CONTO DE TERROR E SUSPENSE: A BICICLETA AMARELA (3199 palavras- reeditado) CLTS 26
Canafístula é uma cidadezinha a quase 500 qui-lômetros de capital. Sempre teve em torno de 2.800 moradores. E, como uma típica cidade do interior, quase todos são da mesma família. No fim de tarde, ainda é comum ver aquele mar de crianças brincando no campinho da principal ou na pracinha em frente à igreja. Conversando com alguns moradores, tudo confirmava que Cana, como era carinhosamente chamada, era um re-canto esquecido do nosso Brasil, talvez por isso, as coisas por ali caminhavam a passos lentos. Sentia-se no ar que ali a vida não tinha pressa e nem pa-ra onde ir. Já eu, infelizmente, eu estava ficando sem tempo, já que a minha pesquisa para o mes-trado estava no limite do prazo. Sobre o que eu estava pesquisando? Justamente o perfil da vio-lência nos pequenos municípios do nosso sertão.
Assim que cheguei na cidade fui ao posto de polí-cia pedir, ao sargento ver o livro de ocorrências. Com o livro em mãos, percebi que escrever minha dissertação seria algo nada desafiador. O livro de registros estava praticamente em branco. O crime que o inaugurava era um roubo de gado de 2015 do sítio de seu Horácio Pordeus.
Perguntei ao policial se havia mais alguma infor-mação sobre os crimes que eu pudesse acessar. Ele me disse, que se eu quisesse saber sobre os crimes antigos tinha que solicitar na delegacia geral, porque era lá que estava o arquivo. Subi na moto e fui. Bastava descer a serra e já se via a cidade dos dinossauros.
Na delegacia central, apresentei a minha solicita-ção a um jovem escrivão, que após algumas con-sultas confirmou que eu estava falando a verdade sobre ser um professor e estudante de mestrado fazendo uma pesquisa; consegui o acesso aos da-dos que eu precisava. Três velhos livros empoei-rados: “Em plena era digital tudo ainda era regis-tro em papel”, pareceu que o policial leu minha mente.
O primeiro livro cobria o período de 1910 a 28/12 de 1929, o segundo de 1961 a 1980 e o terceiro de 1981 a 2000. Então conclui que o livro que o sar-gento me mostrou cobri o período de 2001 a 2020. Os crimes que encontrei no arquivo? Uma morte por arma branca devido a uma briga familiar por terra, questão de herança. Um homem acabou as-sassinando 3 irmãos na década de 1920. Além dis-so, havia alguns pequenos furtos e arengas de bar, nada que chamasse muito a minha atenção en-quanto pesquisador. Para minha pesquisa aquelas informações serviriam para confirmar que as pe-quenas cidades do sertão são verdadeiros oásis para se viver.
Como já estava na boquinha da noite, voltei à Ca-nafístula e pernoitei na casa do professor Valcir Itaporanga, meu tio avô, que morou boa parte da vida naqueles sertões.
Depois do jantar, tio Valcir me perguntou como estava indo a minha pesquisa. Eu lhe disse que Lastro parecia a melhor cidade do estado para se viver, uma vez que fazia mais de dez anos que não ocorria crime algum por ali.
Acendendo um cigarro de palha, ele me pergun-tou se eu tinha visto os livros de ocorrência anti-gos. Eu lhe disse que sim e aparentemente não havia nada demais, a não ser por algo no mínimo inusitado: não houve ocorrências entre os anos de 1930 a 1960! Então, tio Valcir se levantou e foi ao seu armário, pegou um baú pequeno e o colocou sobre a mesa. Dentro havia um pacote enrolado num papel parecendo um presente. Aparente-mente era um livro. Na primeira folha estava es-crito: Lastro, delegacia distrital: 1930-1960. Eu havia percebido que estava faltando, um volume, mas imaginei que tinha sido pela falta de ocorrên-cias. Mas nunca pensei que ele estivesse em posse do meu tio.
