Cecil

Ela estava com uma faca na mão, vestindo o avental azul escuro com flores claras, enquanto ele estava colocando a serra na mesa, com sua .45 dentro do coldre, aberta e recém disparada.

Foi um estampido seco, suave, como o cair de uma cadeira.

E o fio de sangue corria por aquele sótão velho e poeirento.

Ela queria vingança, e ele dinheiro.

Ela tinha raiva de todos os homens do mundo, menos dele, ele estava mais para um monstro mesmo. Como ele mesmo se chamava às vezes, o Demônio Prateado, graças a sua .45.

Ela pegou um pincel grosso, feito de pelos de cavalo e começou a desenhar no chão, ele não sabia muito bem o que era, nunca estudou, apenas tinha feito trabalhos braçais e era burro feito uma porta, mas manejava um revolver como ninguém.

Então ele largou de vez a serra, a olhou nos olhos, e viu pela primeira vez os olhos de uma assassina, nunca se sentiu tão confortável. Talvez se lembrasse de algo parecido quando ficava na casa da avó quando pequeno, enquanto ela fazia bolos para ele engordar, mas nada era comparado a aquilo, eram olhos saciados, calmos, serenos, com um dom para a arte com tinta vermelho sangue.

Molhava as cerdas do pincel naquele rombo de bala feito na cabeça da perua velha, tomando cuidado – inútil – para não lhe manchar os brincos que ficaram pendurados debilmente naquela carne branca, velha e agora morta cabeça.

Ficava desenhando gaivotas, um sol vermelho, uma possível praia talvez?

O Demônio a olhava pintando, e ela sorria satisfeita, feliz, cantarolando uma musica velha do Doors...

- This is the end, my only friend, the end...

De quando em vez, olhava para ele e o via parado ali, apenas olhando para ela, notando que ele suava frio, como se fosse algum tipo de animal bruto, perfeito para ser o macho alfa.

Ele era grande e desajeitado, 1,90 de altura, aquele tipo branquelo 4x4, com cabelos ensebados e curtos, castanhos, mas já pareciam pretos pelo pó e óleo capilar, e talvez um resquício de gel.

Enquanto ela já era menor, 1.55, magra, sem corpo, sem pernas, apenas com dois languidos e pueris olhos que lembravam favas de mel, era de fato, uma mulher sem sal.

E ela seguia cantando alegre sua canção, mesmo sabendo que ela só conhecia o refrão, enquanto passava o pincel banhado de vermelho escuro – começava a coagular, e ela a se irritar com isso – nas janelas, tapetes e quadros, enquanto ela via seu demônio babando pela sua bunda magra.

Ele sussurrou:

- Cecil, eu quero mais...

Ela, sem entender, respirou fundo, encostou o pincel no pescoço, deixando-o manchado, e o olhou com cara de tacho.

- Cecil, eu quero ver mais, posso?

- Ver mais o que Prateado?

- Você cantando... Pintando... Não entendo nada dessas coisas, mais é bonito te ver assim... Eu acho...

- Prata, para com isso, limpe a bagunça como sempre, depois pegue a cabeça da perua e pendure em algum lugar, temos que esperar o velho broxa chegar para acabar com ele, e depois disso meu querido demônio, venha para cá, quero falar com você sobre essa tua vontade.

- Certo Cecil, certo...

E lá vai o brutamontes de 110 quilos de puro musculo suado e potente a carregar o corpo, mas não sem antes de cortar o “balde” de tinta fora.

Ele pega a sua fiel serra tico-tico, herdada de seu avô que morreu com a garganta cortada por causa de um “acidente”, e abre a cabeça em dois, deixando a maior parte com o brinde cerebral para fora, para despejar no lixo, e colocar mais “tinta” dentro.

E puxa a velha coroca, com o mesmo cuidado débil com os brincos.

Dado cerca de cinquenta minutos, ele volta empapado em sangue fresco, suado e fedendo. Chamando baixinho pela mulher pequena que está sem camisa, usando um sutiã preto rendado velho, com alguns minúsculos elásticos de fora e uma calça jeans manchada de marrom-sangue-seco, enquanto ela segura o pincel no pescoço, fazendo com que o sangue escorra pelas costas pálidas.

- Prateado, você já acabou o serviço?

- Cortada como a senhora gosta, seca sequinha, pendurada pelos pés no gancho, esperando que você apenas vá vê-la.

- Ótimo! Agora venha cá meu demônio querido.

Ele foi caminhando até ela, olhando o que havia virado aquele sótão velho cheio de caixas, quadros e tapetes pendurados, tentando entender o que ela desenhou, mas era muito grande, e não parecia nada com gaivotas, ou sol, ou uma praia.

Ele para na frente dela, respirando feito um touro manso depois de cruzar, e ela lhe entrega a faca, e o ordena:

- Corte-me.

- Cecil, mas eu não quero... Só quero ver você cantar e pintar – reclamou feito uma criança.

Cecil faz uma cara de brava, assim como uma mãe faz com o filho.

- Corte agora!

Ele respirando fundo, coloca os braços atrás dela, como se fosse dar um abraço simples, e corta o sutiã pela parte de trás, enquanto ela suspira lentamente, como se fosse um prazer exótico sentir o sangue seco, a faca, e as mãos do seu demônio.

- Continue Prata, continue.

Outro suspiro do Demonio Prateado, e ele começa a cortar a parte de trás da calça, abrindo um buraco no jeans, bem no meio das nádegas.

Ela segura as mãos dele, e vira de costas para o gigante que estava a frente dela.

- Agora.

- Cecil...

- Eu disse agora – suspirou ordenando.

Ele se ajoelha, e com sua força descomunal, termina de rasgar o jeans sujo de marrom-sangue com as mãos, e começa a beija-la delicadamente.

Ela suspira, exalando seu perfume de sangue no ar.

Algumas horas depois, ela está deitada no enorme peitoral do seu demônio suspirando aliviada, lhe pergunta:

- Prata, você sabe o que eu pintei hoje aqui?

- Não Cecil... O que é? – perguntou num tom infantil e curioso.

- Levanta e olha bem...

O Demônio Prateado se levanta devagar, e começa a reparar, aquilo que ele imaginava serem gaivotas, eram fios de sobrancelhas, o sol, era um olho, e o que pensou ser uma praia, era na verdade, o desenho de um sorriso triste e forçado... Parecia ser alguém muito conhecido dele, e ele questiona:

- Cecil, quem é?

- Prata... Eu pintei você...

Minari
Enviado por Minari em 31/01/2013
Reeditado em 01/04/2013
Código do texto: T4115219
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