DESCONHECIDOS - 1
DESCONHECIDOS – 1
Rangel Alves da Costa*
As pessoas envolvidas nessa história não possuem nenhum parentesco entre si, não são amigas, não se conhecem, nunca se viram.
Os locais onde essas pessoas moram, com raras exceções, são totalmente diferentes geográfica, histórica e economicamente.
Quando muito, algumas moram nas proximidades ou em regiões próximas umas das outras, porém sem nunca manter qualquer tipo de relacionamento.
Como se observa, são indivíduos que se desconhecem, e por isso mesmo desconhecidos.
Aristeu, também conhecido como profeta, morava há mais de vinte anos numa caverna encravada numa montanha num lugar tão distante, mas tão distante mesmo, que se poderia dizer que era no fim do mundo.
Vivia na reclusão dos eremitas por escolha própria, em obediência à sua própria vontade e desejo, vez que, ao menos pelo que se sabe, não tinha nenhuma motivação filosófica ou religiosa tal aptidão para a solidão reflexiva.
Soniele – o nome dela era outro, porém guardado a sete chaves -, também conhecida como Jasmim de Fogo, se dividia entre um pequeno quarto de vila alugado num conjunto de bairro interiorano e o já não tão requisitado bordel da Madame Sofie, o segundo mais famoso do lugar. O primeiro era em qualquer lugar que as pessoas se prostituam. Tais ambientes localizados no município de Mormaço.
Muitas vezes merecidamente reconhecida pelos visitantes como a moça mais bonita do lugar, começou a se prostituir ainda adolescente, fato que não fazia muito tempo, e até hoje mantinha esse antigo hábito como única profissão.
Doranice, uma viúva milionária e solitária, pessoa de bom coração e com hábitos de fazer muitas caridades a instituições que cuidam dos mais necessitados. Dona de um patrimônio invejável, incluindo muitas fazendas, empresas e imóveis, contudo morava na menor de suas propriedades imobiliárias na grande metrópole chamada Nova Paulo.
João, pescador e apaixonado, pelo peixe e pelas mocinhas ribeirinhas. Morava às margens do Rio São Pedrito. Já havia sido casado, porém enviuvou logo cedo, assim que a sua amada deu à luz o primeiro filho, que também não resistiu.
Contam que João pescador é avistado todos os dias ao entardecer, esteja de tempo bom ou ruim, caindo chuva ou trovoada, em cima de uma imensa pedra às margens do rio. Fica ali por muito tempo, às vezes silencioso a mirar as águas, outras vezes cantando uma cantiga tristonha e que só ele mesmo sabe a letra e cantar. Dizem que sempre chora nesses momentos, ainda que esteja cantando.
Carlinhos, menino bonito, assanhado, esperto, correndo de um lado pro outro e sem parar num só canto. Menino de rua. De rua mesmo, sem casa, sem barraco, sem teto firme para dormir. O pai foi morto pela polícia num episódio envolvendo drogas. A mãe desabou no mundo deixando ele sozinho dentro do barraco.
Foi criado por um e por outro, mas quando olhou para a vida e viu adiante um caminho nem pensou duas vezes. Saiu por aí somente de calção e até hoje mora pelas ruas e dorme embaixo de marquises. Se fosse de família rica e vivesse arrumadinho todo mundo dizia: mas que menino bonito!
Cristina, uma jornalista destemida e desempregada. Quase tudo que escrevia e conseguia publicar continha denúncias graves, por isso mesmo que não ficava muito tempo em jornal algum, pois os poderosos que se sentiam atingidos logo exigiam a sua despedida.
Carol, uma verdadeira patricinha rica e se fingindo de estudante. Não queria outra vida senão estar curtindo loucamente a vida, fazendo compras e frequentando baladas.
O pai, mesmo estando mais preocupado com os negócios do que com a filha, vivia alertando a esposa sobre ela, exigindo que agisse para mudar rapidamente aquele comportamento de quem não quer nada com a vida. Mas emperra sempre na mãe que dizia: É a idade, são coisas da idade, depois tudo isso muda!
Mas o que estas pessoas podem ter umas com as outras? Aparentemente nada, pois são todos desconhecidos entre si. Mas...
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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