Abri-o. Passei à segunda folha e estava escrito: 31/12/1930- Criança; homicídio; caso em aberto; nenhum suspeito indiciado: O menor J. P. de 13 anos de idade foi dado como desaparecido pelos pais às 21:00 horas do dia 30/12, após os mesmos o procurarem em casas de familiares e amigos. Às 23 horas do dia 31/12, nos terrenos de cima pró-ximo à pista, o corpo do menor foi encontrado. Causa da morte: hemorragia causada por múlti-plos traumatismo. Ao lado dele, havia uma roda de bicicleta, ao que parece, desenterrada de algu-ma forma pela vítima pois as suas mãos e as unhas estavam visivelmente sujas de terra. Res-ponsável pela ocorrência, Sargento Gonzaga. Obs: crime com pontos em comum com o assassinato que ocorreu em 31/12/1929, o caso do menino da bicicleta amarela, ainda sem solução.
“Mas que caso era esse de 1929 que eu não havia visto lá nos livros na delegacia?” ─Pensei comigo. Continuei a folhear e mais nenhuma ocorrência havia sido registrada. Então, tio Valcir disse para eu ir à data 01/01/1940. Estava descrito quase que o mesmo crime de 1930/31, mas não era uma cri-ança: Homem jovem; homicídio; caso em aberto; nenhum suspeito indiciado: O jovem Dário de 22 anos, apesar de ter sido procurado por seus pais e parentes, não foi encontrado e nem visto por tes-temunhas após as 18 horas do dia 30/12. Às 23:45 horas do dia 31/12, nos terrenos de cima próximo à pista o corpo do rapaz foi encontrado. Causa da morte: hemorragia causada por múltiplos trau-matismo. Ao lado do corpo havia uma roda de bicicleta, dessa vez uma roda traseira, ao que pa-rece, desenterrada pela vítima pois as suas mãos e as unhas estavam sujas de terra. Responsável pela ocorrência, Sargento Gonzaga. Obs: Crime idênti-co aos ocorridos nos anos de 1929/30 e 1930/31, o caso do menino da bicicleta amarela.
Quando vi as duas ocorrências perguntei ao meu tio que crimes eram aqueles, já que não consta-vam nos relatórios oficiais na delegacia. Foi então que ele me contou uma interessante história.
Em paralelo com a função de professor que tinha assumido a pouco tempo ele também foi nomeado delegado auxiliar, logo após a morte por infarto do antigo policial, o sargento Gonzaga, em 1945. Assim, assumiu a função sem qualquer informa-ção sobre as ocorrências anteriores, e companhei-ro para lhe passar os casos, o novo delegado con-tava apenas com o que estava registrada nos li-vros.
Ele falou que a cidade de Lastro sempre foi assim pacata. Mas que havia um dia no ano que toda a população se trancava em suas casas como se te-messem alguma coisa, mas que nunca comenta-vam o que era. Esse dia era justamente o 31 de de-zembro. De início, ele achou estranho a tradição de se resguardar no dia em que todo o mundo está celebrando a virada do ano. Mas, se era uma tra-dição da cultura local, ele não iria fazer nada para se opor.
Tomando ciência do histórico de ocorrências após assumir a delegacia, ele percebeu que os registros da década passada eram no mínimo estranhos. Os crimes quase idênticos e com o detalhe de em ca-da cena ter sido deixado partes de uma bicicleta, o perturbava. Mexendo no armário de provas, en-controu as rodas achadas nas cenas dos crimes que leu nos relatórios. Mas, não havia nenhuma informação complementar sobre os crimes, suas motivações ou suspeitos.
Intrigado, o novo delegado saiu pela cidade fa-lando com as pessoas, mas parecia que ninguém queria tocar no assunto. A sensação que tinha era como se os crimes fossem uma ferida e que a cada pergunta feita era como se arrancasse a sua casca. Mas insistiu. Um dia uma senhora falou algo que chamou a sua atenção. Era dona Mariinha. Uma mulher de meia idade, solteirona, órfã de pai e mãe. Já tinha ouvido falar dela e, aparentemente, muito moradores da cidade não lhe davam muita credibilidade. Mas a história que ela contou lan-çou um pouco de luz nos casos da década anteri-or.
