A SOLIDÃO E A ÁRVORE - 13

A SOLIDÃO E A ÁRVORE - 13

Rangel Alves da Costa*

Enquanto o pai rugia, Maria se escondia; enquanto o pai vociferava; Maria se amoitava; enquanto ele prometia vingança, ela se protegia num exército de aliança.

Na sua correria para fugir do pai e ir conhecer o mundo, Maria não foi muito distante, não conseguiu ir um passo adiante daquele reino encantado que conhecera há instantes atrás.

Com efeito, na ventania que ia, parecendo que ia dar no outro lado do mundo em segundos, não conseguia ir além da mataria bem pertinho de sua casa.

Mataria, reino encantado, jardim de cinzas, aridez florida, lar da umburana cabocla, do passarinho fofoqueiro, das plantas e bichos falantes, das pedras sentimentais, do mundo ali existente.

Quando ela passou da cortina verde e pretendia romper o círculo da misteriosa e instigante natureza para seguir sem destino, eis que mil braços impedem, mil braços abraços, mil vozes ordenam que pare e uma voz em especial diz que não precisa fugir.

Essa voz absoluta, sobressaindo-se entre todas sem ser mais alta nem mais forte – na verdade, doce, sublime e suave – saiu da raiz da cabocla e espalhava-se pelo seu tronco, galhos e folhagens.

Mocinha linda que o vento leva, ou ela pensa que o vento vai levar, deixe dessa correria, deixe desse avoar, deixe de desespero, se acalme e venha cá.

Venha cá agora mesmo, e nem tente ser afoita, senão prendemos na terra, escondemos você na moita, deixemos que fique calma até que a razão lhe convenha. Venha...

Venha cá, deixe de pressa, é a paz que nos interessa, mesmo que sua atitude seja no mal uma virtude, pois ninguém nasceu bandido pra viver preso e escondido, ninguém merece viver sofrendo sem nada ter.

Isso é apenas uma parte do muito que tenho a dizer, pois desse momento em diante cuidaremos de você, e ninguém será maluco de vim aqui contradizer. Só entra por aquela entrada quem na vida tem estrada; quem anda por cima de espinho aqui não encontrará caminho.

E chegue mais, venha cá, descanse, é bom respirar, sente aqui nesse lajedo, que é pedra que não mete medo e que vai lhe confortar.

Venha logo, venha cá, sente aí, descanse já, e se der sono adormeça, deixe que o dia amanheça, dormirá bem protegida, sonhará com sua vida e quando no canto acordar poderemos conversar, dizer o que está se passando, essa história consertando, até tudo melhorar.

E Maria se aproximou da cabocla e disse que precisava sair dali agora mesmo, fugir de qualquer jeito, pois o seu pai a qualquer instante chegaria para lhe buscar.

E a cabocla bem calma, mostrando sabedoria, respondeu que gostaria de conversar com ela somente quanto estivesse mais calma e descansada, mas como ela insistia, no mesmo instante ouviria e encontraria solução.

E quando Maria começou a contar tudo desde o início, todo seu martírio e sina, a cabocla pediu desculpas e disse que não precisava reviver tanto sofrimento, vez que ela já conhecia tudo mesmo antes dela nascer.

Disse que por enquanto não falaria sobre isso, pois era assunto pra dia inteiro, mas que ela tivesse certeza que tudo que ocorria naquela casa e sua família, ela sabia primeiro.

E sabia não porque era fofoqueira, porque vivia perguntando ou se intrometendo na vida dos outros, procurando saber do que não lhe compete conhecer.

Mas sabia pelos olhos e ouvidos da natureza, que como o próprio Criador, é onisciente, onipotente e onipresente.

Mas como assim? Perguntou Maria.

A natureza é assim porque é a plenitude da vida; é a vida sem mácula nem nódoa; é a verdade absoluta da criação. E por não ser egoísta possui braços e olhos para proteger as pessoas boas como você.

Explique melhor, pedia Maria.

A natureza é também proteção, menina bonita. Mas a gente só sabe proteger conhecendo. Por isso mesmo é que o destino divino nos permitiu vim fazer moradia bem aqui ao seu lado, ao lado de sua casa, pois uma força superior já sabia o que lhe iria acontecer.

E como não deve haver tristeza sem alegria, é que nos foi dada a missão de ser o seu espelho para refletir toda a verdade e toda felicidade, qualquer dia e sempre, mesmo que se pense que é muito tarde.

continua...

Poeta e cronista

e-mail: rangel_adv1@hotmail.com

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