A TAPERA PERTO DA SANGA
Durante muito tempo, escondi o que me aconteceu naquela noite, por causa de meu pai e de seu patrão. Mas, agora que ambos já são falecidos, finalmente eu posso contar.
Eu tinha doze anos de idade. Naquela época, as crianças chegavam mais devagar à adolescência, e eu ainda tinha muito da ingenuidade de guri. Tinha crescido na periferia de Porto Alegre, com minha mãe, mais uma entre tantas mães solteiras. Oriunda do campo, ela tinha ido atrás das ilusões da cidade grande, onde correra imenso risco de se perder pelos caminhos da vida. Mas, por muita sorte, havia conseguido um emprego de doméstica em uma casa onde os patrões a tratavam razoavelmente.
Porém, de uma hora para outra, ela havia adoecido e, em poucos meses, deixara-me só neste mundo. Aí, alguém havia se lembrado de me entregar para meu pai, um peão de estância que eu nunca tinha visto na vida, e tinham-me mandado para a fronteira do Rio Grande do Sul com o Uruguai. Foi então que eu me vi largado num mundo que eu não conhecia – um mundo de imensas pradarias, de invernos gélidos e de homens rudes, onde, embora se tivesse muitos conhecidos, os únicos amigos de um gaúcho, muitas vezes, eram mesmo o cusco e o pingo, ou seja, o cachorro e o cavalo.
Estranhei imensamente o tranco do petiço – ah, deixem-me utilizar de novo esta linguagem que tanto me arrepiava logo que cheguei no Pampa! Linguagem que eu não conhecia e que tanto me esforcei para aprender. Isso porque, naqueles dias, o que eu mais desejava neste mundo era conquistar o orgulho do meu pai.
Meu pai era um homem de estatura média, muito moreno, de barba espessa, cujo coração me parecia tão curtido quanto sua pele áspera, que o sol, no verão, e o minuano, no inverno, haviam-se encarregado de enrugar. Acostumado aos carinhos de minha mãe, eu esperava muito dele. Mas o gaudério me tratou como se eu fosse nada mais do que um soldado no meio de uma guerra – e ele era o general, o meu general particular. Obedecia ao patrão como se fosse um deus e descontava em mim suas frustrações. Meu coração quase criança parecia a ponto de se partir todas as vezes em que ele me dirigia palavras duras, e eu o sentia sangrar quando aquele homem, com quem tanto eu sonhara, que tanto idealizara quando pequenino, invejando os meninos que tinham pai, levantava o relho e me batia como se eu fosse um animal. Foi uma época terrível. Embora eu me esforçasse, tentasse ser bom peão e até bom cavaleiro – quase morri de medo na primeira vez em que tive de montar –, parecia-me que aquele homem de pedra não tinha mesmo qualquer tipo de afeição por mim...
Aliás, nenhum daqueles homens demonstrou qualquer espécie de piedade pelo guri órfão e assustado que, recém chegado da cidade, tinha vontade de se esconder num canto cada vez que os cachorros acoavam. Ninguém me perguntou se eu estava bem, se eu estava gostando de conhecer a Campanha, se eu tinha saudade de minha mãe ou se eu sentia falta de Porto Alegre. Mandavam-me subir no cavalo e enfrentar o gado bravo como se eu fosse um homem nascido e criado no meio de tudo aquilo. E eu obedecia.
Á noite a peonada se reunia, em volta de um fogo de chão, e ficava tomando mate amargo até altas horas. Nunca me ofereciam a cuia – eu a via passar diante dos meus olhos, a bomba de prata brilhando à luz das chamas, com uma curiosidade vívida. Mas não me atrevia a pedir um. Já tinha ouvido dizer que chimarrão não era coisa para criança.
O que me espantava era o fato de que eu era criança na hora do mate, mas não era criança para o trabalho braçal, para a dura lida do campo, para subir num cavalo cujas patas quebravam a geada, muito cedo da manhã, e para ir até ser noite escura no meio da solidão dos pampas...
