A Colônia, Primeira Parte 

A meretriz 01

"Certeza, que gastará todos os seus créditos com isto?" Olhava para a vitrine, holográfica, acompanhado do companheiro, que se comunicava comigo por telepatia.

"Sim por que não?" Nossa vida é muito monótona, e esta experiência é a maior constatação que um colono como nós poderia sentir.

"Pense bem, com tantos créditos, você poderia fazer um upgrade em todo o seu funcionamento." O companheiro de trabalho olhava para a escolha do amigo e ficava sem ação com tanta loucura em uma só pessoa.

"Olhe x89Z um sistema nervoso sintetizado, custa este valor de crédito, te trará vitalidade para mais uns 200 anos de vida. Ou você pode trocar seu sistema ósseo com este montante."

Comentavam, repassando na vitrine, os maiores valores possíveis de se escolher em meio aquela loja virtual.
No entanto, x89Z estava disposto a deixar nem que fosse por uma linfemia hora a sua androgenia.

Existia nele uma obsessão em história antiga, quase arcaica, onde os colonos eram seres humanos, sendo estes homens e mulheres. Hoje neste novo planeta Terra, há somente colonos, seres melhorados para suportar o gás amoníaco, que se formou através da salinização.

No entanto, foram muitos dias de árduo trabalho na mina de extração de metal, tão importante para manter aquela colonia submersa entre aquele gás sufocante.

Todos os dias trabalhados, o que mantinha x89Z animado, era a suas pesquisas pela neuronet. Em todos os momentos de descanso, passava procurando, vestígios do passado, onde ainda existia o gênero feminino e o gênero masculino.

Quando ia dormir, olhava na sua redoma, tentando se imaginar com aquele corpo arcaico, onde a clorofila epitermal não existia, logo não seria verde. E tal constatação o fascinava. Teria uma genitária, coisa desnecessária para o seu corpo, com balanço de massa perfeito, ou seja, tudo reaproveitado, sem saída de nada.

No outro dia, ao termino do trabalho, voltou para ver quanto de crédito ganhara. O seu companheiro de trabalho, que dividia a redoma de vidro, onde hibernavam por 2 horas naquele ciclo diário de 36 horas, tentava em vão tirar a ideia bizarra do companheiro.

"Faltam somente 8% de crédito para eu finalmente adquirir uma Meretriz" Com aquele percentual, x89Z poderia reservar, e passar para o próximo passo: A entrevista.

"Pense bem é muita loucura, dispor de tanto crédito para uma horinha em um espaço tempo que você nem imagina o que é! Seja sensato, compre este coração sintético, te trará mais 120 anos de vida, e te deixará apto, para fazer, maiores esforços na mina, logo, você poderá dobrar os seus créditos! Use o bom senso!"

Olhava para aquele colono, igual a mim, olhava ao meu aderredor, todos ocupados fazendo afazeres naquela prisão, chamado sobrevivência.

Entendia perfeitamente, o que o meu colega de redoma dizia, realmente, era muito absurdo, desperdiçar tanto crédito com um disparate daquele.
Em certo momento de trabalho, na Mina, eu tive a curiosidade de lhe abordar por telepatia. Olhei para ele e comecei a perguntar.

"Você já tomou consciência do gênero homem e mulher?"

Meu companheiro de redoma, continuava retirar mais um pedaço daquele metal, e colocar na esteira, enquanto se comunicávamos.

" Sim, por curiosidade entrei em arquivos proibidos, e observei como eram os seres humanos pré históricos, isto foi a muito tempo atrás, hoje não precisamos mais de reproduzirmos, afinal podemos sintetizar partes do nosso corpo e com o tempo fazermos as trocas".

Dava uma pausa no trabalho, não deveria, poderia ser punido, todavia, precisava tirar aquela ideia absurda do seu companheiro de redoma.

"Isto beira ao bizarro, tentar querer buscar algo desnecessário, esqueça disto e faça a compra sensata, isto que você esta querendo somente ganhadores da loteria podem ter."

Ao retornar do subsolo, voltei a acessar a vitrine holográfica, observei que já estava marcada a entrevista. Poderia finalmente fazer o que tanto queria.

