Captura

No centro de um bosque, um fugitivo. Que aponta uma arma para si, através de outras mãos, recebendo o projétil na órbita esquerda, esfacelando o globo ocular e adentrando a caixa craniana, causando uma explosão na parte traseira, que esfacela o osso do crânio, deixando um rombo que faz escorrer massa encefálica em abundância. O corpo sucumbe e cai sobre o pântano, espalhando água espessa em lama, que salpica gotículas no executor que não se mexe. A água com lama, invade o crânio aberto, misturando ao sangue e cérebro, misturando matéria viva com alma morta. Pássaros corajosos não voaram com o estrondo do tiro, feito abutres a espera de sua porção. Passos esmagando a folhagem seca se distanciam, sob os piados das aves que quase lamentam a tragédia assistida. Só o vento parece assoviar, como um coveiro acostumado com sua função de assoprar, indiferente ao que lhe é rotineiro. Levando o cheiro de morte aos carnívoros famintos e ou parasitas.

Do lado de fora, criaturas meio homem e meio máquinas, transitam pelo calçamento, desviando de obstáculos humanos por inteiro. Na praça a nudez da criança é violenta, contra os moralmente vestidos, que perderam a inocência desse estado, relegados ao sentimento de erro, que passa a guiar suas ações. Uma criatura de pelos descoloridos, desfila com seu topete chamativo, como um farol que guia os curiosos. Tudo próximo ao estrondo duro, do pombo atropelado pela máquina que precisa queimar combustível, deixando a ave caída, com um rastro de penas espalhadas. Cena de tragédia, que deixa os olhos preocupados com outras máquinas que contornam o cadáver que sangra. Apenas um instante depois, um veículo de porte maior, deixa suas rodas, acostumadas ao duro fardo de asfalto, transitarem por cima do corpo do pombo, que cede facilmente, espalhando seus órgãos e sangue, formando uma superfície plana, grudada ao solo.

O sino soa suas doze badaladas. As pessoas, aglomeradas e mudas, inspecionam umas as outras. Próximas ao prédio que mantém indivíduos conectados a sondas, com líquido que escoa para dentro de corpos reclusos. Agulhas tecem crochê em veias estouradas, criando hematomas em peles finas. O sangue espirra em esguichos fortes e certeiros, manchando o lençol branco, que expõe toda a nudez da fragilidade humana, que perde a referência moral, rendendo a necessidade que uma outra estética dita. Não é mais o som do sino que alerta, mas sim uma estridente sirene, que angustia quem necessita acioná-la. Senhas que conduzem ao interior ou ao exterior, promovendo um trânsito patético. Horas depois, relegados a uma nova captura, que é engolida e digerida, dissolvendo-se no organismo resignado.

Percorrendo distâncias, através de máquinas sedentas por consumo. Em um sobe desce de movimentação desastrosa, acaba deslizando pela superfície rígida e pouco aderente. A captação dos olhos de medusa de um ser pálido, de aparência doce, que aprisiona no instante em que capta. A chegada em duas portinholas que se abrem em forma de abraço. Preso a um ambiente frio e de música triste. O Ciclope o cega com seu olho luminoso, com braços que se estendem para sufocá-lo. Feito ouriço metálico, os espinhos adentram sua pele, cavando-lhe as gengivas, rompendo os nervos e abafando o grito que é sufocado pela agulha que penetra, com sua delicadeza de picada inseta, que deixa o veneno, após expelido, inundar as brechas que seu ferrão sulcara. Rostos de pouco emotividade, figuram em uma gravura quase imóvel. O gosto de sangue que é caracteristicamente ferruginoso.

Bruno Azevedo
Enviado por Bruno Azevedo em 20/10/2012
Código do texto: T3942549
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