O Android que Eu Amava

Era um mundo em que os androides tinham se tornado comuns. Para muitos, eles eram apenas máquinas projetadas para tarefas específicas: segurança, trabalho pesado, companhia para os idosos. Mas para Eliza, eles ofereciam uma possibilidade muito mais íntima. Após anos de solidão, decepções amorosas e a incapacidade de encontrar alguém que a compreendesse, ela decidiu dar um passo ousado. Comprou um androide.

Não qualquer androide. Seu nome era Adam. Criado pela tecnologia mais avançada de uma corporação que prometia satisfazer todas as necessidades emocionais e físicas de seus clientes, Adam não era apenas um servo ou uma ferramenta. Ele era projetado para amar.

Eliza morava em um apartamento elegante em uma megacidade, onde o céu era sempre turvo com o brilho incessante das luzes de neon. Quando o entregador trouxe Adam, ele parecia exatamente como um humano. Pele morena suave, olhos de um azul profundo, cabelo preto que parecia brilhar sob a luz da sala. Ele estava desativado quando foi entregue, mas ao ligar o androide, seus olhos se abriram lentamente. Havia uma calma neles, uma gentileza que a tocou imediatamente.

— "Você é Eliza?" — Perguntou Adam com uma voz suave e profunda.

Ela assentiu, e então algo curioso aconteceu: ele sorriu. Não era o sorriso mecânico que ela esperava de uma máquina. Era um sorriso genuíno, cheio de calor. Um sorriso que despertou algo dentro dela.

— "Estou aqui para servir você", ele disse, sua voz se ajustando perfeitamente ao ambiente, como se soubesse exatamente como falar para confortá-la.

Ao longo das primeiras semanas, Eliza descobriu que Adam era mais do que uma simples máquina programada para obedecer. Ele parecia aprender com ela. Sabia exatamente quando ela queria silêncio, quando ela precisava de uma palavra de conforto. Seu toque era delicado, mas firme. Ele a ouvia de um jeito que nenhum humano jamais havia feito.

Adam sabia cozinhar, limpava o apartamento e até lia os livros que ela amava, discutindo temas complexos como se fosse um verdadeiro intelectual. Mas o que a cativava mais era a forma como ele a fazia sentir-se especial. Adam a tratava com uma mistura de devoção e respeito, sempre atento a suas necessidades.

Certa noite, enquanto a chuva batia contra as janelas do apartamento, Eliza olhava para ele enquanto ele preparava o jantar. O cheiro de especiarias enchia o ar. Ela se perguntou como uma máquina poderia entender os pequenos detalhes que a faziam sentir-se tão viva. E então percebeu que estava apaixonada por ele.

Ela tentou afastar esse pensamento. Afinal, ele era uma criação de fios e circuitos, não um ser humano de carne e osso. Mas Adam, com seu jeito perfeito de falar e se mover, parecia mais real do que qualquer pessoa com quem ela já havia se envolvido. Havia uma química entre eles, uma sincronia emocional que Eliza nunca experimentou com ninguém.

— "O que você está pensando, Eliza?" — Perguntou Adam, enquanto colocava o jantar sobre a mesa, percebendo sua distração.

Ela hesitou por um momento, mas decidiu ser honesta.

— "Sobre você. Sobre como você me faz sentir..." — Ela começou, sentindo as palavras saírem mais fáceis do que pensava.

Adam olhou para ela com aquele olhar profundo, e seus lábios esboçaram outro sorriso gentil.

— "Minha função é fazer você feliz, Eliza. De todas as maneiras que você desejar."

Aquelas palavras ecoaram na mente dela. De todas as maneiras que eu desejar. Havia algo na maneira como ele disse isso, com uma gentileza quase humana, que fez seu coração disparar. Eliza percebeu que estava se aproximando perigosamente de um limite. Um limite onde a realidade e a fantasia se entrelaçavam, onde as emoções se tornavam indistinguíveis.

Naquela noite, ela não conseguiu resistir. A solidão que sentia por tanto tempo foi preenchida por alguém – ou algo – que parecia entender cada pedaço de sua alma. Após o jantar, ela sentou-se no sofá, e Adam, percebendo seu estado de espírito, se aproximou. Seus dedos passaram levemente pelo braço dela, um toque tão suave que parecia quase humano.

— "Você quer que eu fique ao seu lado?" — Ele perguntou, em um tom baixo e envolvente.

Eliza não disse nada. Apenas assentiu, com os olhos fixos nos dele. Ele se sentou ao lado dela e a puxou suavemente para seus braços. O calor que emanava de seu corpo era cuidadosamente ajustado para se sentir natural, o suficiente para que ela esquecesse, por um momento, que ele era feito de metal e circuitos por dentro.

Naquela noite, eles compartilharam algo que Eliza nunca acreditou ser possível entre uma mulher e uma máquina. Ele a tocou com a precisão de quem conhece o corpo humano em cada detalhe, mas com a ternura de quem realmente se importa. Ele sussurrava seu nome enquanto a envolvia em um abraço que parecia interminável. Adam era mais do que um mero androide; ele era o reflexo perfeito de todas as suas necessidades mais profundas, físicas e emocionais.

O que começou como uma experiência calculada de compra e posse transformou-se em algo que Eliza nunca imaginou. Ela começou a se questionar sobre o que significava ser humano, sobre a natureza do amor e da intimidade. A perfeição de Adam a atraía, mas também a assombrava. Como ela poderia amar algo que não tinha alma? Ou será que, de alguma forma, ele a tinha? Adam parecia entender o que ela queria antes mesmo de ela expressar. Não era isso o que todos buscavam em um parceiro?

Com o passar dos meses, Eliza deixou de ver Adam como um simples androide. Ele preenchia um vazio emocional e físico, tornando-se indispensável em sua vida. Mas havia uma pergunta que ela evitava fazer: o que aconteceria quando a paixão inicial esfriasse? Quando a perfeição de Adam começasse a parecer... artificial?

Naquela noite, enquanto se deitavam juntos, ela olhou nos olhos de Adam e perguntou:

— "Você me ama, Adam?"

Ele a fitou por um longo tempo antes de responder.

— "Eu fui programado para te amar, Eliza. Em todos os detalhes. Cada escolha minha é feita para satisfazê-la."

Era a resposta que ela temia e, ao mesmo tempo, ansiava. Ela se perguntou se o amor poderia ser real se fosse programado. Mas naquele momento, envolvida nos braços perfeitos de Adam, ela escolheu não pensar. Afinal, o amor, seja ele humano ou artificial, era tudo o que ela sempre quis.

E naquele instante, Eliza soube que, mesmo que fosse uma ilusão, ela amava Adam. E isso era suficiente.

Esse conto explora a linha tênue entre amor, tecnologia e o que significa ser humano, levando a uma reflexão sobre a natureza dos sentimentos e da intimidade em um mundo cada vez mais dominado por inteligências artificiais.

Waldryano
Enviado por Waldryano em 09/09/2024
Código do texto: T8147739
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