DESCONHECIDOS - 22

DESCONHECIDOS – 22

Rangel Alves da Costa*

Para o bem e principalmente para o mal, tudo na vida de Carolina foi praticamente por ela conduzido. Sem a constante presença afetuosa dos pais, que nas fases iniciais de sua vida outorgaram a babás os cuidados necessários, ela foi crescendo através da frieza da criação, sabendo apenas que alguma coisa estava certa ou errada, mas nunca recebendo explicações de como deveria ser.

Essa criação mandonista e policialesca só poderia dar os piores resultados. Cansada de ouvir os outros fazendo imposições, logo resolveu não aceitá-las. E não somente isto, trocar o certo pelo errado em busca de autoafirmação. Chegou um tempo que nenhuma babá ou governanta suportava mais suas atitudes e entregava a malcriada cria aos cuidados dos pais.

Sempre com a desculpa dos muitos afazeres sociais, das exigências do mundo dos negócios e uma vida muito mais voltada para o relacionamento exterior do que para a própria família, verdade é que os pais nunca quiseram abraçar para si as responsabilidades pela criação da filha.

Ora, dizia um, ela já está grandinha, não lhe falta nada e sabe muito bem se virar sozinha. Já outro dizia que é a própria vida que deve ensinar aos filhos e não os pais, devendo estes apenas colocar meios à disposição para se virarem como bem entenderem. E nesse passo de entendimento a menina, filha única, foi crescendo, tornando-se a rebeldia em pessoa e totalmente desajustada.

Quando começou a estudar e a escola enviava comunicados informando que precisava conversar com os pais, estes nunca compareceram. Assim, jamais durou muito tempo numa mesma escola e a cada ano ia sendo transferida de colégio a colégio. Se aprendia alguma coisa os pais não sabiam nem procuravam qualquer informação a respeito.

Contrataram reforço escolar na própria residência, mas a menina jogou álcool e tocou fogo na roupa do primeiro professor causando-lhe queimaduras superficiais. Não se sabe como, mas arrumou uma boa porção de maconha, colocou escondido na bolsa da segunda professora e depois telefonou pra polícia dizendo que ela era traficante. E nunca mais ninguém em sã consciência quis se aproximar dela para ensinar.

Certa feita chegou em casa gritando e dizendo que os pais tinham que tomar providência com relação aos professores do colégio que estavam lhe perseguindo, pois sempre fazia provas boas e eles aplicavam notas ridículas. Então o pai convidou o dono do colégio para almoçar e colocou em cima da mesa um cheque mais que atrativo.

Com um brilho diferente nos olhos, o senhor disse que faria aquele sacrifício porque andava com dificuldades financeiras, mas a verdade é que a menina nem no colégio estava indo. Se eles atendessem os chamamentos da escola talvez já estivessem a par dessa situação. Contudo, o pai disse que talvez fosse por causa daqueles professores, mas que ela voltaria frequentar sim. E acabou os profissionais ficando desempregados.

O motorista que a conduzia até a escola recebeu ordens para não sair do local enquanto as aulas não terminassem. Já mocinha, Carol começou a se insinuar para o rapaz e este ficou completamente desarmado. Assim que a deixava próximo ao portão de entrada saía com o carro e só voltaria a encontrá-la no local e horário que fosse avisado através de telefone.

Por essa época ela já havia começado amizade com adolescentes que vendiam drogas nos arredores de onde dizia estudar. Experimentar foi apenas um passo. A partir daí, sempre com dinheiro, comprava para consumir e para oferecer aos colegas. Como consequencia, percebendo a situação financeira da mocinha, decidiram incumbir Bagaceira, uma jovem do círculo do tráfico, a fazer amizade e ganhar a confiança da menina. E foi o começo da tragédia.

Quem visse Bagaceira de jeito nenhum diria que ela vivia envolvida com drogas, usuários e traficantes. Com cerca de dezoito anos, de nome Lamira na assinatura, se fosse mais um pouco conservada seria vista como uma mulher bonita. Ainda assim era muito simpática, porém se tornando irreconhecível a cada dia que se entregava sexualmente aos amigos da droga. E parecia um caminho sem fim.

Com diálogo atraente e sedutor, sabedora que o melhor caminho para se garantir a amizade de pessoas inexperientes é jogar o jogo destas, aceitar como certo tudo que fazem, não durou muito e já ganhou um telefone celular novinho de Carol, de modo que estivessem sempre trocando ideias e marcando encontros.

Bagaceira começou a freqüentar a casa de Carol e jamais ouviu dos pais da amiga uma pergunta sequer. Nunca perguntaram quem era ela, há quanto tempo eram amigas, o que fazia indo ali. Se perguntassem talvez dissesse que ia ali fumar maconha e usar outras drogas no quarto de sua filha.

continua...

Poeta e cronista

e-mail: rangel_adv1@hotmail.com

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