NAVIO MALDITO
Sentinelas dos olhos rubros cheios de sangue, sussurram suas lamúrias e misérias, no claustro frio, silente e mórbido do porão do navio. Personagens surreais na fábula de horror enredada pelo Capitão Manfield, o pirata. Arlen e Otto, criaturas sem eira nem beira, mercenários de pouca monta, sem preço ou fidelidade, alma ou compostura, pagos com restos nefastos de investidas cruzadas na morada dos mortos, despojos de cadáveres, saques marítimos, punhais e espadas, trabalho sem patrão, apenas temporário. Sem outra opção naquele porto perdido nas costas africanas, aceitaram a faina ofertada pelo capitão, sem antes investigarem seu contratante, um sádico, bestial e infame, que não pretendia pagá-los e sim desová-los no mar assim que fosse completada a jornada pretendida. Nem notaram que muito poucos mercenários como eles, embarcaram no navio, e as caras do que lá estavam não eram nem um pouco amistosas, sequer pareciam concorrentes, talvez, penso eu, fossem tão cegos por dinheiro quanto Arlen e Otto.
Navio equipado e abastecido, saíram do porto rumo a um destino ainda não divulgado, seguindo ao sabor das ondas daquele imenso oceano. Depois de se afastarem bastante da costa, o Capitão disse que o destino era uma outra ilha, invadida e saqueada por outros piratas, que não conseguiram escapar de uma violenta tempestade, deixando pra trás morte, mulheres defloradas e pedras preciosas, nenhum homem na ilha sobreviveu, o capitão tinha conhecimento que as mulheres não teriam como escavar as cavernas da ilha para pegar as pedras, então, era um bote fácil, isso, ele assim pensava. Depois de 02 meses no mar, o clima de suspense aumentando, avistaram a tal ilha, parecia ao longe que não era habitada.
Ancoraram onde foi possível, desceram os botes, eram três, doze pessoas apenas estavam a bordo, no navio ficou somente um, que ficou responsável por avisá-los de qualquer aproximação através de um lampião e apito. O capitão seguia na frente com seu imediato, a ilha não era muito grande, foram enveredando pela mata, até alcançarem umas cabanas onde estavam algumas mulheres lindas, mal vestidas e inexplicavelmente, acorrentadas a postes no centro de uma espécie de praça. Elas começaram a gritar desesperadamente pedindo ajuda para libertá-las. O capitão deu ordem para que soltassem apenas a que parecia mais velha, embora todas fossem jovens. Ela disse que homens vestidos de azul e grená haviam invadido a ilha e levado todos os homens e as tinham deixado acorrentadas para morrer, eram pelo menos doze mulheres. O Capitão Manffield não deu importância, só queria saber onde ficavam as tais cavernas para retirar as pedras preciosas. Arlen era mercenário e tolo, mas, não burro, lembrou que o capitão contara a história da invasão da ilha, como ela tendo acontecido há alguns anos, então, essas mulheres já seriam cinzas, isso não estava cheirando bem, tentou alertar ao capitão, que com um belo soco em seu queixo, o fez calar rapidamente.
Arlen comentou com Otto e com mais um dos mercenários, que naquele momento estavam se divertindo com as mulheres ainda acorrentadas e pouco estavam dando atenção a ele nem ao próprio capitão, que com um tiro para o alto, acabou com a farra, agarrou a mulher que libertara e foi seguindo para onde ela indicou serem as tais cavernas, foi arrastando a mulher de qualquer maneira, às vezes até arrastando-a pelas pedras. Mais uma vez Arlen reparou que ela não gemia, não reclamava e mesmo sendo fortemente arrastada nenhuma só marca ficava em seu corpo, não sangrava, nada, nada, nada, Arlen estava começando a ficar bem assustado, doido para sair daquela ilha estranha, mas, voltar como?
Chegaram depois de uma hora de caminhada se embrenhando pela floresta, até a primeira das três cavernas, logo na entrada, muitas pedras mato fechado, como se ninguém tivesse passado por ali antes, se a história que o capitão contara era verdade, tudo fazia sentido, o mato cresceu, o absurdo eram aquelas estranhas mulheres...