Mariinha disse que seus pais tiveram dois filhos: ela e o pequeno Antônio, mais novo 2 anos. Uma criança alegre e especial. Tinha problema mental e por isso sofria bastante preconceito. A senhora contou que pelo fato do irmão ser doente era tido como um sinal de castigo divino, por isso, poucas pessoas mantinham contato com a família.
Ela relatou que seu irmão ganhou uma bicicleta de seus pais como presente de fim de ano. Não era nova, tinha sido de um dos filhos de um engenhei-ro do açude. No dia 28/12 de 1929, enquanto An-tônio passeava, atropelou um cachorrinho de um dos meninos da rua de baixo. Infelizmente, o ani-mal morreu. Coincidentemente, seu irmão não foi visto depois do fato. Ela contou que os pais e ou-tros familiares andaram de casa em casa o procu-rando. Mas ninguém sabia do seu paradeiro. Era como se ele tivesse evaporado. No dia 31/12, pró-ximo à virada, foram avisados de um corpo de uma criança morta lá nos terrenos próximos à pis-ta. Reconheceram corpo do Antônio, estava de-formado e parcialmente enterrado, foi uma cena horrível.
Parece que os meninos, segundo ela, como forma de vingança pela morte do cachorrinho pegaram o Antônio e o levaram para o terreno onde o bate-ram até matá-lo, e esconderam a sua bicicleta. O mais triste foi o que aconteceu em seguida, o sar-gento Gonzaga tomou os pais de Mariinha como os principais suspeitos. De tristeza, eles tiraram as suas vidas, se enforcando na casa onde moravam.
Quando ninguém mais lembrava que estava com-pletando um ano da morte de Antônio, a cidade se alvoroçou novamente. O corpo de uma outra cri-ança foi encontrado. Era o menino João Pedro de 14 anos filho dos Nazários. Morto de forma seme-lhante a Antônio. O curioso é que uma roda de bicicleta estava ao lado do corpo. Sargento Gon-zaga investigou mais não encontrou a nenhum suspeito.
Na virada de 1940/41, dez anos após o caso do irmão de Mariinha, um novo corpo foi encontrado nos terrenos de cima. Era Dário, um rapaz de 22 anos, estudante universitário, que estava na cida-de para passar a virada de ano com seus pais. Foi inevitável à cidade fazer a relação com os dois crimes da década anterior, disse meu tio. Para re-forçar a teoria, ao lado de rapaz estava outra roda de bicicleta.
Após ouvir todo o relato da irmã, meu tio foi es-boçando uma possível relação entre os casos. E se fosse a Mariinha quem estivesse cometendo os crimes como forma de vingança pela morte do irmão? "Se a cada 10 anos ocorre uma morte se-melhante, e a última foi em 1941, a próxima será na virada de ano para1951. Outro pensamento que ele teve: "Se a bicicleta do menino Antônio desapareceu, e ela está sendo devolvida em partes a cada novo assassinato... Já tinham duas rodas, então estavam faltando o guidão e o quadro". Ele supôs que ainda faltavam duas mortes para com-pletar a tal bicicleta amarela. Foram essas as con-clusões não oficiais de um delegado novato.
Mexendo na papelada antiga da delegacia, ele en-controu a folha da ocorrência de 31/12/1929 guar-dada numa gaveta que estava trancada: o crime contra o menino Antônio e o registro do suicídio dos pais. Toda a história de Mariinha batia com o que o sargento Gonzaga havia registrado. Só não entendeu o motivo do sargento ter arrancado a folha do livro e a tê-la guardado.
Tio Valcir contou que saiu novamente pela cidade questionando os moradores sobre os homicídios, como fazia desde que assumiu a função de dele-gado. Tentou impor a sua autoridade, mesmo as-sim ninguém contava nada. Foi à casa de João de Jacira pela terceira vez e teve a sorte de encontrar gente em casa.
