Palavras tem força motriz
Pitico, vai se trocar que mamãe vai levar o filhinho para passear. Fique bem cheirosinho. Ponha aquele talco pompom atrás das orelhas, quero ver você chamar atenção da meninada. Vai logo Pitico, antes que mamãe mude de ideia. Agente vai caminhar na pista, olhar o lago, tomar sorvete e por fim, passar na livraria. Não, no shopping nós não vamos e você sabe o porquê. Mas vamos divertir muito nesta tarde que está fresquinha. Isto. Já tomou banho, agora ponha sua roupinha de sair. Fique chamativo.
Olha, mas não faça feio, Pitico! Deixe os passarinhos quietos, não se assuste com eles e nem os assuste. Eles são nossos amiguinhos. A alimentação deles é diferente da sua, claro. Eles vão bicando as frutas, até atingir o miolo. Passarinhos são inteligentes e antes que fique enciumado, você também é lindinho; muito mais que eles. Estou contando essas coisas, para dar tempo para que você se troque. Coisas bobas. Eu? Eu já estou pronta, só esperando por você.
Naquela tarde, não nego que fiquei um veneno, quando você Pitico, degolou o passarinho. Por que fez aquilo com o coitadinho? Tão indefeso! Veja o seu tamanho e o tamanho dos pássaros. Viu quanto sangue esguichou? Estava depenando-o, quando cheguei o expulsei. Covardemente, arrancou-lhe àquelas varetinhas, chamadas de pernas. Não sabia se me incriminava, ou estrangulava-o. Controlei-me, para não ir com minhas unhas por fazer, direto na sua garganta. Mas que fiquei fula de raiva, isso eu fiquei! Nunca senti tanta raiva e remorso ao mesmo tempo, por ter deixado você livre, correndo por onde bem entendesse. Passou Pitico. Sei que você amadureceu e não acredito que irá fazer outra como aquela. Confio em você, filhinho da mamãe! Sabe Pitico, de acordo com a ocasião, agente nunca sabe como iremos reagir, por isto, se pudermos evitar, melhor. Infelizmente, somos traídos pelos nossos instintos animal racional. A ira, a depressão, a raiva, o desprazer, podem nos levar a cometer cada loucura, que quem ver o ato, dificilmente acreditará no visto.
Verdade! Às vezes somos ingratos e você foi herói, quando salvou o gatinho. Fostes mais ágil que coelho e dando o pulo do gato, por assim dizer, tirou-o da boca da cobra. E que bocarra tinha aquela serpente! Quem podia imaginar uma cena como aquela: você carregando um o pobre bichano pelo pescoço. Aonde conseguiu forças para realizar tamanha proeza. As coisas se compensam e devido àquela sua atitude, você nem imagina como me orgulho desse seu lado sensível. Parabéns! Cooperação: é assim que devemos agir no nosso dia-a-dia.
Estou fechando as portas, você não quer que agente saia e deixe a casa aberta, né? O ladrão e o absurdo do caos não escolhe a hora que vai atacar. Você está vendo como as coisas estão; infelizmente esses são os sinais dos novos tempos! Bom, mas não vamos começar a lamuriar; pensemos no melhor e no que vai acontecer de agora em diante, que por duas ou três horas estaremos felizes por mais esse passeio. Quero que hoje seja melhor que ontem e amanhã, melhor que hoje. Esse é o lema do otimista; o nosso lema. Somos liberdade e desejo usufruindo do momento. Assim devemos ser e sempre que pronunciarmos as palavras, que não seja de boca para fora; pois elas possuem força própria e de posse delas, movemos o mundo. Como estou filósofa, não? Filosofemos a vida para que a morte não nos perceba; afinal, apreciamos, deleitamos é em respirar a vida. O aroma das flores. A sutileza dos insetos. Chega!