— Escolher um gênero e buscar uma Meretriz.

A Meretriz 02

Dentro da redoma de vidro, fecho os olhos, coloco os plugues e a minha viagem começa. Fico num estado sonolento. Até chegar no local, onde continuaria o processo. Confesso que abro os olhos no meio do trajeto, não deveria.

— Mas quem nunca, não é?

Olhava-me envolto a um lamaçal de líquido negro, havia algumas reluzes entre aquele espectro assustador. Entendi pela orientação de manter os olhos fechados enquanto se transportava entre uma colônia e outra.

Era assustador o que poderia ser visto fora.
Fechando os olhos tento me concentrar no que me esperava na entrevista. Finalmente poderia fazer a experiência sensorial e degustativa de uma vida.

Dês do meu nascimento, nunca soube de onde vinha, fui acordado já com a idade ao trabalho, e deste modo, fui posto na minha posição na colônia. x89Z era o meu nome, uma colocação bastante robusta para viver uma vida de trabalho intenso.

Mas mesmo simples operários, possuíam, algo a que se esperançar.

O algo deles, eram melhoramentos no sistema corporal, muitos já estavam se tornando por um todo sintéticos,(com seus problemas de reposição). Outros tentavam a sorte na loteria, era permitido uma única cota, a cada semestre de trabalho. E alguns malucos como eu gastariam todas as economias, dos créditos, em alguma sandice. Seja uma viagem para outras colônias, ou até mesmo algo mais vintage. Coisa que estava indo executar.

Fui acordado pelo bip que era transposto na minha consciência, pelo plug da viagem. A redoma foi aberta, e eu pude sair.
O local onde estava, de nada parecia a minha antiga colônia, havia um ar bonito, no entanto, era notável a falta de presença de vida ali.

Tudo branco, os androides com suas roupas brancas, tornavam o local silencioso e exageradamente minimalista e organizado.

Olhava atrás de mim outras redomas abrirem e saírem os seres iguais a mim, todos sendo abordados pela mesma espécie de androide.

Tentei acessar a neuronet.
Sem acesso.

Tentei comunicar com outro colono, que parecia conhecer e também chegava naquele local. Simplesmente não conseguia. Nunca senti tal sensação, um bloqueio telepático.

A androide, lembrava traços de mulher, a propósito, todas as androides que via não eram andrógenas, e sim eram bastante femininas. Me abordou.

"Olá, seja bem vindo a colônia Regresso. Vejo as suas credenciais, és o colono x89Z."

Respondi a aquela máquina que não me olhava, e trazia uma sensação abstrata a minha experiência.

"Vamos lhe acomodar, numa sala, onde continuaremos com a entrevista. Observo que efetuou o pagamento faltando os 8%. Cabe lhe a explicação que não há devolução de créditos. E assim que entrar na sala de entrevista, não poderá retornar."

"Sim compreendo."

Já havia lido as clausulas do contrato várias vezes, esta android, deveria de saber, provavelmente ela acessara via neuronet o meu histórico de utilização. Ela me analisando e vendo a minha contestação replicou.

"É o protocolo" agora trocávamos de corredor, pela esteira que faziam das máquinas ágeis e de nós colonos preguiçosos.

Tentei comunicar-me com outro colono que me olhava de modo melancólico, sem resultado. A minha receptora novamente consternada pela minha falta de foco respondera-me.

"Nossa experiência é individual Colono x89Z, não é permitido comunicação telepática aqui dentro, já estamos chegando a sua sala de entrevista."

Veio a frente do meu rosto um comunicado holográfico, enquanto era transportado por aquelas esteiras intermináveis.

— Colono x89Z aproveite o trajeto para certificar-se que realmente quer passar pela experiência, de adquirir um momento com a Meretriz. Nós da Colonia Regresso, não se responsabilizamos com as suas condições pós-encontro. (Fechei os olhos ao abri-lo parecia estar na redoma de viagem, olhava-me dentro de uma cápsula de vidro onde em volta estava uma água, salubre, e vários espectros, foi um instante de segundos, que fez eu tocar a minha cabeça) A minha receptora disse:

"O que houve? Sinto uma interferência" Ao abrir os olhos o comunicado surgiu novamente.
— Ao entrar na sala de entrevista, significa que você esta apto, pra buscar uma experiencia pré histórica e transcendental.
Olhei para o envolto, tudo claro uma iluminação azul tendia do chão, dava um ar de tranquilidade ao local. Minha receptora disse:

"Chegamos qual é a sua escolha" entraria eu pela porta ou retornaria aqui para a minha colônia?