Seu João era pai dos gêmeos Arturo e Estevão. Os meninos já eram homens com 37 anos e moravam na capital, mas na data do primeiro homicídio eram crianças. O pai contou que nunca foram próximos da família de Mariinha e nem os meni-nos eram amigos do menino doido. Um dia, Artu-ro disse que o lunático havia matado o cachorri-nho deles. Um ou dois dias depois, o doidinho foi encontrado morto lá nos terrenos.
Tio Valcir perguntou se suas crianças, na época, eram amigos das vítimas de 1931 e 1941. Seu João disse que sim, eram como irmãos. Perguntou ain-da se as crianças estavam juntas no episódio da morte do cachorro. O pai confirmou. Essa infor-mação para meu tio caiu como uma luva. Ele ain-da não podia especificar quem iria causar ou qual o tipo de mal que estaria por acontecer, mas se-guindo os padrões, algo iria ocorrer na virada de 1950 para 1951. Dessa vez tinha uma pequena vantagem: sabia quem seriam as possíveis próxi-mas vítimas.
Para encerrar a conversa com seu João, por curio-sidade meu tio perguntou onde estavam os pais das duas vítimas anteriores. Ele falou que haviam ido embora da cidade há muito tempo e que a úl-tima notícia que tiveram deles foi que eles morre-ram, tanto os pais de João Pedro quanto os de Dá-rio no, no mesmo dia, enforcados.
À medida que o tempo se aproximava, tio Valcir sondou sobre a vinda dos gêmeos para Lastro, e sim, eles viriam. Era só esperar o momento certo para interrogá-los. Claro que negaram como sem-pre. "Não temos nada a ver com aquele crime e que essa história de cachorro morto foi um pre-texto para nos acusar pela morte do doidinho, por fim, se declaravam inocentes.
Às 19:00 horas do dia 31/12, tio Valcir arrumou uma desculpa qualquer e foi à casa dos pais dos gêmeos. Mas os irmãos não estavam lá. Tinham ido visitar uma tia que morava num sítio nas re-dondezas. Passou também pela casa de Mariinha e ela não estava. Isso o preocupou. Foi inevitável fazer a conexão entre eles. O seu instinto o impul-sionava a ir dar uma volta pela pista lá nos terre-nos de cima. De longe, viu uma mulher ajoelhada. Era Mariinha chorando. Aproximou-se. Ela tentou fugir assim que o percebeu, mas não conseguiu.
Ao se aproximar, meu tio perguntou por que ela estava ali sozinha naquele esquisito. Ela tentou desviar o assunto, mas confidenciou conversava com o seu pequeno irmãozinho e seus pais. Pro-curando a confortar, ele disse que era normal conversarmos com os nossos entes queridos mor-tos... A mulher, meio constrangida, disse que esta-va conversando com os espíritos dos seus familia-res e explicou que desde o assassinato dos irmãos e a morte de seus pais os espíritos estavam presos em nosso mundo, e que só seriam libertos quando todos os seus últimos assassinos fossem punidos. Deixando de lado o fato de a mulher estar conver-sando com fantasmas, perguntou-lhe quem seri-am os próximos a morrer, a fim de evitar mais uma tragédia na cidade, pelo menos era essa a sua intenção. Novamente, não que ele estivesse acre-ditando nessa história de fantasmas ou espíritos presos, mas se ele tivesse a certeza dos nomes das próximas vítimas seria o primeiro passo sem ser às cegas nesse caso.
A mulher disse que apesar de saber quem seriam, não diria seus nomes. Ele tentou persuadi-la, mas sem resultado. Mariinha resmungava que desde que eles sua família morreu vinha pedindo aos acusados que confessassem seus crimes, ao invés disso, a tomaram por louca. Mas aquilo finalmen-te iria terminar. "Todos iriam pagar pela morte de meu pequeno Antônio e pelos suicídios de meus pais.
Ao sair dos terrenos, meu tio passou novamente na casa de seu João, que mesmo sem ter a confir-mação de Mariinha, seriam umas das prováveis vítimas do crime prestes a acontecer.
