Máquinas de Guerra
Em cada esquina, mais, a cada passo. Na verdade, a cada olhar ou suspiro. As máquinas de guerra estão ativadas. Onde e quando? Talvez até se possa precisar, mas como e porque, fica a dúvida dos cérebros orgânicos, ávidos por insinuações. O pico é sempre o que virá, pois, por mais que se empregue, parece haver infinitas possibilidades adiante, ainda que o infinito seja finito em toda sua extensão. Corremos sem nunca alcançarmos, são mais velozes que nossas articuladas pernas, se fazem de amparo, nos sustentando com sua síndrome de muleta. Pé ante pé, ou quem sabe, unidos em passos estreitos, contidos em quadrantes que o caminhante delimita. Ontem eu era pó, agora já me vejo em formas menores que grãos e maiores que qualquer coisa que possa contê-las. Solidificando essa estrutura que se adianta, não saindo do lugar.
Parado, sobre uma calçada. Contemplando a avenida que flui, até mesmo estando vazia do fluxo costumeiro, se fazendo de superfície asfáltica, pronta para que deslizem emborrachados sobre si. Ambos são negros, mas um se faz círculo só para poder explorar o outro, que se expande passivo. O que são linhas demarcatórias, diante do fenômeno que acelera, fazendo do espaço um campo aéreo, onde possa decolar. O pouso é sempre um impacto, ainda que a decolagem também seja. É pra baixo que imaginamos a pressão maior atmosférica. Parece que para baixo é sempre mais tenebroso, por puro preconceito teológico, ou mero senso comum telúrico, de valorização subterrânea. Não passa de inveja, daqueles que podem cavar, pouco se importando com a morte, pois a cova é rasa o bastante para passar despercebida. O caixão é mero adorno, para quem vive com a terra sobre si.
Agora é possível escutar os ruídos. Engrenagens rangem, fazendo com que a enxaqueca comece, com data imprevista de término. Tentar decifrar a cabala dessa mecânica, é aprisionar-se em um talvez que vez ou outra lhe faz perceber que se tornou um tal, sem um qual que acompanhe. Nem a brisa me conforta, por acreditar que o vento é fabricado, feito um bafo poluente que intoxica. Eis a minha sonata. Creio haver algum maestro oculto, movendo os cabos, embora acredite que apenas aperte botões, até ficar lesionado por esforço repetitivo. Para isso existem os entorpecentes, que relaxam a mente, provocando-lhe uma tensão extrema, a ponto de parecer aliviar, pela calmaria que o estado de catalepsia provoca. Todos em busca da cura, já que inventamos a doença. Dispositivos conectados são despercebidos, tornando-se apenas um prolongamento dos membros.
Neste semáforo, sou signo que dá sinais de atrofia. Imagens diversas navegam perante meus vítreos olhos. Beija agora, antes que a boca comece a falar. Pois o vomitório verborrágico é mudo de sentido. Se aquelas flores artificiais, fossem verdadeiras em sua falsificação, seriam por todos, conservadas. Mesmo os animais de estimação, domesticam a cada dia seus prováveis donos, por não se importarem em agir no ritmo dos motores. Os raios solares queimam, mas ainda, não o bastante. Só mesmo com a aproximação do astro que inspirou desde tempos remotos, poderíamos ver tudo isso derreter, inclusive o planeta. Todos engolidos por um calor supremo, que consiga expurgar o que até hoje se conservara. Quantos sóis serão necessários para expurgar além desse mundo? Por via das dúvidas, a espinha esfria quando a fresta solar aquece, pois o receio dessa aproximação apocalíptica é real, já que o medo se alimenta de hipóteses.
Ainda tentando se desvencilhar dessa armadilha, humanos são catalogados, formando vitrines vivas, que perambulam divulgando o slogan do infortúnio. A falta de exaustão não é de se invejar, já que a mecânica é morta a partir do momento que nasce. Todos se tornam deuses de uma criação apática, que precisa sugar essa energia vital para sobreviver. A ideia de deus é ser hospedeiro, cultivando parasitas. Só quando perceber a não necessidade de ser habitado, é que se consegue aniquilar a prole maldita. Tal resolução exige a morte desse ego, que admira criar e se ilude fragmentando. Tudo se passando, sob as órbitas daquele rosto infantil, que pode não ser mais pessoal, apenas máquina, condicionada a gestos repetitivos. Na dúvida se acena, já que a saudação gestual a cada dia se faz mais necessária, fazendo com que muitos já andem de braços erguidos, antecipando o encontro com o outro já prevenido.