Bem, enquanto eu ficava ali, morrendo de saudade da televisão de catorze polegadas que havia na casinha da minha mãe, eu ouvia as histórias dos gaudérios. E foi naquelas noites, à beira do fogo aceso dentro do galpão, que ouvi falarem da tapera. Era uma casa em ruínas, abandonada há muito tempo, que havia no fundo do campo, perto de uma sanga (riacho), onde, segundo diziam, penava uma assombração.
A tapera tinha sido a casa de um homem muito rico, que, no entanto, tivera de ir para a guerra. Então, ele vendera tudo o que tinha – quase todo seu campo e todo o seu gado. Ficara só com a casa e um pedacinho de campo em volta dela. Pegara o resultado da venda, que, na época (devia fazer mais de cem anos), fora um saco de moedas de ouro, e o escondera, ninguém sabia onde. Nem mesmo sua esposa e seus filhos. Dissera que tinha medo de que seus inimigos se apoderassem de seu patrimônio enquanto ele estivesse na peleia.
Só que o homem morrera na guerra, e seu tesouro se perdera. A família passara muitas necessidades e acabara indo embora, perdendo-se pelo mundo. Mas, conforme diziam os peões – e me olhavam como se quisessem me assustar –, a alma do avarento continuava por ali, perto da casa, onde provavelmente estaria enterrado o seu tesouro.
Os peões contavam que muita gente já tentara encontrar as tais moedas de ouro. E contavam histórias escabrosas. Um dos aventureiros tinha se perdido no meio do mato em volta da tapera, procurando o ouro, e só fora encontrado dias depois, vagando sem razão – ficara louco e não soubera contar o que lhe acontecera. Outro, tinha sido encontrado morto, aparentemente afogado na sanga – mas, como era difícil alguém se afogar num curso d’água que não devia ter mais de um metro de profundidade, provavelmente havia sido o fantasma do avarento quem o matara. Outro, ainda, tinha sido encontrado com as tripas para fora, sem que se soubesse se havia sido morto pelo ataque de algum animal selvagem, ou pelas mãos do próprio fantasma. E assim se sucediam as histórias – todos os que haviam tentado encontrar a tal fortuna haviam acabado loucos ou mortos. Diziam que o fantasma aplicava alguma espécie de teste, que ninguém havia vencido, mas acrescentavam que isso era apenas especulação – ninguém voltara com vida ou com razão suficiente para esclarecer o que ocorria na tapera perto da sanga.
Numa certa tarde, meu pai me mandou subir no cavalo e segui-lo. E lá fui eu, junto com ele e com outros dois peões. Os três homens conversavam um pouco entre si – não muito –, mas não me dirigiam a palavra, senão para me mandarem apear e abrir uma porteira, cada vez que uma surgia em nosso caminho. Eu ia quieto. Mas, à medida que nos aproximávamos do fundo do campo, eu sentia meu coração acelerar. Até que avistei a tapera. Não restava mais do que um pedaço de telhado e duas paredes em pé, onde se divisava o que já fora a soleira de uma porta e o vão de duas janelas, recortadas contra o verde do mato da volta da sanga, ao fundo. Fiquei sem ar. Uma atmosfera pesada parecia dominar aquele recanto. Senti meu cavalo nervoso, tentando dar volta, mas insisti com ele, batendo-lhe as esporas na barriga, e, finalmente, descendo-lhe o relho – antes no lombo dele do que no meu, que era o que me esperava se eu obedecesse aos instintos do animal e aos meus, e fugisse para casa...
Bem, os empregados começaram a reunir o gado. Eu os ajudava como podia. Ainda não sabia muito bem como fazer aquele tipo de serviço. O gado estava inquieto. Alguma coisa pairava no ar. Tive a impressão de que até mesmo os outros peões sentiam que havia algo de anormal naquele lugar, naquela tarde. De repente, uma espessa cerração cobriu as coxilhas, e eu não via nada diante dos meus olhos.
– Bah, não dá para trabalhar assim – disse um dos peões.
– Tens razão – ouvi a voz de meu pai. – Vamos dar volta. Guri, vê se não te perde de nós.
