*O desastre previsível - Coisas que só acontecem comigo-XLIV

O desastre previsível

Coisas que só acontecem comigo- XLIV

Corria o ano de 1972, quando o Exército Brasileiro construía uma das mais importantes rodovias brasileiras, a BR-316. Essa estrada vai de Maceió a Belém, cortando os estados de Alagoas, Pernambuco, Piauí, Maranhão e Pará, cobrindo um percurso de 2.054 km.

A parte que liga o Rio Turiaçu à cidade de Bacabal, que corresponde a 200 km, já estava construída, bem como os 210 km que ligam Teresina à Valença do Piauí.

Do Rio Turiaçu ao Rio Gurupi, este na divisa do Maranhão com o Pará, era um trecho de 160 km de inimagináveis agruras e eu estive lá, não foram poucas as vezes.

No inverno, todos os tormentos eram multiplicados por dez e chovia, pelo menos, oito meses por ano.

Para qualquer leigo, era visível a mudança da vegetação de mata de cocais (babaçu) para a floresta amazônica e isso mudava tudo.

Se não fossem as máquinas do Exército, veículo algum conseguiria adentrar naquele inferno, em especial, os ônibus da Florêncio, que prestavam serviços aos povos da região, um trabalho demorado e crucial.

Não era incomum nem agradável para os que se aventuravam a pé, dar de cara, naquelas matas, com algum indígena de aldeias perdidas, sempre armado de arco e flecha. 160 km de atoleiro e piuns a nos chupar o sangue o dia todo. Eu vi isso de perto.

Parecia-me um carma, tanto que eu nem fazia mais planos para a cerveja do sábado, pois, na sexta-feira, sempre me aparecia uma viagem.

Naquela semana, o aviso veio na quinta-feira. Eu deveria ir ao Gurupi e, como de carro era impossível, restava-me viajar para São Luís do Maranhão e, às 7 horas do dia seguinte, pegar um táxi aéreo no Aeroporto do Tirirical, rumo ao que hoje é a Boa Vista do Gurupi. A aeronave ficaria à minha disposição, até que eu terminasse de ‘descascar o abacaxi’ que me aguardava por lá.

Em São Luís, quando vi aquele monomotor Piper, vulgo ‘teco-teco’, matrícula PP-CAI, subiu-me um frio pela espinha dorsal. Para quem estava prestes a voar, dar de cara com um prefixo daqueles (cai) não era um presságio nada agradável. Só que eu não tinha escolha. Aquela era a bola da vez e eu, a sua caçapa.

O ano de fabricação daquele avião, quantas horas de voo já fizera e a sua autonomia de combustível, só Deus sabia! Ou, talvez, nem Ele mesmo soubesse!

Nem me passou pela cabeça saber a data da última revisão. Deveria ter uma velocidade de 200 km/h, trem de pouso fixo e capacidade para três passageiros e o piloto.

Em linha reta, a distância a ser percorrida era de 238 km (128,5 milhas), o que daria para afirmar que gastaríamos 1:12 h de voo. E foi o que aconteceu.

Terminei meu trabalho por volta das 15:30h e, imediatamente, embarquei de volta ao teco-teco, embora tivéssemos tempo de sobra (2:30h), já que o horário máximo permitido para aquele tipo de aeronave aterrissar em São Luís era às 18h. Afinal, imprevistos podem acontecer. E, de fato, aconteceu.

Recebi autorização para desviar a rota, a fim de levar um oficial do Exército até Santa Inês. Isso aumentaria em 177 km a rota, correspondente ao trecho de Santa Inês a São Luís. Nessa brincadeira, a folga de tempo baixaria para 28 minutos, sem contar o tempo de pouso e decolagens.

Pois bem, na hora da decolagem em Santa Inês, a bateria do teco-teco pifou. Eu já suava frio, porque no dia seguinte, sábado, eu teria um encontro em Teresina, do tipo imperdível.

O avião só subiu, depois que arranjaram uma camionete Rural Wyllys, para dar uma ‘chupeta’ de bateria à bateria, o que reduziu nosso tempo azero.

Pense no meu estado de nervos! Voar num avião de um só motor é o mesmo que ir à guerra com apenas uma bala na espingarda. E ainda por cima, com a bateria morrendo. Para complicar, quando já estávamos com meia hora de voo, o piloto me avisou que poderíamos pernoitar em Alcântara, caso a torre não permitisse a aterrissagem em São Luís.

Aquilo era tudo o que eu não precisava ouvir! Sem pensar duas vezes, eu disse para acelerar o voo. E eis que, de repente, sentimos um cheiro forte de borracha queimada, seguido de fumaça. Havia fogo no avião!

O piloto largou o manche e pulou para os bancos traseiros. Quanto mais revirava, mais fumaça surgia. Voávamos a 4900 pés, cerca de 1500 metros de altura em céu nublado, mas com boa visibilidade. Lá embaixo, nenhuma estrada à vista, na qual se pudesse fazer um pouso de emergência. E como se isso fosse pouco, era pântano a perder de vista, em pleno estuário do Rio Mearim.

Eu conhecia bem um altímetro e um barômetro, sabia lê-los, pois fazia parte de meu ofício. Não me foi difícil ver que a aeronave perdia altura, enquanto o piloto tentava encontrar o foco da fumaça. Fui obrigado a chamá-lo de volta, para estabilizar o jegue.

Por Deus e só por Deus, já que eu não vi outra explicação, da mesma forma como a fumaça foi se gerando, lentamente ela também foi se dissipando, até que o trem de pouso tocou a pista do Aeroporto do Tirirical, no mesmo instante em que a torre de controle anunciava:

- Em São Luís, 18 horas!

Estávamos livres de uma arremetida e, mais concretamente, livres da morte. Era a segunda vez que eu tinha um pouso conturbado no Aeroporto Mal. Cunha Machado. Nunca mais voltei lá e espero ficar longe dele para sempre. Não terei nervos para uma terceira vez.

São coisas que só acontecem comigo.

●●●●●●●●●●●●●●●●●●

O LIRISMO

Solano Brum

Tenho a cabeça repleta de Lirismo...

E escrevo, sem saber quando parar!

Desviando-me do profundo abismo,

Conjugo os tempos do verbo amar...

Vejo todas as mulheres em procissão,

Passando, uma a uma, como castigo,

Apunhalando o desesperado coração

Do Poeta, transformado num mendigo.

Ao rastejar pelas letras do alfabeto,

Essa Musa que me mantém desperto

Lança-me a flecha do preciosismo...

Eu conto estrelas no chão que piso,

Falo de amor e do que for preciso,

Tendo a cabeça, repleta de Lirismo!**

Obrigado Poeta, agradecendo sua presença mui honrosa, em minha página.

☝️

Ora, eu é que agradeço a sua tão preciosa participação.