SOB O MESMO TETO
 
Um simples biscoito recheado, item de desejo de quase toda criança, e para àquela aqui em questão, não era diferente, saindo da escola, de volta ao lar, poucos passos até a sua chegada, a escola ficava na mesma calçada, menos de cem metros distantes de sua residência. Um muro coberto de musgo, o mesmo muro baixo e longo, que ele via todos os dias, olhando mais atentamente Joaquim, este era o seu nome, nota um pacote de biscoitos fechado e era do tipo recheado e de chocolate o seu preferido, c h o c o l a t e.

Não tinha dono, alguém o havia esquecido por lá, se não era de ninguém, que mal faria, olhou para todos os lados e pegou o pacote de biscoitos, abriu e foi saboreando um por um, caminhando mais lentamente, se deliciando com o sabor, no quarto biscoito, sentiu uma tonteira e suas pernas bambearam, sentiu que iria cair, então, se amparou no muro e sentiu um forte puxão que o levava para dentro de um portão, depois não viu mais nada.

No dia seguinte, estampado nas principais manchetes de jornal, estava seu corpinho inocente, todo machucado, deitado de costas só de cuecas, morto, com os dizeres, biscoito do mal, engana inocente, menino Joaquim encontrado seviciado e morto próximo ao bairro da Ladeira do Guararapes, ainda não há indícios de quem cometeu o crime, a polícia permanece investigando.

Quantas vezes a mãe de Joaquim, o avisou que não aceitasse nada de desconhecidos, mas, ela nem podia imaginar, que seu filho, não deixara de cumprir suas determinações, foi o acaso que colocara o biscoito maldito no caminho dele, o mesmo não lhe fora oferecido, não por uma pessoa, mas por um possuído, instruído por um espírito maligno.

O pai de Joaquim tenta por tudo consolar a mulher e as duas filhas, mas, a dor é insuportável, perder um filho e o irmão  não estava sendo fácil para a família. Os dias, vão se passando, a vida tem que continuar, nenhuma pista foi encontrada, pela polícia, até aquele momento. Enquanto arrumava a casa, a mãe do falecido Joaquim, encontra no armário, na parte onde ficavam as roupas e documentos de seu marido, um saquinho com um pó esbranquiçado, e bem envolvido por uma camiseta surrada, um pacote de biscoitos recheados, sua mente estalou em fúria e pânico, nunca poderia imaginar que o assassino perverso de seu amado filho, morasse sob o mesmo teto, um terror a invadiu lacerante, sentou no chão do quarto, sem saber o que fazer, pois à noite seu marido chegaria e as meninas logo estariam de volta com a Kombi da creche, precisava esfriar a cabeça e tomar uma decisão sensata, ir até a polícia e denunciá-lo, mas, a raiva que tomara seu corpo a direcionou para outros passos.

Friamente ela pegou os biscoitos e tal pó, colocou tudo dentro do liquidificador e completou com os ingredientes necessários para uma mousse de chocolate, doce predileto de seu marido, colocou pra gelar. No quarto separou suas melhores roupas e acessórios, documentos dela e das crianças e guardou a mala sob a cama de casal. Foi até o quarto das crianças, deixou sobre a cama duas fantasias de princesa, sapatilhas e agasalhos, colocou tudo, em outra mala, os brinquedos e bonecas menores de suas meninas, suas melhores roupas e sapatos e guardou a mala de novo em cima do armário, onde ela sempre ficava. Pegou o cartão do banco e sacou todas as economias da família, daria para mantê-las por uns dois meses.

Quando as meninas chegaram, ela as alimentou, pediu que vestissem suas roupas de princesa e lhes deu um calmante fraquinho, o que faria com que elas adormecessem mais cedo, se vestiu simplesmente e aguardou a chegada do marido, colocou seu prato pronto e quente, em banho-maria no fogão, a mousse já estaria pronta quando ele retornasse, havia servido somente uma tigela e jogara o restante fora, a sobremesa era só para ele.

Lá pelas nove da noite, seu marido chega cansado e faminto, procurando pelas meninas, ela respondeu que elas brincaram tanto de princesas, que logo que jantaram, adormeceram e ela não quis acordá-las, no dia seguinte tomariam banho. O marido foi tomar um banho avisando que estava cheio de fome, ela disse que já estava tudo pronto e que fizera até seu doce preferido, ele após o banho, comeu com prazer, louco pela sobremesa, ela prontamente o serviu, o chamou para o quarto, para que ele comesse a sobremesa, sentado mais confortavelmente em sua cama, enquanto conversavam, sobre como fora o dia.

Serenamente ela esperou que ele se deliciasse com o doce, e quase no final da tigela ele começou a ficar vermelho, espumando volumosamente pela boca, e sem conseguir falar, estava lhe faltando o ar, ela friamente sentada na beirada da cama, observava e aguardava sua morte, repetindo para si mesma, baixinho, Joaquim agora você está vingado.

Chamou um taxi, colocou as bagagens na mala, pediu ajuda para o motorista, para ajudá-la para pegar as filhas e acomodá-las dentro do carro. Indicou que queria ir para rodoviária, lá chegando acordou as meninas, pegou um carrinho para as bagagens, comprou passagens para uma cidade do interior bem distante de outro Estado, embarcou e deixou pra trás um crime, uma decepção, uma vida falsa, seu único alento, foi a sua vingança, suas meninas, que ainda eram muito pequenas, logo tudo seria esquecido.

Foi na fé de que tudo iria dar certo. Se, conseguiu seu intento ou não, se por não ser ninguém de nome, celebridade ou coisa que o valha, a polícia esqueceria toda essa situação, isso ainda não posso contar, deixo o final dessa história para sua imaginação....

 
Cristina Gaspar
Rio de Janeiro, 06 de junho de 2015.

 
Cristina Gaspar
Enviado por Cristina Gaspar em 06/06/2015
Reeditado em 06/06/2015
Código do texto: T5268456
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