O CONHECIMENTO, O TEMPO E A MAGIA!
Aquela noite estava da cor e com efeito de um filme hollywoodiano – parecia um tom azul e com um fundo acetinado. Tudo... Tudinho preparado para comemoração da terceira-lua da indiazinha Nuvem-Redonda. Dia aguardado pelas nações daquela reserva indígena. Enfim, era noite de tradição... De festa!
A verdade é que há tempos, as nações vinham se preparando, tradicionalmente, pra este momento mágico. O ritual do amor e do poder... Rito de tempos em tempos experimentado: Os machos pintavam suas fêmeas com as cores da fertilidade, da conquista e de um novo amanhã. E depois, num frenesi alucinante, como se fossem pincéis, esfregavam suas genitálias por todo o corpo das mulheres. Criando-lhes sinais tribais - num ritual de passagem!
Naquela noite, a pequenina Nuvem-Redonda observava toda/os... A indiazinha com a visão de águia, o faro de hiena e a sabedoria de coruja, serenamente, caminhava de uma oca pra outra. Passo-a-passo a curuminzinha encorajava suas frágeis pernas a acompanhar o seu raciocínio!
Nuvem-Redonda, como todos, na aldeia, aguardava a chegada de Madonna... Mas, pra aquela indiazinha, entre o céu e a terra pairava alguma magia no ar, que ela ainda não tinha certeza do quê... Lembranças iam e vinham deixando-a inquieta.
A reserva estava toda enfeitada e a/os indígenas eufórica/os cantavam e dançavam seus costumes e tradições... Num momento de conhecimento e preservação! Tudo isto porque a filha pródiga Madonna retornava, após tres longas luas, à Reserva Raposa Serra do Sol!
Num passe de magia Madonna adentra à Reserva, sendo entusiasticamente saudada pelas diversas nações paramentadas. Era como se voltasse no tempo pra Estrela-do-Amanhã - esse era o seu nome original. Ela, então, rodeia... Olha pra pequenina Nuvem-Redonda e se desvencilha de todo aquele entourage que a Cidade lhe impunha. E ritualmente brinca... Acaricia a pequenina Nuvem-Redonda e roça-lhe os seios, envolve seus pelos e a põe no colo. Então brada:
- Irmãos de agora e sempre, parem! Deixem-me ficar sozinha com minha filha!
Estrela-do-Amanhã ergue Nuvem-Redonda e envolve a indiazinha em seus longos braços. Experiencializando, novamente, o corpo dela no seu. Lambuzando seus corpos de leite, lágrimas e baba... Como se unisse o antes e o depois! O colo a torna a mãe afetuosa das luas passadas... Então, o presente e o passado, na voz de Madonna novamente falam:
- Esta é uma noite muito especial pra mim e para todas as nações da Reserva Raposa Serra do Sol... Lua de festa e de reencontro com o meu povo e com a minha Nuvem-Redonda, que começa caminhar por suas próprias pernas e amparada na tradição dos mais velhos. A nossa história a tornará livre, independente, dona de seu caminhar... E sem desvinculação dos nossos costumes e tradições... Vida. Nunca me esqueço das sábias palavras do meu tataravô Cacique Touro-Sentado, quando ele pra mim dizia: “Estrela-do-Amanhã, eu tive um sonho e nele você representa o aro do passado, presente e futuro... ”Inúmeras luas se passaram e o poder mágico de meu tataravô quis a noite por testemunha! A Reserva Raposa Serra do Sol festeja a conquista de sua reintegração, autonomia e respeito para suas tradições...
Estrela-do-Amanhã, então, como o velho cacique profetizou: - Nuvem-Redonda representará a experiência viva desta permanente conquista!
A madrugada tornara aquela noite, ainda, mais mágica para as populações indígenas, que em êxtase cantavam e dançavam suas tradições e sabedorias... E lambuzavam seus corpos nus uns nos outros. Produzindo culturas, hereditariamente, traduzidas pelos cânticos e fumaças do mais velho. A índia-mãe, então, retornou ao grande circulo e concluiu os festejos:
- Não resta dúvida de que todo o nosso conhecimento começa pela experiência! Tudo que sou agora é resultado de nosso processo histórico... Fruto de conhecimento de nossos ancestrais! Nada que vem de mim é por acaso. A sobrevivência da nossa cultura depende do conhecimento e da magia de nossos ritos... Enfim, da nossa herança histórica!