ÔMega Parte XIII
Capítulo XIII
[Mensageiro]
Andando pelo mundo, Ômega sentia-se cada vez mais integrado, não apenas a este planeta, mas a todos os outros que faziam parte da esfera que protegia. Sofia estava com câncer. Havia sido mãe duas vezes. Resolvera dar o próximo passo. Descobrira uma passagem e tinha alguma noção para onde ela levava. Se dedicava também à meditação, com horas de concentração mental, procurando se aliviar de todos aqueles sentimentos que açoitavam a sua razão. Estava sentado sobre as ruínas de um monumento devastado por um terremoto no Tibet, quando viu uma figura diante de si. Uma voz ecoou em sua mente:
— Ômega, venho em missão de paz.
— Quem é você?
— Gabriel.
— O Arcanjo?
— Sim.
Agora, Ômega sentia algo percorrer o seu corpo e fazer com que sentisse uma espécie de calafrio.
— Sei que pretende adentrar a morada dos Anjos. Venho lhe advertir. Não dê esse passo.
— Esclareça-me.
— Estou aqui em missão, como havia comentado. Essa forma humana é apenas uma maneira de podermos ter uma conversa íntima. Você chegou onde nunca um homem conseguiu chegar e mesmo seres mais espetaculares do que os humanos tiveram tal êxito. Até aqui não ocorrerá qualquer forma de intromissão por parte dos seres angelicais. Ao dar o primeiro passo dentro do território dos Anjos, estará fazendo uma declaração de guerra contra os que lá habitam. Estará diante de adversários inimagináveis. Enfrentará ordens menos poderosas inicialmente e até acredito que consiga derrotar os primeiros que surgirem. Mas no momento que destruir o primeiro Anjo, todos os outros virão te destruir e tudo aquilo que esteja ligado a sua existência. Significa que será dada permissão para aniquilar a raça humana, que será considerada corrompida, como diversas outras espécies de outros planetas que visitaste. Virão Tronos, Potestades, Dominações, Querubin, Serafins etc, até que chegar os Arcanjos e me verá na forma real. Conhece bem a hierarquia, já que muito tem estudado. Estará diante de setenta e dois anjos, pois esse é o número dos que guardam a Árvore da Vida e estão á destra do Senhor.
— Então sua visita é uma ameaça?
— Longe disso... Vim propor a paz.
— Como?
— Basta abandonar seu projeto de conquistador. Já possui reinos para governar. Poderá manter a estrutura na forma em que se encontra.
— E quando ao Inferno?
— Muitos Demônios acreditam que sua rebelião será a inspiração para um levante das forças infernais, com intuito de usurpar o poder do Céu.
— E você acredita nisso?
— São ingênuos... No Inferno existem seiscentos e sessenta e seis Demônios. O número supera em larga escala o do exército celestial, por serem em massa, muito abaixo em matéria de poder. Já sabe a respeito da criação dos seres que habitam estas esferas, fazendo parte de antigas entidades unidas a novas formas. A quantidade de rebelados é grande no Mundo Inferior, devido ao ressentimento causado pela destruição de antigas tradições, como é o caso da egípcia, grega, romana, mesopotâmica etc. Mas apenas um Anjo poderia exterminar legiões infernais, embora existam Demônios de grande poder.
— Se refere a Lúcifer?
— Me refiro aos mais poderosos que habitam aquela região.
— Entendo... Mas se não há o que temer, porque propõe paz?
— Imagina toda a criação precisando ser reestruturada novamente, mas não por conta de povos antigos e sim por um homem. Mais do que um homem, já que colheu informações a respeito de sua origem.
— Então Deus não deseja rever sua obra por causa de um ser que considera insignificante?
— O Senhor não se preocupa com isso. Nós nos preocupamos. Não é a primeira vez que tenho a função de ser o Mensageiro.
— Realmente.
— Venha comigo e irei lhe mostrar algo.
Nesse momento, ambos andaram por um vale e o mesmo se abriu, como se apresentasse um filme diante dos seus olhos.
— Observe Ômega... Essa é a vida que podes ter.
Apareceu o próprio Ômega, como se fosse uma memória. Lá estavam todos aqueles que haviam perecido, felizes e unidos. Thomas vivo e de bom coração. Sofia sadia e casada com Ômega. Seus filhos brincando. O mundo repleto de dádivas.
— Porque me mostra isso?
— Posso lhe oferecer isso tudo.
— Uma mentira?
— Não... Um outra oportunidade... Imagine a vida nessa perspectiva. Sem todo o sofrimento que passou, podendo ter todos que ama a seu lado. Posso inclusive apagar sua memória passada e nem terá qualquer vestígio de história a respeito dos acontecimentos que se desenrolaram até aqui.
Ômega conseguia sentir aquela realidade. Não era mesmo um sonho e sim uma realidade paralela. Refletiu apenas uma fração de segundo e se pronunciou:
— O que seria da vida sem as escolhas?
— Realmente... Por isso te ofereço novas possibilidades.
— O que somos é justamente o resultado de tais escolhas. Não passamos de consequências. Jamais admitira ser outra coisa, já que minha liberdade me fez chegar onde estou. Ainda que tenha havido interferência. Por mais que muitos venham a insinuar que tais interferências por si só já sejam a castração da liberdade. Acredito que não existe esse determinismo. As interferências nos mudam por termos também mudado o que nos interfere, fazendo disso uma relação de eventos incalculáveis. Perguntam sobre alguém ter dado o play? Um Criador? Mas imagine o Big Bang e a série de eventos a seguir que acabam fazendo com que o primeiro empurrão não faça mais sentido, já que as consequências ultrapassam os limites das causas, já que o iniciante apenas promove o movimento que desencadeará sequências que irão inclusive demolir o ato inicial. O Caos não segue um porquê.
— Mas o Caos também tem sua própria ordem.
— Eis a questão... Segue a Sua Própria Ordem.
— Mas como pode questionar o seu Criador?
— Como poderia não fazê-lo? Não comungo da divina providência. Sou uma consequência que não deseja mais admitir uma causa.
— Mas o que impediria de outros fazerem o mesmo com você? Afinal, também impõe uma nova condição aos que estiverem subjugados a seu poder.
— Estou em busca de resolver essa contradição.
— Retornarei a meu posto e aguardarei sua decisão.
Em seguida, Gabriel desaparecera num feixe de luz levando consigo aquela realidade transmitida. Deixando Ômega a contemplar o azul do céu. Sabia que sua felicidade não era ao lado de Sofia, que também ela havia adoecido por ignorar os fatores genéticos e alimentícios. Thomas fora assassinado por ter decidido seguir o caminho do crime contra os seu outros irmãos. Tudo fazia parte de sua vida e não poderia se arrepender de nenhuma escolha, já que cada uma delas o tornou o que é. Via em cada ser que convivia um irmão e isso era o elo que conseguia enxergar com a religiosidade. Lutaria por cada espécie e procuraria melhorar a si a partir da melhora dos outros. Os desafios eram enormes e a sua vontade também.