ETERNIDADE

Hoje, o dia está tristonho desde que alvoreceu. Eu que gosto da chuva, dos dias nublados, sinto-me deprimida. É como se minh’alma tivesse ido embora deixando meu corpo perambulando no espaço vazio.

Percebo meu coração latente, bombeando sangue vermelho. Sangue fervente das veias, que muito embora pense não ter mais alma, mas, está ávido por amar.

Ah, como quero trazer para essa narrativa um amor fogoso, proibido, mas, hilariante de coragem para tomar nos braços o meu amado, mesmo que seja apenas, na minha imaginação.

Amor esse que não é de agora, acredito que seja de outras vidas, porque é tão grandioso, conquanto, por ele sou arrebatada com beijos e carícias audaciosas na totalidade que o seu pensamento mais fértil tiver competência de imaginar.

Um sonho que aos quatorze anos deixou-me tão maravilhada ao ponto de, depois de acordada, procurar por ele achando que fosse verdade. Sentia uma dor intensa entranhada em mim. Uma coisa estranha, um amor consumado em sonho, contudo, nunca se tornou realidade, ainda que aos dezessete anos pudesse tê-lo conhecido e em parte vivido esse amor. Digo em parte, porque não passamos dos abraços e beijos que embora já tenha se ido meio século, posso senti-los na mesma intensidade fazendo com que meu corpo estremeça de desejo, enquanto meu coração esvoaça para os céus da bem aventurança extasiante que certamente irá comigo para outra vida.

Quero que você leitor, nunca deixe que seu amor vá embora. Una seu corpo ao dele tornando-se uma só alma. Peça essa graça a Deus, porque a dor é tão intensa e você a carrega por toda a vida.

Não posso deixar que algumas lágrimas tombem, uma vez que elas teimam rolar a vida inteira.

Não é fácil para uma adolescente criada numa família, onde a mãe é doente de ciúme dos filhos. Ciúme tão crucial, ao ponto de nunca compreender que essa dor possa consumir o filho amado de suas entranhas, desde sempre. Toda filha precisa ter na mãe sua melhor amiga, com a qual se pode contar em todas as coisas, inclusive sobre seus sentimentos. A ignorância dela fê-la a mais terrível dos algozes para com a minha pessoa. Seu egoísmo nunca deu lugar para que ela entendesse que eu também tinha o direito de amar, de ser mãe, e de envelhecer com o homem que eu queria para ser meu.

Às vezes, fico com vergonha de falar sobre esse assunto, mas, não quero ir para outro plano sem deixá-lo registrado. Ele servirá para que esse tipo de erro não se repita.

A decepção, a angústia de ter que viver a vida que você não queria, com a pessoa que você também não queria, embora, essa pessoa seja excelente. A gente tem a impressão de que nada está no rumo certo, todas as coisas estão fora do lugar.

Ouvir o canto dos passarinhos ao acordar é como se uma lança transpassasse a alma, porque você lembra e trepida por saber que não está e nem pertence à pessoa que mora no seu coração. A pessoa que faz agitar sua alma.

As viagens com a família, filhos, marido, é uma coisa insossa... E pior, você vive sem ter com quem desabafar. Coisa dessa natureza não se pode falar para ninguém, se não ao invés de um sofredor, surgem outros, que também poderão sofrer e isso não seria justo.

Há dias, que pego a estrada sem rumo, todos os vidros do carro fechados, coloco as músicas daquele tempo e afundo o pé. Choro até as lágrimas secarem. A debalde, já deveriam ter secado, porque são inúteis.

Há dias também, que durante o sono, sonho com ele, com nossa felicidade, nosso riso mais sincero e gostoso. O respeito que tínhamos para com os nossos corpos.

Sei que quando sonho com ele, ele também sonha comigo, sinto isso. Somos almas gêmeas. Ele sempre quer saber como estou vivendo. Nesses cinquenta anos, também não me esqueceu. Nas poucas vezes que nos vimos, foi muito constrangedor, as pessoas percebem que não nos sentimos à vontade. Um dos dois se retira do local.

