Descaminhos
Sigo os passos de pegadas apagadas. Um oásis de poeira insiste em mudar de lugar. O vento consola com a brisa de dunas movediças, que assopram as misérias de forma lenta. A dor faz o tempo caminhar com passos lentos, onde é possível medir cada passada, já que as observamos na calma dos aflitos. O consolo de arrepios medonhos que eriçam o capim verdejante capilar. Na fuga da selva empedrada que devora os nativos, com suas bestas-máquinas, que cospem fogo e fumaça, como verdadeiras crias demoníacas com hálito de enxofre. Suas bocas de ferro trituram a frágil carne, que cede diante da opressão de poderosas mandíbulas. O vômito de fuligem se espalha pelo ar, criando nuvens negras de um céu opaco. O sol se esconde diante da nova senzala, com feitores burocratas e troncos empregatícios, que açoitam as costas duras proletárias. Nem a foto pendurada em destaque consegue amenizar este sofrer. Degustando pedaços esquartejados e outras espécies, em formatos que conseguem entreter os olhos, que são a barreira para o paladar. E os cegos também se convencem, já que seus outros sentidos, que servem de outra visão, também são seduzidos.
Os obeliscos da intolerância começam a ruir diante das tempestades de amor, que possuem fortes lufadas de sentimento. Cada coração abre-se em flor de sangue, circulando em artérias de paixão, lutando contra a falta de circulação de uma inoperante vontade. A melancolia se espalha, desejando mais metástases, até que faça sucumbir aquelas mentes que lhe acolheram no frio de outonos duradouros, que roubaram a delicadeza das folhas secas dos invernos, criando um tempo que se cristaliza em blocos de concreto. Nada mais de passos, já que as sombras vagueiam sem tocar o solo, como espectros que perambulam em um limbo de claridade duvidosa. As mariposas de sonhos, aparecem e desaparecem da imaginação vaga de esquizofrênicos sonâmbulos. Com poças de mármore edificando um estatuário de vítimas do holocausto civilizador. Anjos de asas quebradas, caem sobre o solo bruto, como estrelas decadentes de um céu inexpressivo. Todos os dias se tornam domingos, já que estamos na metade de algum século insuperável.
É possível ver a chuva mansa, com gotas de ácido, desaguando sobre casas em chama, que formam uma vila-fogueira. O gelo do menosprezo, solidifica as emoções e tornam as pessoas invernais. No lago lodoso o barco é decorativo, servindo de abrigo a cupins vorazes, devoradores de tudo que há para ser consumido. Enquanto mares vulcânicos regurgitam lava incandescente, com ondas inavegáveis que rebentam sobre a rocha derretida, criando estalactites passageiras, abrindo fendas com uma fome insaciável. Com a paisagem estacionada nas órbitas ocas de cavernas oculares, representando a última passagem, que será a primeira aos olhos de quem ainda acredita. Na revoada de gritos-corvos que crocitam em ecos do aquém. Buscando as montanhas invertidas que chegam ao cume do centro do planeta-proveta. Cada fuga abre novas celas. Cada outro gera um outro de si, com cada alteridade reivindicando o direito de ser. Serviçais que se dobram ao nada na falta de mestres. Estalando pescoços que se alongam a procura do que lhes sufoca. Esquecendo a receita do avestruz e marchando com ares de girafa. Perdendo os membros e se arrastando pelo chão arenoso, feito serpentes desajeitadas, que engolem a própria alma com intuito de saciar a fome de destruição.
Tudo se foi no crepúsculo da última oração, calada com o estrondo do fechar de um caixão. Restando o vazio que feito um assovio incomoda o espaço, se imiscuindo pelos hiatos rarefeitos do templo da relatividade. Nem a saudade sobreviveu ao fim do luto, trocado pelo nulo que é fruto de um absurdo quase presumível. Invisível ao que tenta enxergar, selando as pálpebras de pontos de vistas que seguem em uma reta circular, que se entrelaça formando o DNA de um niilismo condenado a se metastasiar.