Sereias

     Era fim de tarde, deitada na varanda da minha casa apreciava o pôr-do-sol embalada ao balanço da rede e ao som suave das ondas do mar. Tudo estava calmo, como qualquer fim de tarde numa praia quase deserta como era a praia de Cambuinhas. Aquele final de semana prometia ser um dos mais tranqüilos daquele paraíso ainda desconhecido de muitos habitantes da terra.
     Estava eu quase a cochilar com tamanha calmaria quando, de repente, ouvi murmurinhos vindos de longe e de quando em quando esses se mesclavam a gostosas risadinhas, que em questão de segundos deduzi serem de crianças. Como não ouvia vozes de adultos logo atentei ao fato daquelas criaturinhas estarem sozinhas a brincar na praia. Levantei meu corpo da rede e estiquei a minha cabeça, afim de que a minha vista pudesse ver mais longe. Qual foi o meu espanto ao constatar que realmente eram crianças a brincarem na praia e que estas estavam de fato desacompanhadas. Não tive dúvidas, ergui-me como de um salto da minha confortante rede e sai às pressas temendo que algo de terrível viesse a acontecer com aqueles seres, que no momento se encontravam tão desprotegidas, frente a grandeza da fúria do mar.
     Quanto mais eu caminhava mais parecia não chegar ao meu destino e mais crescia dentro de mim a ansiedade e a angústia de não poder chegar a tempo de evitar que aquelas crianças adentrassem no mar.
     Quando realmente consegui enxergá-las mais nitidamente, percebi que o meu medo tinha razão de ser. Eram três pequeninas garotas que agora já tinham sido alcançadas pelas primeiras ondas. Pareciam se divertir. Brincavam animadamente sem se importarem com o avanço das ondas sobre seus pequenos corpos. Ao me aproximar mais, pude perceber quão encantadoras eram aquelas pequeninas de sorriso sapeca. Porém a minha presença parecia incomodá-las, pois quando mais eu tentava me comunicar e me aproximar, mais elas se retraiam.
     Ao tomar a minha decisão de finalmente alcançá-las e puxá-las da água, qual foi a minha surpresa ao ouvir um som estranho, que conseguia ser, ao mesmo tempo, estridente e melodioso. Demorei a acreditar que aquela música tão aguda saia da boca de uma delas. Mas a maior surpresa ainda estava por vir, ao tentar dar mais um passo na tentativa de resgatá-las, vi que ao invés de pernas elas tinham caldas como os peixes. Estas se debatiam sobre as águas, avisando que o mar as chamavam de volta. Nada mais tinha eu a fazer, a não ser deixá-las partir. Senti de inicio uma grande tristeza, tive vontade de mergulhar naquelas águas e parti juntamente com elas. Contive meu desejo. Voltei para casa e não comentei com ninguém o que havia presenciado naquela tarde. Nunca mais as vi. Às vezes pareço escutar o som daquela música misturada ao barulho das ondas do mar.



FIM
Márcia Kaline Paula de Azevedo
Enviado por Márcia Kaline Paula de Azevedo em 05/03/2011
Reeditado em 05/09/2015
Código do texto: T2830902
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.