus a olhar pela janela
Vi um velho ancião e sua cadela
Que andavam na rua bem tranqüilos
Eu fiquei a pensar cá nos meus filhos
E olhando de novo para a rua
Fui sentindo aqui, na carne nua,
Que tempo que me resta é quase nada
Mas se nisso encafifar a mente esquenta, e
A marreta da morte é tão pesada
Que a pedreira da vida não agüenta
Logo, logo mudei de pensamento
Pois temer a morte é ser jumento
Quem quiser que fique a contar
Seu próprio tempo, pois vai acabar,
De qualquer jeito, estirado num leito
Muito duro... Muito frio e muito estreito
É por isto que minha mente afugenta
A morte que é certa e está na estrada
A marreta da morte é tão pesada
Que a pedreira da vida não agüenta
Viajo por ai... Me benzo e pego a estrada
Peço a Deus que proteja todos os meus
Digo sempre até logo!... Nunca adeus!...
Dou um beijo nos filhos e na amada
Olho firme pra frente fixo a vista
No horizonte até onde ela avista
Dou um jeito no cabelo e se aumenta
A estrada a seguir... Aumento a passada.
A marreta da morte é tão pesada
Que a pedreira da vida não agüenta
Nunca olho para trás que é prá dar sorte
Duvido de quem diz: Não temo a morte!
E, quando adoece, só um dia, de repente
É o primeiro a correr feito demente
Incomodando do doutor às empregadas
De tão histérica... Se torna violenta.
A marreta da morte é tão pesada
Que a pedreira da vida não agüenta
Mais que merda de vida é esta
Que nos leva a andar de festa
Em festa a beber e a fumar
Num sem sentido, e a arrumar
Sempre brigas com a patroa
E de ressaca mesmo que doa
Ainda a cabeça... Dizer que lamenta
E fingindo, justifica pra amada que:
A marreta da morte é tão pesada
Que a pedreira da vida não agüenta
Vejo filmes, jornais e tantas coisas
Quando ligo por um instante a TV
Que fico a perguntar-me: O que você
Absorve disso tudo? Tantas coisas
A fazer e você parecendo um idiota
Vendo a especulação na bolsa... Agiota
Eu sei você não é!... E o volume aumenta
Até quase ensurdecer! Que nada!...
A marreta da morte é tão pesada
Que a pedreira da vida não agüenta
Por que não se olha no espelho?
Por que não ouve meu conselho?
Por que não se volta pra leitura?
Por que, de novo, não lê a Escritura?
Será que se acha assim tão importante?
Será que nem mesmo por um instante?
Você não entende que é um nada
Diante de Deus, que te alimenta e avisa:
A marreta da morte é tão pesada
Que a pedreira da vida não agüenta
Não use o teu machado contra o tronco
Nem fira com tua faca outro homem
Ainda que você se ache um bronco
Ainda que o julgue um lobisomem
Porque andas por aí de barba por fazer
O que melhor tem a fazer é entender
Que aqueles que o julgam pouco ou nada
Sabem do mundo e de você!... Sustenta:
A marreta da morte é tão pesada
Que a pedreira da vida não agüenta
Vou dormir que por hoje
Já me basta. Sinto sono, sim,
Também pudera! Mesmo assim
Me dou por satisfeito. Do alforje
Tirei todos os versos que julguei
Estivessem hibernando. Os tratei
Com o carinho de outrora, mas a danada
Da hora de dormir é sagrada e alimenta.
A marreta da morte é tão pesada
Que a pedreira da vida não agüenta
Eis que diuturnamente
Um vento sempre batia
Sobre a crista da montanha
Se involuntário ou não,
Que importância é que tinha
....
E vai assim desgastando
Numa infatigável erosão
Até que um dia a montanha
Ficará colada ao chão
Este vento é meu destino
E a montanha sou eu!
A marreta da morte é tão pesada
Que a pedreira da vida não agüenta
As despedidas são assim tão ou mais cruéis
Como amputar os dedos só pra ficar com os anéis
Quem fica, fica que nem um cavalo castrado
Ante o pasto cheio de égua no cio
Fica que nem burro brabo pareado
Com o domador bem na beirada dum rio
Sem saber se amansa e dá o costado
Pra montaria do dono. Ou se arrebenta, pois
A marreta da morte é tão pesada
Que a pedreira da vida não agüenta.