Ômega Parte IV

Capítulo IV

[Revelações]

Ômega, inquieto com a transformação que sofrera, fazia questionamentos comuns às pessoas, Por que ele? Parado no beco escuro, onde havia sentido pela primeira vez aquela força, olhando para a lua em uma noite silenciosa e estrelada. Sentindo de repente uma presença, quando corre aquela impressão de estar sendo observado. Quantos conseguem realmente provar que estavam certos? Das trevas surge uma figura tenebrosa, com longos cabelos cobrindo-lhe o rosto, com olhos que brilhavam faiscantes, vestindo um sobretudo fino, quase uma capa, parecendo uma espécie de miragem urbana. Até que o silêncio foi quebrado por uma voz suave e ao mesmo tempo gutural, que sussurrou:

— Ômega!

— Quem é você?

— Soma.

— Soma?!?!

— Sim... Mas não interessa quem sou, já que vim lhe trazer informações a respeito de quem você é.

— Nunca me interessei pelo meu passado.

— Talvez seu passado se interesse por você.

Parecia que existia algo familiar naquele ser e algo o fazia sentir verdade em suas palavras.

— Ficaremos algum tempo juntos, até lhe fazer compreender alguns aspectos.

— Por quê?

— Lhe darei mais perguntas do que respostas.

— …

— Preciso que converse com Clarisse...

— Como sabe seu nome... e o meu??

— Sempre foi perito em desculpas, agora utilizará outra. Quanto mais cedo puder se desprender de qualquer vínculo de afeto, conseguirá lidar melhor com que o virá.

Como tomado por um desejo intransponível, Ômega se dirigiu até sua casa, abandonando aquele ser, ou seja, Soma e preparando uma pequena mochila com suas coisas. Clarisse levantava cedo e o café estava posto à mesa. Depois de uma longa conversa, Ômega explicara a necessidade de seguir seu rumo, que havia conseguido propostas interessantes de emprego, que já completara dezoito anos e não haveria meios de impedir que ficasse. Sob lágrimas, se despediram. Ainda assim, o jovem grato, apesar do gesto que aprecia de ingratidão, saiu sem olhar para trás e se dirigiu ao mesmo beco, que apesar do dia claro, mantinha um canto escuro sob marquises de prédios velhos. Chegando ao local, logo se deparou com a mesma figura.

— Passou a noite aqui?

Como resposta apenas um esboço de sorriso.

— Olhe este cartão-postal, é de Bangladesh. Concentre-se nessa imagem.

Ômega observou por um instante mínimo a imagem e logo ao se dar conta, estavam no local observado.

— Onde estamos?

— Bangladesh.

— Como isso é possível?

— Deve ter novas noções em relação ao possível.

— Nunca estive aqui antes.

— Isso faz parte das suas habilidades. Basta imaginar um local e irá se deslocar para ele. A velocidade pode superar a que conhecemos como a da luz. Não precisa necessariamente ter estado no objetivo, basta uma referência e será transportado.

— Isso é alguma espécie de magia?

— Dependerá do que compreende por magia.

— Devo estar sonhando sou sob efeito de alguma droga.

— Logo se dará conta que não será possível acordar.

Caminharam por uma região inóspita, parando sob uma frondosa árvore e observando a paisagem da parte mais alta em que se encontravam.

— Vim, não para lhe ajudar ômega, mas para lhe informar. O que vai fazer com as informações será responsabilidade sua. Tem um grande poder em suas mãos, mas as escolhas dependerão do seu julgamento... Já percebeu que pode ler a mente das pessoas em geral, antecipar os anseios e estar diante delas até mesmo antes de cometer um simples gesto. Podendo se concentrar em um padrão, como por exemplo focar o filtro em que desejou acordar e comer pão com manteiga, restringindo sua lista de possibilidades. Quanto mais específico, mais íntimo da mente do outro se tornará. Também consegue visualizar sonhos.

— Isso tem me assustado. Vi a dor de Clarisse por se culpar diante da tragédia de seus netos.

— Lidará com dores ainda mais graves... Também já percebeu que pode mudar de formas, adquirindo a habilidade da forma que assumiu. Se for um personagem com algum poder especial, também poderá usufruir dessa benesse...

— Espera. Preciso testar isso.

Ômega se transformara no Super-Homem e conseguira sem esforço arrancar a árvore que os acolhia. Sendo interrompido por Soma:

— Vamos ao Saara.

Uma imagem e estavam lá. Ômega em sua forma normal novamente.

— Você pode se transformar no que desejar. Mas como deve ter percebido naqueles acidentes sofridos. Uma vez que morra na forma que assumiu, voltará a sua forma normal e não mais poderá se transformar no que morreu. Como se a forma morresse em seu lugar. Se dominar a velocidade do pensamento, para jamais conhecerem sua identidade, deverá ter sempre um arquivo de memória de formas, para quando for atacado de forma mortal, instantaneamente se transformar e assumir outra forma e não voltar ao estado natural.