Quando conseguiram entrar na caverna, algumas pás e picaretas enferrujadas estavam jogadas por todo lado, Os homens apressaram-se para pegá-las, acenderam tochas e foram seguindo para o fundo da caverna com cuidado, Arlen notou que a mulher continuava calada e observou que sua pele meio que transluzia no escuro da caverna, talvez por ser muito branca, mas, nada estava muito de acordo, acorrentada ao sol, sua pele deveria estar esturricada, isso não estava cheirando muito bem. Arlen chamou Otto de lado, explicou o que ele estava notando desde que chegaram a ilha, e Otto começou a ficar preocupado, seria uma armadilha, se fosse estariam mortos em pouco tempo, não conheciam o lugar e suas armas eram poucas.
Otto e Arlen resolveram se distanciar do grupo, indo no sentido contrário, retornando a entrada da caverna, assim fizeram e retornaram à praça das mulheres acorrentadas, ninguém estava mais lá, em corrida desabalada, foram na direção dos botes ancorados na praia, chegando lá nem botes, nem o navio estavam à vista. Um terror total tomou conta de seus corpos, correram pela praia, e nada avistaram, estavam presos na ilha maldita. Com as forças que ainda tinham, contornaram a ilha, tentando acessar a tal caverna por outro lado, com certo esforço conseguiram, entraram aos gritos, mas, só encontraram uma caverna cheia de corpos sem rosto de seus companheiros de viagem, nenhum som, nem mulheres à vista, desespero total.
Arlen e Otto, não tinham mais fôlego, pegaram as armas que estavam junto aos corpos, elas estavam sem pólvora e nem em nenhum um dos corpos havia os saquinhos que as abasteciam, eram inúteis, com seus punhais sentaram na entrada da caverna aguardando o destino que lhes seria infringido.
À noite começava a chegar, nem ruído de pássaros ou qualquer outro animal, de um repente, passos, muitos passos, mulheres lindas vestidas de véus negros esvoaçantes, translúcidas foram se aproximando silenciosas e com sorrisos macabros nos lábios apáticos, era chegado seu fim, pensaram Otto e Arlen.
Da mesma forma que elas apareceram, sumiram, como se tivessem sido transportadas para outra dimensão. Os corpos de Arlen e Otto começaram a esfriar rápida e vertiginosamente, sentiram a pele encolhendo de forma absurda e dolorosa, escuridão, e mais nada...
Cristina Gaspar
Rio de Janeiro, 31 de março de 2015.
Sentinelas dos olhos rubros cheios de sangue, sussurram suas lamúrias e misérias, no claustro frio, silente e mórbido do porão do navio. Personagens surreais na fábula de horror enredada pelo Capitão Manfield, o pirata. Arlen e Otto, criaturas sem eira nem beira, mercenários de pouca monta, sem preço ou fidelidade, alma ou compostura, pagos com restos nefastos de investidas cruzadas na morada dos mortos, despojos de cadáveres, saques marítimos, punhais e espadas, trabalho sem patrão, apenas temporário. Sem outra opção naquele porto perdido nas costas africanas, aceitaram a faina ofertada pelo capitão, sem antes investigarem seu contratante, um sádico, bestial e infame, que não pretendia pagá-los e sim desová-los no mar assim que fosse completada a jornada pretendida. Nem notaram que muito poucos mercenários como eles, embarcaram no navio, e as caras do que lá estavam não eram nem um pouco amistosas, sequer pareciam concorrentes, talvez, penso eu, fossem tão cegos por dinheiro quanto Arlen e Otto.
Navio equipado e abastecido, saíram do porto rumo a um destino ainda não divulgado, seguindo ao sabor das ondas daquele imenso oceano. Depois de se afastarem bastante da costa, o Capitão disse que o destino era uma outra ilha, invadida e saqueada por outros piratas, que não conseguiram escapar de uma violenta tempestade, deixando pra trás morte, mulheres defloradas e pedras preciosas, nenhum homem na ilha sobreviveu, o capitão tinha conhecimento que as mulheres não teriam como escavar as cavernas da ilha para pegar as pedras, então, era um bote fácil, isso, ele assim pensava. Depois de 02 meses no mar, o clima de suspense aumentando, avistaram a tal ilha, parecia ao longe que não era habitada.