A Meretriz 03

Estava para fazer uma decisão que iria impactar a minha vida, assim pensava.

Escolhas todos as têm. Precisava decidir; se adentraria àquela porta e finalmente concretizaria a experiência de uma vida, ou voltaria para a minha colônia, tentar resgatar mais crédito, para melhorar o meu corpo tal qual faziam todos os colonos.

Os corredores de um azul, transluzia uma tranquilidade assustadora. Não observava mais nenhum igual a mim, aquele emaranhado de túneis me levou para o meu destino final. A entrevista.

A androide simpática parou e disse:

"É aqui, ao adentrar nesta porta você não poderá voltar, somente após a sua experiência com a Meretriz, tudo será explicitado com o seu entrevistador. O protocolo me obriga a perguntar novamente: — Você tem certeza da sua decisão?"



Já estava me dando nos nervos tanta pergunta e tantos lugares, era óbvio que eu iria aceitar.
Como seria sair deste corpo andrógeno, onde não sei poderia ser homem ou mulher e desfrutar de horas de prazer, tal qual observava nos filmes antigos proibidos na neuronet?

A Android se retirou, falava por telepatia para comigo. Dizendo assim: Ao abrir a porta o seu contrato estará firmado.

— Abrir a porta, oras! Era um absurdo pensar que a minha vida poderia mudar completamente ao abrir uma porta. Bem que... Nunca ouvi de nenhum colono que escolheu por uma Meretriz, bom pensando bem, ouvi em outro momento, sim de um colono da nossa colônia que ganhou naquele jogo de azar, que gastava-se para disputar entre tantos. Tal jogo nunca me interessou, pois observava que pelas probabilidades era quase impossível ganhar.
No entanto, falava-se na minha Colonia, que o indivíduo foi para uma Colonia distante, depois da experiência com a Meretriz.

Agora o calor me acometia, no entanto, o clima era totalmente confortável e a gravidade, era normal, mesmo sem acessar a neuronet para confirmar as condições do ambiente, observava que estava em um local idêntico ao que eu era acostumado a ficar.
A Android voltou a falar comigo por telepatia:

"Rápido com a sua decisão"

Eu fui e abri a porta.

Foi algo surreal o que aconteceu comigo.
Toda aquela sensação que outrora sentira, estava agora submerso ao lamaçal espectral reluzente. E envolto flutuando.


Entre tantas luzes fluorescente, sentia que precisava buscar uma luz. A que aparecia a minha frente.

Me sentia submerso a algo que recordava a líquido.

Mas não era.
Gasoso?
Tão pouco.

De repente sentia a necessidade de bater os meus braços para tentar de algum modo chegar àquela luz.

Estava sentindo uma fisgada inebriante na minha garganta, que a tempo não a utilizava, (afinal sempre comunico-me por telepatia com os meus ademais). Tentava saltar, para chegar a aquele local.

Curiosamente olhei para trás, a porta cujo qual entrei neste lugar, porém ela já não existia.
Estava totalmente aqui e isto parece me um grande Espaço, vago e sem nada.
A luz a minha frente piscava e agora sentia que precisava chegar a local da luz urgentemente.
De repente sentia as luzes envolta ao espaço onde estou quererem me tragar, era uma sensação terrível. As luzes grudam ao meu corpo como pequenas sangue sugas.

Era o meu fim, sentia a morte.

Por qual razão fiz a estupidez de adquirir um capricho que me levaria a morte?
Agora sentia fisgadas ao meu corpo, como se tivesse sendo sugado por agulhadas quentes.

Fechava os olhos, tentando desistir de tudo. Entendia que era a morte que me encontrara naquele lugar estranho a tudo o que já conhecia.

