Doctor Death
Local subterrâneo, um corredor sombrio, iluminação precária, sons de águas pingando, um eterno vazamento. No final, uma porta de aparência enferrujada. O cômodo amplo, mal cheiroso, onde as paredes enegrecidas demonstram estética lodal e fùngica.
Dentro, uma figura encurvada, corpo franzino, mas não menos vigoroso em matéria de força física, trajando roupas de cirurgia, com um avental de açougue. As luvas já não respeitam as regras de higiene, possuem manchas de um vermelho opaco.
Duas pequenas janelas, ou pequenos vitrais, sempre fechados, escurecidos com crosta de sujeira, praticamente um insulfilm. O teto, assim como as paredes, amarelados, um tom de bege, sem contar a poeira que faz contraste, dando coloração diversificada, ainda que apática, doentia..
Numa maca um corpo obeso, deitado de qualquer jeito, as pernas caídas pra fora da estrutura metálica, nu, a vulva volumosa exposta, os olhos abertos em desafio cadavérico. Sem brilho no olhar, apenas o negrume que faz harmonia com o ambiente. A pele amarelada, os cabelos negros que se juntam ao olhar sombrio e ao ambiente negro.
Em um biombo, escondido entre cortinas manchadas de sangue escuro, encontra-se um sujeito deitado. Uma cama de enfermaria, suas pernas abertas, praticamente uma posição que para mulheres seria ginecológica, nu. O olhar de pânico tenta procurar uma causa. Apenas está ali, naquele ambiente que cheira mal, maldade espreita no ar. Não consegue gritar, sua boca encontra-se fechada, lacrada, parece ter sido costurada. Consegue ver apenas alguns fios, seus sussurros saem comprimidos.
As cortinas se abrem, mãos em luvas sujas revelam o outro lado antes oculto. Um ser com aparência médica, trajes que remontam a hospital, mas olhar de algo desumano, por mais humano que possa ser.
No outro extremo do cômodo, em outro biombo, uma mulher, até repararia ser bela, se não estivesse mais preocupado consigo, o motivo de estar ali, o que representavam todas aquelas figuras, o que iria acontecer no momento seguinte?
A mulher também tentava se comunicar, boca lacrada, mais sussurros, comunicação incompreendida, apenas gemidos surdos ao ouvinte distante daquela dolorosa sinfonia. Também deitada nua, já na posição pra ela corriqueira em exames ginecológicos, exposta acintosamente.
A criatura se aproxima, porta um instrumento que a princípio parece um espeto, o homem se inquieta, totalmente imóvel da forma como foi amarrado. O ser, com paciência, segura-lhe o falo, começa a introduzir o instrumento. A ponta fazendo recordar uma caneta, facilita a entrada, o restante, um corpo sólido e reto, metal cirúrgico.
— Parece ter a espessura do cabo de um espanador. Sinto ser perfurado por dentro. Que dor horrível. Hhumm humm humm!!!
O carrasco continua a introduzir, mais de 30 centímetros, com certeza, força para que o objeto entre inteiro. O sujeito em prantos sente que força sua bexiga, a urina escorre, junto com sangue vivo. Lágrimas, urina, sangue.
No momento a dor alivia, o ser busca outro objeto mais fino, introduz dentro do cano que o perfurou. Cano por ser oco. O novo objeto é uma câmera, a criatura olha num monitor o seu interior. Enquanto isso, começa a pressionar o objeto, causando mais sangramento e dor, dando leve movimento de rotação, quase fazendo a vítima perder os sentidos.
A mulher, diante daquele espetáculo, tenta espernear, mas também encontra-se amarrada. O ser abandona o homem, se aproxima dela, contempla o olhar vivo feminino, misturado com o medo que salta. Retira de uma bandeja cirúrgica, uma lâmina de barbear. Vai em direção a um imundo lavatório, recolhe um pequeno sabonete com pentelhos grudados. Abre a torneira com água enferrujada, molha o sabonete. Dirige-se até a mulher, passa o sabonete em seus pelos pubianos, depois a mão para causar espuma, deslizando em seguida a lâmina. A gilete cega causa pequenos cortes a medida que raspa os pelos.
O homem do outro lado se recompõe da dor sofrida, angustiado em ver a mulher em tal estado, seu pânico mistura-se a curiosidade de visualizar o que tal figura pretende. Tenta uma posição mais confortante, não consegue, totalmente imóvel, só as pálpebras mexem, mas ele as mantém abertas.
O monstro, conforme pensam a seu respeito, abre os grandes lábios com cuidado, em conseqüência os pequenos, chega até o clitóris, o deixa exposto, revela na outra mão um alicate de desencapar fios, isso o homem conhece, muito tempo trabalhou com esse instrumento. Segura o clitóris com o alicate, aperta, espreme, esmaga e corta. O sangue jorra vivo, a mulher quase desfalece. O homem urina de novo, agora soltando alguns pedaços de sangue coagulado que saem pelo tudo, caindo no chão nojento.
Ambos choram, cada um com a sua dor, enquanto aquele corpo obeso continua estático, olhos negros cravados em uma parede sombria, que reflete seu negrume mais profundo, numa relação infértil, pavorosa. Nada ali parece claro, porque tudo se faz escuro.