Tentei obedecer. Mas eu não conseguia enxergá-los. Tive vergonha de pedir que me esperassem. Em alguns instantes, já não conseguia ouvi-los. O pânico se apoderou de mim. Se eu gritasse, meu pai teria vergonha, e essa vergonha se transformaria em raiva, e provavelmente essa raiva seria descarregada nas minhas costas com toda a fúria de seu braço. Mas, se eu não gritasse, ficaria para trás, perdido – perdido perto da tapera, perdido perto do fantasma assassino...
De repente, começou a chover forte. Não era muito comum cerração dar em tempestade – normalmente, aquele tipo de neblina se convertia, no máximo, numa garoa fina que molhava muito de leve a relva dos pampas. Mas aquela não era mesmo uma tarde como as outras, e chovia muito. Raios cortavam o céu. Meu cavalo empinou e eu, que nunca na vida tinha tentado ficar em cima do lombo de um cavalo que empinasse, fui jogado longe. Felizmente, caí numa touceira e não me machuquei. Mas senti um pavor tão grande, uma angústia tão terrível, uma sensação tão profunda de solidão, que chegou a me dar uma dor no peito. Eu não via mais nada, só a água caindo à minha volta. Comecei a rezar um Pai-Nosso e a implorar que nenhum raio me atingisse. Caminhei a esmo, sem enxergar um palmo à frente, até que esbarrei numa parede. Era a tapera.
Inexplicavelmente, apesar de tudo o que eu já ouvira falar da tapera, alguma coisa parecia me dizer que eu estaria seguro debaixo do que restava do telhado. Pelo menos estaria protegido da chuva e dos raios. Entrei no que restava da casa e me encolhi num canto. O frio chegava a doer em minha pele, mas um estranho torpor se apoderou de meus membros, e acho que acabei adormecendo.
Quando dei por mim, já era noite. Foi então que ouvi os cascos de um cavalo. Corri para fora. Eu não saberia ir para casa, mas, se o meu cavalo tivesse voltado, com certeza ele encontraria o caminho, bastaria deixar as rédeas frouxas.
Tinha parado de chover, e uma enorme lua cheia iluminava os campos, num cenário bonito, mas assustador. À luz desse luar, deparei-me com o vulto de um cavalo encilhado e me aproximei dele. Não era o meu. O meu era um tordilho (branco salpicado), esse era zaino (castanho-escuro). O bicho resfolegou e me encarou por um momento. Tive um pouco de medo.
De repente, ouvi uma voz por trás de mim:
– Estás perdido, guri?
Voltei-me, e tive a sensação de que meu coração tinha parado de bater por um instante. Diante de mim, havia um homem alto, robusto, com uma longa barba negra, de uma palidez assustadora, que parecia ainda mais cadavérica à luz prateada do luar. Usava um chapéu de abas largas e um enorme poncho cobria-lhe o corpo. Mas havia um quê de tristeza em seus olhos, uma certa agonia difusa na expressão de seu rosto.
– Estou, sim senhor – respondi.
– Bueno. Eu também estou perdido.
Respirei fundo.
– O zaino é seu, senhor? perguntei, tentando parecer simpático.
– É, sim, guri. – Ele fez uma pausa. – Tu sabes o que falam destas terras?
– Sei, sim, senhor.
O homem puxou uma adaga. Uma enorme adaga. Tive vontade de sair disparando. Mas, como não lhe havia feito nada, achei que ele também não iria me atacar.
– E tu não tens medo?
Baixei os olhos.
– Um pouco – respondi. – Mas, já que eu estou perdido, e o senhor está perdido, porque não fazemos companhia um ao outro até amanhecer? Daí, vai ser mais fácil encontrarmos os nossos caminhos.
Ele me encarou com interesse, em silêncio, por longos instantes. Enfim, atirou a adaga no chão, cravando-a na terra, com um gesto ríspido.
– Não sabes há quanto tempo estou procurando o meu caminho – murmurou.
Engoli em seco. Minha intuição me dizia que eu estava diante do próprio fantasma...
Ele puxou dois pelegos de cima do cavalo e os atirou no chão da tapera.
– Senta – disse.
