O Início (Sucessor de "Prólogo")
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Acordei com o som do meu celular despertando. Nem acreditava que já era outro dia de trabalho. Levantei desanimado, me troquei mais lentamente do que o habitual e fui comer algo. Não estava com fome, nunca estava. Visto que era segunda-feira, pós festa de domingo (confesso que uma das melhores a que já fui), estava com uma forte dor de cabeça por conta do que eles popularmente chamam de “ressaca”, e não sentia fome alguma.
Logo depois de sair de casa, fui para mais um dia angustiante de trabalho. Realmente eu estava perto do meu limite naquela empresa. Os afazeres estavam se tornando uma árdua tarefa a cumprir. Apenas permanecia pois não tinha outro modo de sobreviver, além, é claro, de me mudar para a casa dos meus pais, o que não pretendia fazer de novo.
Houve uma época em que ainda era bastante dependente dos meus pais. Surpreendentemente, o que eu precisava, eles me davam. Eram extremamente ricos, não ligavam muito para o dinheiro, já que seria difícil ele chegar ao fim. Entretanto, ao contrário de muitos filhos que, com certeza, adorariam todo esse mimo, eu desgostava da situação. Não me sentia bem com meus amigos se auto sustentando e eu morando com os pais ainda, parecendo um riquinho metido. Não gostava de ricos. Idiotas. Acham que só porque têm mais dinheiro, podem discriminar os outros, cometer crimes e depois “soltar” dinheiro aos policiais e tudo fica bem. Pura injustiça.
Afinal, o mundo é formado de injustiças, não é? Desde a tomada de terra do Brasil pelos portugueses, passando pelo holocausto e pela escravidão, até chegar nos dias de hoje, com tantos crimes ocorrendo e os bandidos sendo soltos como se não tivessem feito nada. Sociedade podre essa em que vivo. Todos nós. Até eu, que defendo os famosos ideais franceses de igualdade, liberdade e fraternidade, não sigo-os à risca. Pelo menos tenho a visão de que o mundo está sendo destruído aos poucos, e a sociedade sendo corroída gradativamente, com os “inteligentes” mandando e os ingênuos cidadãos de bem cumprindo sem nem saber o mal que causam a si mesmo.
Alienação, é isso que digo. A sociedade é alienada. Me pergunto se algum dia isso vai levar a algo mais sério, pois revoltas já não são tão eficientes como no passado. E o pior de tudo é que antes ainda havia a Ditadura, agora somos supostamente uma democracia. Mas chega de discutir sobre isso. Vamos ao período em que tudo o que nós conhecíamos foi destruído. Os ideais, a distinção entre o bem e o mal, tudo. Poucas pessoas sobreviveram, penso eu. E não falo de vida, mas sim de mente. A maioria se submeteu à nova “política”, apavorada. Uma pequena, mas bem pequena mesmo, minoria guardou seus ideais e se aventurou a ser um “excluído” da sociedade atual.
Eu era um “excluído”, na verdade sempre me senti como um. Não pensava como os outros de minha classe. Eles tinham senso comum, e não crítico. Não sabiam dar sua opinião sobre assuntos fáceis de opinar. Agora, ou estão mortos, ou são os chefes. Devo admitir que eu não estava em situação melhor, já que tinha que agir às escuras para evitar uma possível morte. Não tinha medo da morte, mas o que eles faziam para matar... Transformaram a simples morte em algo medonho, horrível e, pior, em tortura. Tanto para quem vê, quanto para a vítima.
Quando assistia a filmes de terror (meu gênero predileto) como Jogos Mortais, ou qualquer outro em que os “selecionados” eram forçados a se torturarem de tal modo de não suportariam a dor, ficava imaginando quem seria o psicopata que faria algo assim na realidade. Desejava nunca ter imaginado isso, pois agora não era um psicopata, era um monte deles. No princípio foi um, mas de repente ele foi formando um pequeno exército de loucos, e aconteceu tudo tão rápido que ninguém percebeu a armada secreta surgindo. Foi aí que o inferno começou.