Legião Parte II

Capítulo II

{Necrófilos}

Mãos raspam o solo duro de um cemitério em uma cidade do interior. No fundo do local, uma área de invasões, cruzes de madeira demarcam os locais onde corpos foram enterrados em cova rasa, sem caixão, devido a mortes clandestinas e por conta de muitos serem considerados indigentes. A lua crescente faz seu espetáculo e na madrugada, o único coveiro do lugar, não se incomoda com aquela parte de suas funções, já que está ciente das operações ocorridas e de não desejar participar daqueles atos considerados criminosos. Mas o profanador de túmulos segue de forma contínua, Consegue ver o corpo de um homem já em início de decomposição. Havia sondado o local nos dias que antecederam o seu ato e pode verificar que duas pessoas fizeram aquele enterro. Uma perfuração no crânio demonstrava que o morto fora abatido com um tiro a queima-roupa. Sob a lua, com o cadáver já exposto, se excitou e começou a penetrar a cavidade anal do defunto até gozar.

Malcom tinha uma espécie de fissura por mortos. Sua excitação fazia com que sempre buscasse novos corpos. Chegara a visitar necrotérios e acompanhar enterros de pessoas desconhecidas com o intuito de saciar seu desejo. Algumas vezes pagava uma certa quantia a um rapaz ambicioso que tomava conta do necrotério municipal e conseguia momentos únicos, como o ocorrido com aquela jovem que havia sido morta esganada. Via as marcas no pescoço, a vagina de pelos escuros, a penetração que sentia o corpo ainda quente. O gozo jorrando sêmen e a família depois enterrando sem ter a noção do que havia ocorrido. Mas o desejo aumentava de forma furiosa, começara a espancar e causar traumas nos corpos, o que fez com que não mais pudesse utilizar mortos com caixão aberto e que a família acompanharia o processo funerário. Certa vez arrancou os lábios de um cadáver com os dentes.

Mas o que fez com que Malcom fosse cotado pela Legião foi o hábito adquirido de matar pessoas que considerava interessantes para depois poder usufruir do cadáver delas. Ficava dias com o corpo e mesmo em estado de putrefação, ainda satisfazia suas taras, num estilo Jeffrey Dahmer de ser. Esperava um motorista de táxi onde havia solicitado o serviço. Dentro do carro, havia dopado e tomado a direção. O carro, levado a´te um descampado, foi abandonado e a vítima conduzida dentro de uma caminhonete fechada até o sítio onde realizava suas excentricidades. Espancara a cabeça do sujeito com um martelo, vendo o cérebro se espalhar. Fizera sexo com o corpo por mais de um mês. Os restos mortais eram servidos a seus cães e os ossos queimados e reduzidos a cinzas. Algumas vezes guardava um souvenir como forma de recordação.

Os hábitos solitários não permitiam criar nenhum grupo. Era algo muito particular aqueles momentos. Precisara fugir de um cemitério particular ao abrir um jazigo, despertando a atenção de seguranças, que se dirigiram ao local com lanternas e armas em punho. Encontraram apenas a cova aberta e uma das gavetas de cimento quebradas, mas o caixão ainda se mantinha intacto. Procuraram por pistas aquela noite e contaram com a ajuda da polícia local. O invasor não deixara rastros que pudessem identificá-lo. Dobraram as vigilâncias. Relatos se espalhavam nas cidades do interior, que eram alvos mais fáceis. Algumas vezes existia um acordo financeiro com um coveiro de cemitério público, que fornecia o corpo ao homem de olhar frio e que pagava bem pelos mortos, alegando que utilizaria como objeto de estudo em faculdades de medicina. Devido aos modos distintos, a fala bem colocada e claro as grandes quantias de dinheiro, eram facilmente convencidos das intenções do ofertante. O dinheiro adquirido era fruto de furtos e do salário considerado razoável, já que ocupava um cargo na administração pública. Na Legião poderia executar vítimas e depois receber como prêmio o corpo do executado. Seu último trabalho havia sido uma muçulmana, esposa de um importante membro de uma organização terrorista. Um corpo imaculado que procurou executar por asfixia, preservando a mulher para suas incursões sexuais. Foi possível até mesmo beijar aquela boca morte e sentir ainda o resto de saliva que sobrara.

“Louco, sim, louco, porque quis grandeza

Qual a Sorte a não dá.

Não coube em mim minha certeza;

Por isso onde o areal está

Ficou meu ser que houve, não o que há.

Minha loucura, outros que me a tomem

Com o que nela ia.

Sem a loucura que é o homem

Mais que a besta sadia,

Cadáver adiado que procria?”

(Fernando Pessoa)

Bruno Azevedo
Enviado por Bruno Azevedo em 03/07/2015
Código do texto: T5298777
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