O Menino Que Dava Nó Em Pingo D’água

Reza a lenda. Que em uma cidade do interior do Brasil, precisamente no Nordeste, terra de pouca, porque não dizer, nenhuma água, em muitos lugares do sertão. Foi lá mesmo que nasceu Pedro. A criança cresceu, aliás desenvolveu, na verdade, qualquer adjetivo desse tipo seria impróprio. Vamos dizer que o garoto resistiu, já que tinha estatura baixa e quase não sobreviveu devido a alimentação precária e condições de higiene que deixavam a desejar. Possuíam um poço que servia a eles e aos animais, quando continha algum resquício de água barrenta. Bebiam com insetos dentro e logo vinham as dores na barriga. A distância até o médico era grande acabavam resolvendo por ali mesmo, de um jeito caseiro, tomando um chá receitado por algum vizinho. Isso quando tinha água para se fazer a beberagem, já que muitas vezes mastigam a folha da planta à seco. Acompanhava o velório de crianças de sua idade ou ainda mais novinhas, que sucumbiam diante da miséria. Adultos também eram enterrados e a morte vivia rondando aquele povoado, isso sendo percebido pela quantidade urubus que rodeavam o tempo todo os céus, mesmo não havendo carniça, como se pressagiassem o infortúnio.

Um dia, na escola, Pedrinho, como a professora insistia em chamá-lo, teve uma ideia. Foi na aula de Ciências, com os ouvidos tapados para a explicação, já que sua barriga doendo de fome não o deixava se concentrar. Nos livros observou certos mecanismos chamados hidráulicos e uniu isso ao conhecimento de História , sobre amarrações feitas em navios, onde destacavam os negros escravos e agregou a Geografia, pensando naquela quantidade de fontes de água e uniu tudo em sua mente. Imaginava que a evaporação iria acontecer e que deveria estar preparado para agir sobre ela. Voltou para casa e ao ajudar os irmãos na lida diária, aquele pensamento martelava sua cabeça. Não sabia mais se tinha dor de cabeça por causa da fome ou eram as ideias que causavam aquilo. No quarto, reuniu algumas folhas e um lápis roído e fez alguns esboços. Não havia material para construir engenhocas e nem onde conseguir quem investisse em sua engenharia. Contava para as pessoas e elas riam dele, dizendo que era um menino esperto e que um dia seria reconhecido.

Até que um dia, sentando próximo a uma poça, que foi a única sobra de um riacho que abastecia à comunidade, a coisa aconteceu. Ele observava a água e via que se tornava cada vez mais escassa. Alguns animais tentaram se aproximar, mas foram tocados pelo menino, que sentia tristeza em afugentar os bichos, mas sentia que estava ali por algo maior. Talvez por efeito da insolação, e foi o que imaginou primeiramente, o garoto conseguiu ver as gotas subindo em forma de vapor, como nunca imaginou que alguém pudesse observar. Tentou pegar o vapor e percebeu que era inútil. Mas, por uma magia qualquer, Pedro alcançou a gota no período que esta para se tornar vapor e conseguiu, com seus dedinhos magros, dar um nó na danada, deixando-a presa ao solo e impedida de ir preencher as nuvens. Quando viu, havia feito aquilo em uma grande porção da poça. A novidade correu o mundo, a família do garoto o imaginou como um pequeno Jesus que regressara. A dor da seca aumenta a fé dos sertanejos. Autoridades vieram comprovar o fenômeno e ficaram espantadas. Autoridades religiosas vieramd ar o seu aval.

Feito um artesão, Pedrinho ia fazendo suas pequenas amarrações. Foi testado ao ser levado em uma capital, onde diante de uma chuva que despencara dos céus, com abundância de água, conseguiu de forma delicada, ir colhendo porções e amarrando-as. Porções se água separadas, sem conseguir se dispersar por valetas. Era sim, um milagre. Mas Pedrinho não desejava aquelas holofotes. Sua família conseguiu auxílio financeiro, sua mãe, pobrezinha, aparecia na televisão, dando entrevistas. Mas ele, se recordava aqueles sem água e pensou que poderia estocar a água e retornar com a solução da seca naquela parte do Nordeste. Diante de tudo que isso significava, alguns entusiastas, levaram o menino de volta à sua terra natal, para que realizasse seu sonho. Chegando lá, quando desceu de um dos carros da comitiva e se preparou para aguardar os caminhões com a água acumulada. Não sabe como e nem de onde, um disparou certeiro calou o menino, fazendo-o tombar no chão de terra seca e dura. E nesse instante, um trovão como nunca disseram ter ouvido igual, estralou o céu, como se o mundo gritasse e despencou uma chuva que nunca haviam visto igual naquela região. A tempestade alagou e matou afogado o gado, fazendo as pessoas se abrigarem nos telhados das casas que se dissolviam diante do volume de água. O senhor de mais idade no vilarejo, disse que Pedrinho estava no céu e que lá o trabalho dele era desamarrar a água para abençoar o seu povo sofrido.

Bruno Azevedo
Enviado por Bruno Azevedo em 11/03/2014
Código do texto: T4724433
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