...Era um vez!...
“É pau, é pedra, é o início do mundo; porque aqui temos jacarandá, ipê, tucano, gralha, tamanduá, manacá, cobra, peroba, araponga, siriema, lagarto, iguana, pássaro preto, pau Brasil, canário, leão, paineira, jaguatirica, trinca ferro, ibisco, lírio do campo, flor do lótus, formiga, raposa, sapo, grilo, macaco, onça, colibri, cachoeiras, rio cristalino, leopardo, ariranha, jacu, paca, jacaré, jaguatirica, onça, árvores frutíferas, rato, terras férteis, campina, serrado, coníferas, carneiro, ingá, leopardo, reservas naturais, ouriço, grilo, curiango, tatu, e demais aves, flores e animais. Parar para inflar os pulmões de oxigênio puro, observar as cores, ouvir o pio e os sibilos da natureza, é transcender a plenitude do nirvana”. – exceto o imprevisível Aparecido, era o que repetidas vezes diziam os filhos nativos do Chuádaságuas e habitantes dos condados circunvizinhos.
Aparecido andava sumido. Sumido estava o Aparecido. Mas como as pedras que rolam e se encontram, Aparecido voltou às suas raízes. Foi contagiante a volta de Aparecido ao lar. Naquela noite fogos de artifício espocavam pelos ares; copos contra copos tilintavam; lenha crepitava nas fogueiras; valas exalavam o cheiro de churrasco e as estrelas despiram-se do ofuscamento, brilhando o encontro de Aparecido com amigos e familiares no reino das fantasias em miniaturas. Naquelas bandas, uma vez que o Condado cobria muitas léguas além-morrarias, não havia um só vivente-pensante que rejeitasse uma nesga de cervo assado e uma bem servida jarra de bebida aromática fermentada, preparada com o mais puro mel fabricado por uma espécie de abelha que jamais existia em outros lugares, que não fosse ali; e vinho, que eles mesmos, placidamente, pisoteavam com seus pés peludos de sola cascuda, cintura anelada caída sobre o quadril e costas largas. Povos de baixa estatura, porém de elevada astúcia e percepção. Sabiamente, eram povos de rara amistosidade.
– Mas Aparecido, a quanto tempo agente não vê, vosmecê!!
Aparecido tinha poderes mágicos, por isto, aparecer e sumir era questão de momento e enquanto a manhã despontava da aurora, Aparecido sumiu; caiu na aragem; sumiu na capoeira. O condado acordou de velho e cadê o novo Aparecido. Como sempre fizera, ele havia escapulido sem deixar pistas; somente o braseiro na vala, copos e garrafas esparramados pela relva rala, o vento leve minuano primaveril, o zunido dos galhos de árvores frutíferas dobrados até o chão, o farfalhar das folhas e o sereno que desfazia-se devido os intrusos raios de sol que batiam contra portas e janelas dos iglus. O ambiente que horas antes havia sido contagiado pela magia de Aparecido, naquele instante, aparentava-se triste, enfadonho e lamentoso. A sensação era de adeus definitivo.
- Que nada meu povo, olha eu aqui de novo!! Quem é mutável, desdobrável, assim como eu, dá um salto para alto e o mundo se transforma. Vou sentar sobre esta raiz de árvore, lavar o rosto nas águas mansas e frias do regato e soprar para o alto anéis de fumaça. Quando eu disser: “já”, todos vocês fechem os olhos. – e antes que o Condado se preparasse para a piscadela pedida por Aparecido, ele bradou: “já”. O imprevisível do Aparecido levava a vida pregando peça.
Subitamente o céu escureceu. O brilho dos fachos de luz dos fogos de artifício cortaram o firmamento, iluminando-o. As árvores resplandeceram pelo multicolorido das folhas e flores. Dos regatos e córregos, as sete cores do arco íris cintilavam, emergindo das profundezas. Equidistantes de metro em metro, nascentes transformavam-se em fontes luminosas. Pequenos seres de não mais que seis palmos de altura externavam o êxtase da criação multicolorida de Aparecido. O espetáculo era realmente memorável.
Na parte de baixo do condado, formado pelos fundos de vale que recolhiam as águas das vertentes, havia uma nascente de águas cintilantes. Recebera o nome de Sumidoura, pois assim como Aparecido, aparecia e sumia. Em épocas de cheia, quando as águas desciam morro abaixo em turbilhões, Sumidoura sumia para não perder sua beleza inigualável e misturar-se às águas barrentas de chuva. Desejava ela permanecer eternamente majestosa naquelas encostas que abriam-se em dois mansos e plácidos regatos.
Naquele baixio paradisíaco, de vegetação verde e de flores belas, Aparecido sempre ia confessar à Sumidoura seus sonhos. Lançava os joelhos e as mãos à beira da nascente, fechava os olhos e banhava o rosto em suas águas límpidas e serenas. Nesse momento, o Condado ressurgia das cinzas e Aparecido voltava a si renovado. Tudo era luz e mistério.
Certa ocasião, cumprindo o ritual secular, pois naquelas bandas ninguém conhecia o infortúnio da morte, Aparecido se lançou às suas margens. Inesperadamente, foi tragado por uma torrente de água vinda das morrarias, que o arrastou para dentro do lago. Após muito debater-se contra as ondas movediças, conseguiu safar-se e trouxe consigo as mudanças; e a mais significativa foi a coroa que cobria sua cabeça. A partir daquele instante o condado deixou de ser coberto pelo júbilo da magia e mistério e tornou-se propriedade particular. E todos os viventes-pensantes cresceram e transformaram-se em seres grandes, súditos de um homem só.
Notícias sobre as magias de Aparecido e Sumidoura, da nascente de águas cálidas e cintilantes? Quem sabe, sumiram para nunca mais. No reino de gente grande é impossível haver dois deuses habitando uma única terra.
- Tenho fé que um dia eles apareçam: as magias, os mistérios, os sonhos e as fantasias de gente pequena não podem acabar....nunca...jamais, nos pensamentos e mãos de gente grande! Pois, esses lugares místicos, mágicos, de difíceis acessos, jamais são encontrados em reinados de um único rei; afinal, todas as terras encantadas são de todos os reis e todos os reis, pertencem à todas as terras encantadas. Reis e terras jubilosas são interativos, cosmopolitas e estão em constante movimento no mundo das insuperáveis e inocentes magias dos inusitados seres das florestas.
O segundo episódio é "A Aparição". Também pertence ao conto "Vale da Garganta Intransponível". Abaixo dois parágrafos para aguçá-lo...
Após percorrer por muitos quilômetros, espraiando-se pelos inúmeros poços e meandros nas partes ainda mais baixas; geograficamente, o Condado estava no topo elevadiço e perfazia a Cordilheras y Valles de Duraznos y Melocotones, até desembocar no mundo de águas chamado “Mar sin fin”. A cordilheira e os muitos vales profundos prendiam e ao mesmo deixavam escapar as profusas magias e segredos ao longo de suas lombas montanhosas.
Em certa passagem, o maciço montanhoso da Cordilhera y Valles, corta o Valle de la Garganta Intransponíble, onde quem detém o domínio de território, gozando inclusive de toda pompa e irrestrita liberdade de rei do lago profundo, com sua coroa reluzente no escuro é o mirrado, birrento e oportunista do peixe nomeado pelos amigos e apreciadores chamado Levino.
Confira e boa leitura!