Obedeci. O homem puxou assunto. Falou da lua, do tempo, essas coisas. Eu respondia. Tentava ser gentil. Comecei a sentir minhas tripas darem voltas, um suor gelado me escorria pelo corpo. Mas podia ser que aquele não fosse o fantasma – que fosse só um gaúcho perdido, mesmo, que não me causaria mal algum.
– E o que tu farias se encontrasses o tesouro que o homem que morava por aqui escondeu? perguntou-me ele, de repente.
– Hem? Ora... Eu acho que... Bem, o certo era procurar alguém da família dele e entregar. Afinal de contas, é deles por direito, não é?
O homem cravou-me os olhos de um jeito que parecia penetrar-me a alma, e meneou a cabeça, em sinal de concordância. Ficamos conversando a noite toda. Ele me deu corda e eu comecei a falar da minha vida. Contei da minha infância na cidade, da perda recente que eu tinha sofrido, de como estava achando dura a lida do campo, mas também de como estava me esforçando para aprendê-la. O homem me ouvia com atenção. Foi assim até que a lua desapareceu no horizonte, e os primeiros raios de sol começaram a deixar o céu avermelhado.
– Bueno – disse o homem –, vou-me embora.
– Vá com Deus, senhor – respondi.
O homem montou no cavalo e saiu, a trote. Senti um certo alívio enquanto o via afastar-se. Voltei para dentro da tapera. Eu estava cansado. Fechei os olhos e me recostei na parede fria.
De repente, senti que esbarrava num volume, e abri os olhos. Então, percebi que ele havia deixado cair a guaiaca, aquele cinto de couro com bolsos onde o gaúcho costuma guardar seus trocos.
– Senhor! gritei, correndo para fora. – O senhor perdeu isto!
Mas, quando cheguei na rua, não havia sinal do cavalo ou do cavaleiro.
– Senhor! gritei com mais força, sentindo o ar gelado da manhã de inverno arder em minha garganta.
Mas não tinha nem rastro do homem, e eu não saberia para que lado procurá-lo.
Bem, sacudi a guaiaca. Pelo peso, e pelo tilintar de metal dentro dela, percebi que ali dentro havia moedas – e não eram poucas. Mas resisti à curiosidade de abri-la. Afinal, podia ser que o dono desse pela falta e voltasse para procurá-la.
Mas... E se fosse mesmo o fantasma? E se dentro daquela guaiaca estivesse um mapa, o mapa para encontrar o seu tesouro escondido?...
De repente, ouvi de novo os cascos do cavalo. Meu sangue gelou. Prendi a respiração e fui até a frente da tapera. Era ele. Chegou-se até onde eu estava e desceu do cavalo, encarando-me.
Antes mesmo que ele abrisse a boca, estendi-lhe o cinto de couro.
– Acho que isso é seu – disse. – Estava aí dentro. Acho que o senhor deve ter deixado cair...
O homem arregalou os olhos. Estendeu a mão e tomou-me o objeto que eu lhe alcançava. Olhava da guaiaca para mim, de mim para a guaiaca, em silêncio. Sua fisionomia demonstrava uma emoção tão estranha que não fui capaz de decifrá-la.
– Um piá... – murmurou, enfim. – Um piá de cidade, ainda por cima...
Colocou a mão no meu ombro. Aquela mão era tão gelada que me fez estremecer.
– Escuta, guri – disse ele –, um quarto dos que vieram aqui atrás do meu tesouro saiu correndo assim que me viu. Um quarto disparou quando eu puxei a adaga. Um quarto me respondeu que iria ficar com o tesouro para si. E os restantes, que resistiram a todas essas provas, não quiseram me devolver a guaiaca. Mas finalmente encontrei alguém em quem posso confiar.
“Há muito tempo estou preso neste mundo ao qual já não mais pertenço. Isso porque minha avareza me fez morrer deixando minha família em necessidades. Mas finalmente encontrei alguém a quem posso dizer onde está o meu tesouro. Leva-o para a minha família, guri. Assim, pode ser que eu finalmente descanse em paz.”
Antes mesmo de me dar vontade de sair correndo, fiquei com pena dele. Mas também me lembrei das histórias que ouvira e fiquei, como se diz, “com um pé atrás”.
