O ROUBO DO SORRISO DA MENINA – 23
O ROUBO DO SORRISO DA MENINA – 23
Rangel Alves da Costa*
Assim que o pai de Lucinha procurou o jardineiro para saber detalhes sobre aquele assunto aparentemente ridículo, mas que já tomava proporções preocupantes, foi logo informado pelo homem que nem se preocupasse com aquela conversa, pois a tal morte das rosas já estava sendo investigada, o culpado seria logo conhecido e tudo ali voltaria ao normal o mais breve possível.
Indagado se tinha pleno conhecimento da relação da tristeza da menina com as rosas falecidas, ele saiu-se com esta:
"Verdade, doutor Paulo, que muito se comentou por aqui que as rosas haviam roubado o sorriso da menina e não tiveram tempo de devolvê-lo porque foram mortas. Diziam também que diante dos fatos só se poderia concluir que a menina jamais voltaria a ficar alegre, pois nada mais nesse mundo, a não ser as rosas, poderia reverter a situação. Com Lucinha continuando com essa tristeza toda as fofocas aumentaram e o que era suposição começou a tomar ares de verdade. Contudo, doutor Paulo, eu mesmo juro por Deus que uma coisa nada a ver com a outra..."
"E o que é que tem a ver com a tristeza de minha filha, Seu Heleno? Diga, por favor". Perguntou Paulo em meio à conversa do outro.
"Pois bem, doutor Paulo, vou dizer o que acho disso tudo. Na verdade, acho que o problema de Lucinha não tem nada a ver com as rosas, com as outras flores, com os passarinhos, as plantas ou com quem quer lá que seja. Ela está assim porque soube que no final do ano vocês vão se mudar e no apartamento onde vão morar não poderão mais ter nem um só tantinho do jardim maravilhoso que têm aqui..."
Foi interrompido bruscamente pelo pai da menina: "Esperaí Seu Heleno, mas que asneira é essa, que conversa é essa de nós vamos nos mudar daqui? Por favor, diga-me agora mesmo de qual boca maldosa e que não tem o que fazer saiu uma mentira deslavada dessa. Diga Seu Heleno, diga agora mesmo que preciso perguntar a esse mentiroso ou mentirosa qual o direito que tem de sair mentindo desse jeito por aí. Diga, Seu Heleno!"
E o jardineiro ficou branco igual ao copo-de-leite. Estremeceu, coçou a cabeça, baixou a crista, procurou um buraco pra se meter e não achou. Teve que responder e o fez como pôde:
"Ora, doutor Paulo, quem andou espalhando essa conversa por aí foram as rosas, e até acho que no mesmo dia que morreram...".
"Mas você está com brincadeira Seu Heleno. Será que acha que vou acreditar numa conversada dessa, quer dizer, nesse álibi sem pé nem cabeça. O senhor bem sabe que ninguém acredita mais nessa história de culpar quem já morreu. É muito cômodo e fácil acusar defuntas de terem dito uma coisa sem que elas estejam aqui para contradizê-lo. Nem me venha com essa que não pega, que não vou cair feito um idiota. Pode arrumar outras mentirosas para culpar que essas não valem não. E cuide de me dizer logo a verdade Seu Heleno, ande!".
Nesse momento o jardineiro era o homem mais arrependido do mundo por ter feito aquela afirmação descabida. Ele mesmo estava mentindo sobre a mudança da família e sobre a causa da tristeza da menina. Estava mentindo e reconhecia isso, e tanto era assim que dava pena ver a figura sem saída do homem. Contudo, fato é que mentiu com algum propósito, com algum objetivo que somente ele sabia.
"Mas, mas, mas, doutor Paulo, essa é...". E deu sorte por não poder mais continuar porque foram interrompidos pela algazarra que se fazia logo adiante, com um fato estranhíssimo que estava ocorrendo.
A estrela-de-fogo reunia ao redor de si quase o jardim em peso para dar início às suas estratégias de acusação e defesa.
continua...
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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