Está sem sorte? - Parte 4 - self Lucky
“Pra onde estamos indo, Carl?”
Jessie havia acabado de entrar no táxi, acompanhada do policial disfarçado. Peter, os acompanharia logo atrás. Não queria criar nenhum tipo de vínculo, já que o Cassino em que iam, o Self Lucky, seria o próximo alvo do meu parceiro policial em sua atual tática para conseguir reunir alguma informação útil. Por enquanto não havia nenhuma resposta além das que já se obteve pelos investigadores oficiais do caso que agora descansavam no céu. Ou não, vai saber.
O ponto principal é que nós dois não éramos da polícia, como já estampado na frase expressão de “trabalho disfarçado”, e por isso precisávamos entregar uma gorjeta extra aos que sabiam de algo a mais. E como não era algo oficial, eles se sentiam mais à vontade pra poder expressar suas opiniões pessoais sobre qualquer coisa que estava acontecendo, até por que foram instruídos a esconder as mortes para qualquer um que perguntasse.
“Não faz sentido se divertir no próprio local de trabalho, não é? Me deixe te apresentar outros lugares, se é que você já não conhece. Em todo o caso, posso tornar esses lugares mais interessantes, com a minha presença.”
“Já está se garantindo assim?”
Era melhor eu parar de me gabar. Estava rindo da minha própria cara de pau. Mas eu estava meio preocupado com algumas coisas. Os casos que eu peguei antes eram até que fáceis comparado a esses. Era estranho, mas teríamos que levar a hipótese de que poderia somente ser uma infeliz coincidência, a morte de todos eles... Não... Era uma hipótese muito sem nexo. Todos os envolvidos que se identificaram em campo morreram. Pela mente do assassino, levando a hipótese de que ele existe, foi quase como um desafio. Como se quisesse dizer “Sim, eu existo. Foda-se.” E pronto. Todos morrem.
Olhando assim, sem nenhum rastro de nada que se é detectável como uma forma de se matar alguém, a explicação parecia cada vez mais sobrenatural. Eu não gostava de admitir isso. Nunca acreditei no sobrenatural, seja em algum deus, seja em fantasmas, ou duendes, chupa-cabra, nada disso me descia. Os demônios somos nós, por nossos feitos, e a Terra é o nosso próprio inferno, ou nosso céu particular. Acredito que somos livres pra escolher isso.
Enfim, aqui estávamos nós na entrada grandiosa do Self Lucky. Sério, parecia tão luxuoso quanto o próprio Golden Soul, entretanto, de um modo levemente mais rústico, como um palácio nas eras faraônicas, ou ptolomaicas. Talvez por isso a pirâmide na entrada, e por isso alguns adornos gregos. Não me olhem assim, eu sou um canalha, não um burro.
Avistei Peter chegando no local logo depois de mim, mas apenas deixei ele me ver e entrei, sem fazer sinal algum. Pra todos os efeitos, eu trabalharia cem por cento no meu personagem enquanto ele se aprofundaria com sua dupla personalidade. Cara, isso me parece um tanto esquizofrênico.
Tudo bem recapitulando. Vítimas encontradas no Self Lucky: Alexander Thano, promotor executivo e o policial responsável por investigar sua morte, Peter Flinch. Esse cara, o Thano, estava alcoolizado e entrou acompanhado de uma mulher, na qual não se soube mais dela até a hora da morte. Já temos um ponto para começar.
E esta seria a função do nosso querido amigo cowboy. Eu estava ligeiramente ocupado com algumas coisas.
“Você acertou em cheio, não conhecia esse lugar, Carl. Na verdade não conheço muito de Vegas.”
“Não?” realmente estava confuso. “Há quanto tempo você trabalha por aqui?”
Enfim, longa história. Sobre a garota, o passado dela, os pais dela. Nada que, convenhamos, seja para se contar no momento, nada realmente importante. Apenas estava mantendo a minha média, impressionando a garota, tentando tirar alguma informação de lambuja. Alguns drinques e alguns petiscos. Nada que me venha fazer gastar tanto, mas com certeza, algo que eu gostaria de repor nos jogos. Gostaria de testar a minha sorte, em breve. Mas antes, aproveitando a intimidade me dada a alguns assuntos, era melhor eu já tentar arriscar alguma informação importante com a bela Jessie.
“A respeito de algumas coisas que eu ouvi... alguns rumores... minha curiosidade insiste em me fazer perguntar pra você.”
“Rumores? Sobre o que, pode falar.”
“Alguns carinhas aí que, digamos... andam tende certos ataques e nunca mais se ouve notícias deles... Neste lugar houveram dois desses casos. Onde você trabalha, três, inclusive os dois últimos no mesmo dia. Você sabe de alguma coisa sobre isso?”