Fechando o olho, senti uma mão segurar o meu braço.

Ao abrir os meus olhos já estava sentado em uma cadeira que parecia de descanso. Realmente era um líquido que estava passando pelo meu corpo. Pude comprovar ao olhar um pequeno cano, sendo injetado algo que não sabia precisar no meu braço.
A sala vazia cujo a qual me encontrava parecia um hospital, ou enfermaria, sei lá.
Tentei me levantar. Senti-me paralisado.

Estava com os braços presos em uma espécie de bracelete, fixado em uma cadeira.
Só assim percebi que estava completamente preso e todo aquele equipamento tinha como objetivo me deixar imóvel.

A sala onde me encontrava agora era de um branco que cegava e esta foi abruptamente interrompida ao entrar por uma porta que parecia surgir do nada; um homem.
Sim, um homem, e este não parecia a nada o que eu já avistara em qualquer colônia. Ele sorriu para mim. Eu fiquei totalmente estarrecido. Era mesmo um homem! Nunca imaginava ver um colono, ou o que quer que fosse aquele ser.

A pele dele era de um marrom claro, que tendia ao salmão. era muito estranho observá-lo, uma coisa é ver em velhos videos na neuronet outra é estar presente com um ser que acreditava já não existir. Atentei para a sua mão e o seu corpo. Meticulosamente vestido com um traje branco.
Se comunicou comigo e pasmem com a sua boca, parecia movimentá-la de um modo tão suave.

— Olá x89Z é este o seu nome não é? Sou o seu entrevistador. Que bom que aceitou, te garanto que sua experiência com a Meretriz será algo espetacular.

Eu só tentava falar com ele por telepatia:
"Me tire daqui!"

Ele chegou perto de mim, passou seus dedos pela minha boca. E disse:

— É melhor tentar usar seus lábios para falar, esta história de telepatia tornam seres da sua espécie preguiçosos. E a garota que iremos te arranjar beija, e tem uma boca que certamente gostará de usar com você!

Era totalmente bizarra a situação que eu me encontrava; preso e um homem, me instruindo a falar. Estava em algum espécie de morte?

Abri a minha boca, tanto tempo não precisava fazer, tentei balbuciar palavras. E não é que saiu?

— Por favor, me solte.

E o homem estralou os dedos e disse: — Ah, sim, era necessário, pois geralmente quando passam de uma dimensão para outra há muito agito e gostamos de preservar a integridade dos nossos clientes.

Estava solto, no entanto, ainda não conseguia me mover, estaria eu paralisado?

— O que vocês fizeram comigo?

O homem que tinha olhos que lembravam a alguma coisa que vi na neuronet, começou a passear em volta da minha cadeira, enquanto eu tentava movimentar as mãos e os pés, realmente era uma anestesia que me acometia.

— Calma, você irá passar por uma transição, para poder ter ao seu tão esperado encontro. A propósito você é diferente x89Z uma espécie rara entre os colonos.

Ao escutar ele falar, tentava agora perceber as vibrações do local, realmente algo estava acontecendo com o meu corpo.

— Você não tem partes sintéticas no seu corpo, Jovem! Não quer viver mais?
Ele falava e eu pensava: — Claro, guardei todo o meu crédito para aquele encontro.

— Você é um colono fora da curva.

Não entendia o que ele queria dizer, só ficava feliz pois lentamente conseguia me mover de novo e estranhamente não tinha o desejo de fugir daquele lugar.
O entrevistador agora olhava me com um modo sério:

— Pronto para a passagem de gênero?

Aquelas palavras vieram com um espanto para o meu consciente. Eu imaginava que iria ocorrer algo assim em algum momento, pois afinal o que tanto via na neuronet, precisava de ter um gênero bem estabelecido.
A androgenia dos colonos nunca fizeram eles entender esta necessidade.

— Seus exames terminaram, sua predominação é para o gênero masculino. E isto é bom, pois se fosse ao contrário, você seria descartado. Benditos cromossomos x89Z. Começamos?



Continua...
Waldryano
Enviado por Waldryano em 11/02/2021
Reeditado em 11/02/2021
Código do texto: T7181900
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