Olho

Acordado. Após uma noite de sonhos agitados. Perseguido por cães, enfrentando-os apenas com as mãos, segurando suas mandíbulas de fúria. Também preso dentro de um elevador suspenso em níveis inimagináveis, balançando dentro da caixa de aço, como um pêndulo, contemplando a vista de tamanha altura. Ainda, com os dedos presos no beiral da lateral de um prédio alto, aguardando o socorro, prestes a despencar. Não sabemos eu é sonho, por isso nosso desespero diante do absurdo. O receio de se jogar e despedaçar-se, já que não se tenta averiguar se é ilusória a cena. O pânico dos que dormem, eu pode se tornar um pesadelo ao acordarem.

Abre os olhos, sentido algo anormal. Diante do espelho, observa seu olho esquerdo vermelho, como se tivesse rompido algum vaso, fazendo com que o tom púrpura envolvesse toda a órbita. Uma pessoa que divide a cama, aponta de comenta sobre aquela aparência estranha, presumindo algo nefasto. Passa o dedo indicador abaixo do olho, puxando a pele, tentando encontrar algo dentro. Nesse instante escorre o sangue, como um choro de vampiro, que suja-lhe o peito. O olho se torna mais limpo, ainda podendo contemplar alguns pingos avermelhados, outros mais sólidos, por motivo de coagulação. Aperta com dedo, sentindo um pequeno fragmento de carne sair e pender. Fica com aquele apêndice pendurado, com receio de arrancar e causar algum dano irreparável.

Senta na beirada da cama e se desespera. A mão pousada sobre o olho direito. Resolve tomar um banho. Ensaboa o peito sujo, deixa a água corrente inundar as vistas, com intuito de limpar. Enxuga o corpo, indo em direção do espelho embaçado, passando as mãos para poder enxergar-se. Não encontra mais respingos de sangue, só mesmo aquela carne pendurada e o olho parecendo desejar sair junto, um tanto quanto oblíquo. Resolve utilizar um alicate de unhas para decepar aquela carne. Corta, e para seu espanto, não sangra. Apalpando aquele pedaço de textura flácida, jogando na privada e dando descarga. Percebe em seguida, que um fragmento novo se insinua. Espreme e ver sair mais uma fração de carne. Continua espremendo e cortando. Resolve apenas espremer, sem cortar. O volume que sai, cobre-lhe o olho.

Só chora por uma das órbitas. Irritado, começa a puxar aquela carne, que vai saindo feito um novelo sendo desenrolado. Sente-se tonto e se joga sobre uma poltrona, amparando aquele apêndice nojento. A mulher suplica que não toque mais naquilo e procure auxílio de um profissional. Com um forte puxão, arranca o restante, vindo o olho junto. Observa com a vista que sobra, aquele cordão de carne com seu olho agarrado na extremidade. Serve-se de uma faca, arrancando seu olho, indo diante do espelho e posicionando-o na cavidade orbital. O olho é fixado, mas rola em seguida, indo parar dentro da pia do banheiro, parecendo não ter mais sustentação. As mãos femininas, com sua delicadeza, tentam auxiliar, cuidadosamente encaixando o olho, que rola novamente.

Pensa em utilizar algum produto, como cola. Fica com receio de perder a visão. Pois o olho solto, enxergava. Quando rolava para a pia, embaralhava sua vista, pelo entrecruzamento da visão do olho fixo, que visualizava a tragédia, e do olho solto, que ia rolando, mostrando imagens num fluxo de movimento circular. Seu cérebro se confundia com tais cenas e sentia um leve desmaio. Amparava o olho com a mão e colocava na altura do outro, podendo assim, ter uma visão parecida com a de antes do seu drama. Fez sexo com aquela estranha naquele momento. Deixando seu olho solto, sobre uma cadeira. Era como se fosse o amante e um voyeur ao mesmo tempo. Isso o fez gozar como nunca havia feito antes. Existia o desconforto da mulher, observando aquele olho solto e a cavidade na face daquele amante. Após o sexo, a mulher fumava, soltando algumas lufadas de fumaça naquele poço orbital. Riram de tudo aquilo, bebendo cerveja.

Fora tomado pela ideia de ler dois livros ao mesmo tempo. Mas a confusão de imagens o fez vomitar. Começou a sincronizar imagens. Seu olho solto era um espião. Era deixado em locais estratégicos, para ver como se comportavam longe de sua pessoa. Andava de óculos escuros para disfarçar a falta, dizendo que aquilo era um amuleto, que não era de verdade. Assim, pode espiar a filha de um amigo, enxugando seu corpo jovem no quarto. Fechara o olho fixo, só para ter a imagem da jovem nua, com seios que lhe enchiam a boca de saliva. Tudo correndo como desejava.

Até que em um dia de sexo com sua amante, o olho solto rolou da cadeira em ficava para apreciar o ato. na tentativa de encontrá-lo, arrastaram móveis,a mulher, sem perceber, esmagou-o com os és. A sensação fora terrível, como se uma onda de sangue e dor invadisse aquela órbita vazia. Segurava a cabeça, parecia que seu cérebro explodiria. Chegou próximo à sacada e se jogou. A mulher ouviu o impacto do corpo de onde estava. Acendeu um cigarro, colocando um cd de jazz e deitando-se sobre os lençóis, ainda se masturbando para compensar o orgasmo que não tivera. Os vizinhos disseram que a companheira do morto gritara de horror por contemplar o sujeito despedaçado, mas naquela noite, ela tivera um orgasmo, pela primeira vez, sentindo que seus dedos eram mágicos e que seu rosto era maravilhoso, com os dois fixos e de um castanho bem vivo.

Bruno Azevedo
Enviado por Bruno Azevedo em 20/12/2012
Código do texto: T4045110
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