Ela pareceu ter ficado branca de uma hora para outra. Eu acho que tinha exagerado um pouco na hora de falar. “Não esquenta. Só uma pergunta curiosa. Me interessei pelo fato de que todos eles e mais alguns simplesmente sumiram.”
“Eu não sabia que tinham mais casos assim. Mas o que aconteceram no Golden Soul... são bem reais. Eu conheci dois deles, os dois últimos. Eles chegaram juntos no bar, mas se separaram logo depois. Um deles foi atrás de uma mulher, era muito bonita por sinal. O outro, tentou me cantar. Eu neguei qualquer envolvimento, claro” Aham, do mesmo jeito que fez comigo. “Mas ele desapareceu, e eu só fui encontra-lo de novo quando a ambulância o estava levando.”
“Como era essa mulher? Não que eu esteja interessado, duvido que chame mais minha atenção do que você.” Ela riu timidamente. Tudo bem, péssima cantada da minha parte, admito. Mas deu certo, coisa que eu não esperava.
“Ela estava num vestido azul petróleo, com detalhes em preto. Tinha uma pele muito branca, o cabelo e os olhos eram pretos, dava um contraste que ficava muito chamativo nela. Era linda, não posso nem negar, tinha um corpo no mínimo invejável.”
É. Eu conhecia alguém assim. Ou pelo menos tinha visto de relance.
Nunca me esqueceria daquele bem par de... olhos. Tudo bem, olhos principalmente...
Acho que devo ter meditado por pelo menos uns cinco minutos, já que Jessie precisou chamar minha atenção. Ela estava ficando entediada, eu, preocupado, e isso não era com pra mim. “Está afim de arriscar alguma coisa comigo na mesa?”
“Está bem cheia, não é?”
“O que é aquilo, vinte e um?”
“Provavelmente...”
“Então vai me usar como seu amuleto da sorte e me levar pro seu jogo?” Ela deu uma risada irônica. Acho que esperava uma resposta do mesmo nível.
“O jogo que eu gostaria de joga com você senhorita, seria apenas entre nós dois, no meu quarto de hotel.”
Aquela cara de “Seu abusado!” que ela fez, mas não falou, me disse tudo. Eu havia sido um bom ouvinte. E havia atacado no momento certo, assim que me veio a primeira brecha.
Ela me puxou pra perto. E sussurrou no meu ouvido de um jeito que arrepiou meus pelos em lugares que eu nem sabia que eu tinha.
“Vamos para a mesa. Se a sorte estiver com você, talvez eu te dê esse prêmio.”
Perfeito. Cara, ela tava muito na minha.
Levei a garota para a mesa, de braços dados aos meus. No caminho, eu percebia a agitação. Muita gente estava adorando a onda de sorte que alguém estava tendo, justamente naquela mesa. De imediato, lembrei daquele sortudo desgraçado do Peter, que eu nem conseguia mais ver em lugar nenhum. Tudo bem, me despreocupei. A sorte não vem assim do nada pra mesma pessoa, dia após dia.
“Parece que alguém está ganhando muito. Será que vai conseguir vencê-lo?” Jessie me perguntava. Ela estava um pouco mais apreensiva do que eu, em relação ao jogo. Minha única preocupação na real, era como eu ia me livrar do Peter pra poder ter o quarto hoje só pra mim.
Acho que iria usar o lance da gravata pendurada na porta.
A mesa estava realmente lotada. Depois de um grito de viva vindo de todos os presentes, logo veio um exclamação. Alguma coisa aconteceu. Houve um tumulto, mas eu não conseguia ver. Eu tive uma breve visão de um homem caído em cima daquela mesa. Todos os presentes corriam para socorrê-lo. Estava acontecendo de novo. E o suposto assassino estava presente.
Eu olhei para o lado. Jessie estava com uma expressão de pânico no rosto, com a mão sobre a boca, como se fosse gritar. Não era a primeira vez que presenciara isso. Eu a abracei. Depois, tive que sair. Era minha função fazer alguma coisa.
Fui meio que empurrando todo mundo à minha frente. Precisava ver ao menos quem era. Onde diabos estava Peter?
Por pior que poderia me acontecer, as duas perguntas me foram respondidas em uma só. Era Peter, o homem caído. Era um choque pra mim. Coloquei o dedo em sua jugular, mas não havia pulsação. Os olhos estavam vidrados e olhando para o nada, entretanto, olhar para eles foi como olhar para um poço sem fundo, como se não houvesse mais nada ali.
Peter Raimi estava morto. Eu perdi meu parceiro. Mas já tinha minha primeira suspeita.