– O senhor matou todos os que vieram atrás do tesouro? perguntei.
– Não matei ninguém. Uns, enlouqueceram porque viram em mim o retrato de seu futuro, o destino de todos os avarentos. Teve um desmaiou e foi comido pelos bichos do campo. Teve outro que saiu correndo na direção da sanga, tropeçou e acabou se afogando no raso. E teve dois ou três que morreram de susto.
Respirei profundamente.
– Então, eu lhe dou a minha palavra – respondi. – Mas vou ter que contar para o meu pai. Não vou conseguir achar a sua família sozinho.
– Podes contar para o teu pai. – Ele me olhou com tristeza. – Não imaginas o quanto eu tenho sofrido. Tenho vivido aqui, solito, tenho visto as décadas passarem... Não posso comer, não posso beber, não posso dormir, não tenho nenhum dos prazeres da vida. E, ao mesmo tempo, também não tenho a paz dos mortos...
O espectro me levou até a sanga e me mostrou onde havia escondido, debaixo de umas pedras, o saco de couro que continha toda a sua fortuna.
– Se minha família quiser te dar algumas moedas, podes aceitar – disse o fantasma.
Depois, caminhamos em silêncio até a tapera. Encostei-me de volta na parede.
– Teu pai é um bom homem – disse ele. – É rude, mas é um bom homem. Com certeza te ajudará a manter a tua palavra.
Fiz que sim com a cabeça. Um enorme cansaço me abatia. Fechei os olhos.
Quando os abri de novo, foi ouvindo os cascos de cavalos. Não havia mais sinal algum da assombração. Levantei-me e vi que, desta vez, o tropel era o dos cavalos do meu pai e de um outro peão, que vinha com ele.
– Onde te meteste, guri desgraçado? berrou meu pai. – Nós te procuramos a noite toda!
– Estou aqui – respondi. – Passei a noite na tapera.
O outro peão arregalou os olhos.
– Passaste a noite na tapera, guri? E estás vivo?
– Sim, senhor.
Eles traziam o meu tordilho, e fui com eles de volta para a sede da fazenda. Mais tarde, contei a meu pai tudo o que tinha acontecido. Terminei pedindo, com lágrimas nos olhos, que ele me ajudasse a cumprir a promessa feita ao morto.
E, para meu espanto, meu pai me agarrou pelos ombros. Os olhos dele me pareceram úmidos, embora nunca antes ou depois daquilo eu o tivesse visto chorar. Cheguei a pensar que ele me abraçaria, mas seu coração ainda não havia amolecido a esse ponto.
– Tu és um bom guri – disse ele, apenas.
Meu pai encontrou facilmente um bisneto do fantasma. O que restava de sua família ainda era muito pobre. Dali a algumas noites, fui com eles até a sanga, muito furtivamente: se o patrão de meu pai descobrisse tudo, iria querer ficar com o tesouro. Mostrei-lhes as pedras e os ajudei a levantá-las – ou tentei ajudar, porque minhas forças eram muito menores do que as deles. Embaixo delas, encontramos o saco, cheio de moedas de ouro muito antigas.
O herdeiro do morto ficou profundamente agradecido, e ofereceu algumas moedas a meu pai. E foi o que nos permitiu deixar o campo e ir para uma cidadezinha pequena, da fronteira, onde ele se estabeleceu com um pequeno armazém. Assim, eu pude continuar os meus estudos.
Bem, o que espero é que, no fim das contas, o fantasma tenha encontrado o seu descanso. Sei que, hoje, seus descendentes estão bem de vida. E, quanto a mim, uma coisa é certa: foi naquela noite, perdido na tapera perto da sanga, que eu conquistei o respeito do meu pai. E foi naquela noite que eu deixei de ser uma criança órfã e assustada e me transformei em um homem de verdade...
JULHO DE 2007
Nota: esta é uma obra de ficção, que não traduz necessariamente minhas idéias, crenças ou opiniões; qualquer semelhança com nomes, fatos ou pessoas reais terá sido mera coincidência.