Ancoraram onde foi possível, desceram os botes, eram três, doze pessoas apenas estavam a bordo, no navio ficou somente um, que ficou responsável por avisá-los de qualquer aproximação através de um lampião e apito. O capitão seguia na frente com seu imediato, a ilha não era muito grande, foram enveredando pela mata, até alcançarem umas cabanas onde estavam algumas mulheres lindas, mal vestidas e inexplicavelmente, acorrentadas a postes no centro de uma espécie de praça. Elas começaram a gritar desesperadamente pedindo ajuda para libertá-las. O capitão deu ordem para que soltassem apenas a que parecia mais velha, embora todas fossem jovens. Ela disse que homens vestidos de azul e grená haviam invadido a ilha e levado todos os homens e as tinham deixado acorrentadas para morrer, eram pelo menos doze mulheres. O Capitão Manffield não deu importância, só queria saber onde ficavam as tais cavernas para retirar as pedras preciosas. Arlen era mercenário e tolo, mas, não burro, lembrou que o capitão contara a história da invasão da ilha, como ela tendo acontecido há alguns anos, então, essas mulheres já seriam cinzas, isso não estava cheirando bem, tentou alertar ao capitão, que com um belo soco em seu queixo, o fez calar rapidamente.
Arlen comentou com Otto e com mais um dos mercenários, que naquele momento estavam se divertindo com as mulheres ainda acorrentadas e pouco estavam dando atenção a ele nem ao próprio capitão, que com um tiro para o alto, acabou com a farra, agarrou a mulher que libertara e foi seguindo para onde ela indicou serem as tais cavernas, foi arrastando a mulher de qualquer maneira, às vezes até arrastando-a pelas pedras. Mais uma vez Arlen reparou que ela não gemia, não reclamava e mesmo sendo fortemente arrastada nenhuma só marca ficava em seu corpo, não sangrava, nada, nada, nada, Arlen estava começando a ficar bem assustado, doido para sair daquela ilha estranha, mas, voltar como?
Chegaram depois de uma hora de caminhada se embrenhando pela floresta, até a primeira das três cavernas, logo na entrada, muitas pedras mato fechado, como se ninguém tivesse passado por ali antes, se a história que o capitão contara era verdade, tudo fazia sentido, o mato cresceu, o absurdo eram aquelas estranhas mulheres...
Quando conseguiram entrar na caverna, algumas pás e picaretas enferrujadas estavam jogadas por todo lado, Os homens apressaram-se para pegá-las, acenderam tochas e foram seguindo para o fundo da caverna com cuidado, Arlen notou que a mulher continuava calada e observou que sua pele meio que transluzia no escuro da caverna, talvez por ser muito branca, mas, nada estava muito de acordo, acorrentada ao sol, sua pele deveria estar esturricada, isso não estava cheirando muito bem. Arlen chamou Otto de lado, explicou o que ele estava notando desde que chegaram a ilha, e Otto começou a ficar preocupado, seria uma armadilha, se fosse estariam mortos em pouco tempo, não conheciam o lugar e suas armas eram poucas.
Otto e Arlen resolveram se distanciar do grupo, indo no sentido contrário, retornando a entrada da caverna, assim fizeram e retornaram à praça das mulheres acorrentadas, ninguém estava mais lá, em corrida desabalada, foram na direção dos botes ancorados na praia, chegando lá nem botes, nem o navio estavam à vista. Um terror total tomou conta de seus corpos, correram pela praia, e nada avistaram, estavam presos na ilha maldita. Com as forças que ainda tinham, contornaram a ilha, tentando acessar a tal caverna por outro lado, com certo esforço conseguiram, entraram aos gritos, mas, só encontraram uma caverna cheia de corpos sem rosto de seus companheiros de viagem, nenhum som, nem mulheres à vista, desespero total.
Arlen e Otto, não tinham mais fôlego, pegaram as armas que estavam junto aos corpos, elas estavam sem pólvora e nem em nenhum um dos corpos havia os saquinhos que as abasteciam, eram inúteis, com seus punhais sentaram na entrada da caverna aguardando o destino que lhes seria infringido.
À noite começava a chegar, nem ruído de pássaros ou qualquer outro animal, de um repente, passos, muitos passos, mulheres lindas vestidas de véus negros esvoaçantes, translúcidas foram se aproximando silenciosas e com sorrisos macabros nos lábios apáticos, era chegado seu fim, pensaram Otto e Arlen.
Da mesma forma que elas apareceram, sumiram, como se tivessem sido transportadas para outra dimensão. Os corpos de Arlen e Otto começaram a esfriar rápida e vertiginosamente, sentiram a pele encolhendo de forma absurda e dolorosa, escuridão, e mais nada...
Cristina Gaspar
Rio de Janeiro, 31 de março de 2015.