Para testar a capacidade, Ômega se transformara em vários personagens que havia assistido em filmes, quase de forma simultânea. E resolvera questionar sua origem:

— Sou uma espécia de alienígena?

— Talvez seja um pouco mais complexo do que isso... O que posso lhe adiantar, já que irá descobrindo sobre sua origem ao longo de seu aprendizado, é que não faz parte de nenhuma conspiração alienígena, como as vistas em filmes de ficção científica. Suas leituras possibilitaram ter certo discernimento e seus questionamentos o fizeram afastar daquilo que acreditava ser inverossímil. Estamos diante do impossível. Não poderia lhe fornecer essa informação de forma menos impactante. Você é filho de um anjo com um demônio, o que alguns poderiam chamar de Nephilim...

— Nephlim... conheço isso de jogos de vídeo-game...

— Mas como afirmei, se trata de algo mais complexo. Os motivos que fizeram seus pais se envolverem não me compete dizer. E quando foi gerado, procuraram também acrescer outros genes, de seres que habitam o universo, fazendo com que seu poder fosse desconhecido, já que se tornou uma criatura única. Após a concepção, ainda em forma embrionária, escolheram uma mulher deste planeta para abrigá-lo e gerá-lo, já que também desejavam que tivesse características telúricas. Ana era o nome de sua mãe, uma mulher que participou de diversos eventos de grande importância nesse mundo. Quando criança sofrera diante do drama vivido na Revolução Russa, passara pelos horrores da guerra. Acabou infértil, perdendo seus grandes amores. Na tentativa de reparar a dor e na busca por alguém especial, mesmo após idade avançada, Ana manteve em sigilo sua gravidez, sendo amparada no meio rural onde vivia e vista como uma espécie de Santa. Quando na história tivemos um relato de gestação aos oitenta anos de idade? Seu vigor fez com que vivesse até os cem anos, falecendo no ano 2000 e sendo enterrada na aldeia de Pechora. Poderá visitar o túmulo dessa guerreira que serviu de inspiração ao levante feminino.

Com lágrimas nos olhos, Ômega ouvia o relato e agora, depois de anos de existência, senti desejo de saber sobre sua origem e se orgulhava de sua história.

— Ainda existem outros fatores, Ômega... Como já deve ter percebido, poderá compreender qualquer língua e se fazer compreender. Quando fala, cada pessoa que recebe sua voz a capta transmitida na língua que a pessoa compreende. Se estiver diante de diversas pessoas com origens distintas, cada uma delas receberá a informação na língua que lhe é familiar e você sempre as compreenderá em uma linguagem própria que faz parte do seu entendimento mais íntimo. Eu mesmo não falo em língua conhecida na Terra, mas você me compreende perfeitamente. Também poderá conversar por telepatia. O que me leva a outro ponto. Você poderá se deslocar no tempo...

— Como assim?

— Devido a forma como se desloca, poderá ultrapassar a barreira do tempo e com isso estar em épocas passadas ou mesmo diante de eventos futuros. Seu deslocamento está alinhado com o fluxo temporal que faz com que existam múltiplas temporalidades, fazendo com que não possa alterar apenas por observação a realidade ou uma das realidades com as quais irá se deparar. Se for o seu desejo interferir, poderá não apenas modificar a realidade que foi afetada, como criar realidades paralelas, criando eventos que podem ocasionar singularidades, no sentido atribuído pela física contemporânea.

— Espere um momento. Apesar de ser leigo no assunto, já andei lendo alguma coisa de Stephen Hawking, Einstein. Estamos falando de espaço-tempo?

— Sim. Só que com uma dinâmica que poderia assustar o que compreendemos por matéria.

— Não pretendo e nunca pretendi interferir no tempo dessa maneira, já que nunca fui adepto de qualquer coisa que próxima ao chamado Destino. Desejo que cada um seja responsável pelo seu próprio destino, ainda que tenhamos influências pré-existentes.

Soma abriu um sorriso quase fraternal.

— Ômega, você também não irá mais dormir... Ande pelo mundo, explore mentes, lugares, livros, tecnologias. Busque amadurecer e quando encontrar uma razão, faça seu próprio destino acontecer.

Ao se virar, Soma havia desaparecido e não voltou a encontrá-lo nos anos que se seguiram, viajando por canto ponto do planeta, cada vez mais adquirindo conhecimento e fazendo de um dia de aprendizado algo que parecia valer por séculos. Jamais deixara de pensar nos seus, indo visitar sempre Clarisse, que mantinha seus hábitos, cultivando flores e arrumando o pequeno apartamento. Visitava Sofia e via como estava feliz com o marido e um filho que viera alegrar ainda mais sua relação. Thomas se tornara um gênio da Química e vivia mergulhado em estudos. O mundo, mais do que nunca, era infinito em possibilidades.

Bruno Azevedo
Enviado por Bruno Azevedo em 13/06/2015
Código do texto: T5275787
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