Hoje não assistiremos nada de filmes, como aqueles de suspense com Sherlock Holmes, o espião que caminha entre a multidão para desvendar os mistérios dos crimes. Vasculha aqui, se mete ali, remexe acolá, até encontrar as pistas que o leva ao desvende do ocorrido. Trabalhar como espião deve ser bom, o que você acha Pitico? Demanda inteligência, astúcia, disfarce; e sobretudo paciência para juntar as peças no quebra-cabeça do crime. Cada detalhe, cada ação, cada personagem é uma possibilidade a mais ou a menos, no desvende da estória. O suspense é uma obra genial do cinema que faz refletir e induz o espectador às incertezas. Já o terror...
Estou terminando de fechar a casa, e você meu querido Pitico, já se trocou? Está todo perfumado, cheirosinho para a tarde de gala que nos espera? Lá fora está um dia lindo: céu azulado, sem nuvens e poucos carros nas vias. Como gosto desta cidade em feriados prolongados. Faz tempo que o mordomo está aposto nos esperando. Vamos de limousine: para ocasiões especiais, carros especiais. O que você acha, ponho luvas? Muita frescura, né? Não!
Como da vez passada foi suspense, dá próxima, prometo que assistiremos a um filme de terror daqueles de noite calma, lua sorridente cercada por estrelas e uma infeliz que vagueia pela floresta despreocupadamente, quando de repente, um enorme lobo-vampiro, com as unhas feito aguilhões ataca-lhe de mansinho, domina por completo a distraída, lança-a ao solo, pula em cima e com os dentes pontudos pior que grossas sovelas de sapateiro, crava-os em sua garganta. Incrível, mas é sempre assim e da mesma forma, é o susto que agente leva. Quando dá aquele estrondo ensurdecedor: puuuuuum! quase desmonto esse meu corpanzil da cadeira. Orgasmo generalizado na plateia. E quando a pobre vítima é estuprada antes de morrer, aí é de arrepiar.
Em um deles a vítima era uma mulher e o filme deve ter sido produzido numa época que não havia modess ou absorvente, pois a pobre mulher caminhava por uma vereda deserta com o sangue escorrendo-lhe pelas pernas, deixando a marcas vermelhas no chão. Um desalmado animal, gigantesco e estúpido, seguia-a farejando e lambendo o sangue, que em determinados pontos, estava coalhado. Lambia e arreganhava os dentes. Cada canino medonho! Só de lembrar, dá nojo...arrrgh! Credo! Que horror! Esse foi o pior filme de terror, dentre todos os filmes desta categoria que já assisti, se quiser depois conto as demais partes; agora não, foi muito estúpido. Sanguinário! Cenas deprimentes. Hummm!
Vamos, já falei, rosnei, cacarejei, contei tantas estórias que acabou o meu repertório e você ainda não se aprontou? Deve estar um Adonis, um deus da beleza. Você está me ouvindo? Vamos diga sim, ou não; Pitico. Se não disser nada, vou entrar no quarto. Por que desse silêncio repentino? Depois não reclame se eu invadi-lo. Está ouvindo? Sei que você não gosta, mas estou indo. Se não quiser que eu vá, basta dizer o que está acontecendo. Pitico, você ouve os meus passos!
Ahhhhhhhhhhhhhhhhh, o que é isto. De onde apareceu esse monstro? Socoooorro! Socoooorro! Não acredito no que vejo. Não, não posso acreditar. Você me traiu...que coisa mais horrível! Jamais esperei isto de você, meu adorável Pitico! O que fiz por merecer, meu Deus? E agora o que faço sem você Pitico, olhe para mim. Diga que não é verdade o que estou vendo. Tente me enganar, vai!. Mova o pescoço. Ahhhhhhhhhhhhh, meu Deus! Alguém pode chamar a polícia. Rápido! Socoooorro!
E nas áreas comuns do condomínio Gothan City de alto padrão, o que se via era um conglomerado de pessoas olhando assustadiços, tentando descobrir de onde vinham os pedidos de socorro. E não demorou muito, a polícia técnica chegou abrindo um corredor entre os curiosos. Atrás, seguindo a viatura, vinha uma ambulância e o carro da funerária “Conte conosco”, cujo slogan é: “Estamos ao seu lado para o que der e vier”.