A SOLIDÃO E A ÁRVORE - 10
A SOLIDÃO E A ÁRVORE - 10
Rangel Alves da Costa*
Ficou pouco tempo naquele lugar que logo passou a chamar de reino encantado. Não sabia o que reino nem encantado, mas ouviu uma vez sua mãe falar em coisa parecida.
Gostou do nome. Gostou do reino encantado, então aquele misto de mato e folhagem seria o seu reino dali em diante, onde buscaria se encantar com as coisas da natureza.
Além da cabocla, pois preferia chamar assim, pôde perceber outras árvores miúdas, rasteiras; uma grande quantidade de plantinhas e que certamente dariam flores se por ali chovesse com frequência.
Capinzal de pele macia e cactos sempre verdejantes e espinhentos, moitas, buracos, pequenas veredas, de onde de vez em quando surgia algum pequeno animal. Pelo cantar disperso, logo se percebia a grande quantidade de passarinhos existentes.
E muitas pedras, galhos pendidos, mortos; garranchos tronchos, espalhados pelo chão, pisoteados, carcomidos. E uma pedra bonita, parecendo um banquinho talhado à mão logo abaixo da cabocla.
E quando já caminhava para sair, percebeu uma pequena ventania se formar unicamente no lugar e folhas ziguezaguear em festa ao seu redor. Era tudo diferente, bonito e envolvente.
Mas tinha de sair porque seria perigosa sua ausência no quarto por muito tempo. Se o seu pai chegasse ali e não lhe encontrasse o resto do resto da choupana cairia.
Mas conhecendo esse lugar e tendo gostado tanto, certamente que viria ali outras vezes, todos os dias, sempre que pudesse, pois alguma coisa falava ao seu espírito que muitas coisas importantes poderiam acontecer no local.
Ao dar o olhar de adeus aos novos conhecidos e dar um passo em direção à estradinha, ouviu vozes. Eram vozes, tinha certeza.
Menina bonita, foi bom conhecê-la!
Não vá agora não, fique mais um pouquinho com a gente. Esse lugar sem vida já estava se tornando num verdadeiro jardim.
Se você voltar mais vezes prometemos muitas surpresas boas. Você volta?
Você vem aqui mais tarde ou amanhã. Se vier eu peço por favor que traga uma cuia de água pra matar um pouquinho a sede de muitas plantas que estão precisando ao menos de uma gotinha de água.
É, a flor do campo tá morrendo, o lírio do campo também. A maioria das plantinhas daqui estão adoecendo rapidamente, estou enfraquecendo e não viverão muito tempo se não receberem ao menos uma gotinha d'água.
Muitas das que estão aqui e parecem já mortas, ainda não partiram não. Estão em estado terminal, mas se chover um tiquinho logo recuperarão as forças e viverão ainda por muitos anos.
Ei, menina de olhar triste, olhe pra cá!
Eram vozes e mais vozes, palavras e palavras que chegavam a confundir Maria. Nunca tinha visto planta nem bicho falar, nunca que soubesse que ao menos isso pudesse acontecer. Mas a verdade é que estava acontecendo.
Pensou que aquilo tudo não passava de uma fantasia, de uma miragem, de algum sonho maluco ou de qualquer coisa que acontece somente com as pessoas que nunca estiveram no meio da natureza.
Responderia ou não. Não iria responder por que senão tão cedo não sairia dali e precisava voltar pra casa urgentemente. Mas uma voz lhe chamou a atenção de modo diferente. E essa voz repetiu:
Ei, menina de olhar triste, olhe pra cá!
Olhou em direção à voz e se deparou com a cabocla. Era ela que falava sim, e dia mais:
Amanhã volte aqui e verás como está diferente no seu novo espelho!
continua...
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com