Aos quatorze anos quando o conheci em sonho e depois pude conhecer pessoalmente, ele era igual ao que era no sonho e tanto ele quanto eu sentimos uma dor imensa no coração, quando nos vimos pela primeira vez. Confidenciamos isso, um ao outro. Por isso sei que nossas almas se pertencem.

Embora esse amor seja um sentimento eterno, não quero outra vida para vivê-lo. mas, espero que Deus nos conceda a graça de ficarmos juntinhos ao seu serviço quando partirmos.

Moramos na mesma cidade, cada um de nós teve três filhos, mais ou menos da mesma idade.

Agora, nossas vidas caminham para o final. Final que peço a Deus que nos receba em sua glória. Porque já dizia uma certa amiga minha: “nem todos nasceram para serem felizes aqui neste plano, mas, certamente, Deus tem algo de muito bom para essas pessoas na outra vida”.

Creio piamente nesse provérbio da minha amiga. Conto com isso. Se eu for primeiro, quando ele chegar estarei na porta esperando e lhe dando as boas vindas e se ele for, será igual, tenho certeza.

A noite já se faz virando dia. São duas horas. Um galo começou sua cantoria, mas, ainda tenho muito o que relatar.

Nesse momento, sinto o cheiro do meu amado. Lembro que ele usava uma colônia de alfazema. Nessa época, eram os perfumes existentes no mercado. Fecho os olhos e imagino seu abraço, suas mãos tomando minha cintura, que ele dizia poder abarcar com elas. Meus seios roçavam seu peito e ambos tremíamos de amor... de desejo... Nossos beijos ardentes de hálito puro, uma coisa tão deliciosa, que minha explicação chega a ser superficial. Era assim nosso amor. Feito de poucos momentos que duram uma eternidade. Mamãe vigiava, cuidava, proibia, torturava com argumentos absurdos de pessoa ciumenta da filha primogênita.

Ele amava meus cabelos longos e volumosos, que eu lavava e secava com a toalha para quando ele chegasse pudesse mergulhar no meio deles e ao meu ouvido falar do seu amor por mim.

Os recursos financeiros da minha família na época eram quase nada. Minhas roupas muito simples, nenhum acessório, nenhum enfeite, mas, cuidava dos meus cabelos, do meu banho com sabonete e dos dentes bem escovados, não usava nenhuma maquiagem, meu pai proibia tudo que fosse vaidade. Apesar da pobreza, toda negatividade dos meus pais eram estratégias baratas para que o rapaz desistisse de mim.

Minha mãe dizia que ele era velho para mim, tinha nove anos a mais que eu. Era trabalhador e com algumas posses. Mamãe dizia que, se a gente casasse, ele ia esfregar nossa pobreza na minha cara todos os dias.

Fazíamos muitos planos, os quais não deram em nada. Ele dizia que quando casássemos, se nosso primeiro filho fosse menino se chamaria..., não casou comigo, mas teve o filho e pôs o nome que me dizia . Quando soube chorei muito. Porque era com ele que queria ter meus filhos.

Pois bem, essa é a minha maior dor, de resto tudo maravilha. Meus filhos são maravilhosos, saudáveis, grandes profissionais. De outra forma sou vencedora, tenho quase tudo que quero, e com certeza tenho tudo que preciso. Só me falta mesmo, o amor da minha vida.

É nele que penso sem cessar, é por ele que vivo para que do outro lado da vida possamos ficar juntos eternamente. Diferente disso, nada terá valido a pena. Minha complacência, meu amor e cuidados com a família que Deus me conferiu para ser mãe, respeitar e educar... Não valeu a pena meu fleuma. Minha tristeza contida. Minhas orações pedindo força e coragem para levar meu casamento até o fim, porque prometi que assim seria e assim será.

Creusa Lima
Enviado por Creusa Lima em 23/12/2022
Reeditado em 11/04/2023
Código do texto: T7678580
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