Os pais estavam bem. Só que os irmãos não che-garam na casa da tia, segundo disse dona Jaciara, sem preocupação alguma, "podem ter puxado as-sunto com algum amigo de infância e nem ter vis-to o tempo passa...", completou a mãe deles. Os convidaram meu tio para tomar um café e comer um bolo enquanto esperavam o ano novo chegar. Porém, já perto das 23:30 h deu para se ouvir um grito de socorro que vinha da rua não distante.
Alguns moradores encontraram Mariinha ferida caída ao chão perto da principal. Ela contou que os responsáveis pela agressão tinham sido os ir-mãos Arturo e Estevão. Na tentava de convencê-los a falar a verdade sobre a morte de Antônio pa-ra que suas vidas fossem poupadas, mas não a quiseram ouvir.
Testemunhas relataram que enquanto a espanca-vam, os homens pararam e correram em direção aos terrenos de cima. Antes de sair em busca dos irmãos meu tio contou que foi chamado às pressas para outra emergência, dessa vez na casa dos pais dos agressores de Mariinha. Ao chegar no local, havia alguns familiares desesperados. Gritavam do lado de fora da casa, alguns tentando destelhar para poderem entrar. Quando o delegado chegou ainda pôde ver a agonia Seu João. Quem presen-ciou disse que o velho havia expulsado todos de sua casa e trancado as portas. Fez um laço numa corda de sisal e a enrolou no pescoço da mulher a enforcando, puxando-a pela linha da cumeeira. Ele, com a mesma corda, amarrou-a também ao seu pescoço e saltou de cima da mesa. Quando conseguiram entrar, ambos já estavam mortos.
Saindo da casa já tendo em mente o que acontece-ria em seguida, tio Valcir foi correndo aos terrenos de cima. Parecia até que ele estava adivinhando. Encontrou os dois irmãos. Um estava escavando com as mãos o chão de terra dura, enquanto o ou-tro parecia conversar, gesticulando e pedindo desculpas. Meu tio se aproximou e pediu que le-vantassem as mãos e o acompanhassem até a de-legacia para conversarem.
De pronto parecia que eles o atenderiam, mas ini-ciou-se uma briga. Começaram a se esmurrarem e agarrados rolaram no chão. Tio Valcir falou não pôde fazer nada. Caso entrasse na briga poderia sofrer algum ferimento. Atirar neles não iria. Deu um tiro de advertência na intenção de alarmá-los. Mas pareceu que o disparo serviu como fogos de artifícios anunciando o ano novo. Em poucos mi-nutos já havia dezenas de curiosos presenciando aquela cena de fratricídio. Todos puderem ver o momento quando um irmão puxou um punhal e esfaqueou o outro no peito sobre o coração. Aos gritou pedindo desculpas cortou a sua garganta.
No cenário do duelo, meu tio viu que o que eles estavam desenterrando era o quadro amarelo com guidão de uma bicicleta de criança como ele havia imaginado.
No dia seguinte, ele terminou de desenterrar e le-vou as peças para delegacia como prova. Ao ver Mariinha, pediu que ela fosse à delegacia. Quando lá chegou, lhe mostrou a bicicleta montada. A mu-lher chorou muito. Estava diante da bicicleta de seu irmãozinho assassinado. Meu tio perguntou o que ela gostaria de fazer. Sua resposta foi que gos-taria de enterrá-la nos terrenos de cima onde o corpo foi encontrado. Foram lá. Cavaram uma cova e a colocaram lá. Apesar do sol ser de fogo, uma brisa suave soprava sobre eles.
Desde então, não houve mais caso de assassinato na cidade da forma que vinha acontecendo há décadas. As ocorrências voltaram a ser de furtos simples, brigas de casal e contendas entre vizi-nhos. Segundo o meu tio, os mais velhos não cos-tumam sair na noite de ano novo, já as novas ge-rações não sabem dos casos de homicídios que aconteceram no passado.
— Foi desenterrando as partes da bicicleta que o senhor conseguiu essa cicatriz?
Era uma grande cicatriz no braço esquerdo,
—Isso aqui? Não. Foi em outra ocasião. Depois te conto a história. Termina a tua dissertação que é melhor. Boa noite. Casos de homicídios que acon-teceram nas décadas passadas.