O ROUBO DO SORRISO DA MENINA – 11

O ROUBO DO SORRISO DA MENINA – 11

Rangel Alves da Costa*

Seu Heleno procurou imediatamente encontrar a solução mais caseira que fosse possível, e resolveu reconhecer o problema e antecipar o que já estava sendo feito para resolver aquilo tudo. Assim, chamou Paulo mais pra um canto e falou baixinho:

"A tristeza que se instalou na menina de uma hora pra outra realmente está preocupando a nós todos e aporrinhando até demais. Não posso afirmar que nisso tudo tem o dedo das rosas enquanto estavam vivas porque não sou maluco de dizer uma coisa que não vi. E quem iria imaginar que elas fossem capazes de fazer um negócio desses, um feitiço, seja lá o que for, para roubar o sorriso da menina que também era tão amiga delas? Tudo isso é suposição, porque afirmar com segurança que elas tiveram culpa no caso não posso não. Mas para evitar que isso se arraste, se prolongue, e de modo que essa conversa sem pé nem cabeça chegue logo ao fim é que consegui trazer para o jardim uma planta estranha às espécies existentes. Chamam de planta estrangeira, exótica, forasteira, invasora e não sei mais lá do que, mas só sei que como detetive não pode ter igual. Ela já está ali, olhe...". E apontou uma planta realmente diferente, toda imponente, que estava mais adiante.

Para Paulo, era como se estivesse viajando num mundo de absurdos, de coisas sem pé nem cabeça, impossíveis de acreditar. E nem quis falar nada, até porque nem sabia o que dizer mais, apenas ouvir o que Seu Heleno ainda tinha que inventar.

Apontando para a planta, prosseguiu o jardineiro:

"Trata-se de um belo exemplar de Crocosmia crocosmiiflora, também chamada de estrela-de-fogo, tritônia ou montbrácia. É uma planta invasora nativa da África do Sul. É invasora e pode prejudicar as plantas nativas, pois aonde chega quer tomar conta do lugar, mas isso será passageiro, pois assim que ela descubra quem matou as rosas – E dizendo baixinho ao ouvido de Paulo – será imediatamente descartada. Mas onde consegui essa me deram uma boa ficha dela, disseram que não tem planta mais qualificada para investigar esses casos. E o senhor sabe que ela descobrindo quem está por trás da tragédia, será mais fácil também trazer o sorriso de Lucinha de volta".

Tirando um papel do bolso, falou para o extasiado, abismado e incrédulo Paulo: "Por favor, o senhor mesmo pode ler aqui tudo sobre essa planta detetive. Mandei aprontar lá onde consegui a danada e famosa. Leia, por favor".

E Paulo, que achava melhor continuar com a boca aberta sem acreditar no que via e ouvia, segurou o papel, colocou diante dos olhos e fez uma leitura como que automática:

"Crocosmia crocosmiiflora ou detetiverus fogasius, como também é conhecida pela sua extrema capacidade de desvendar os casos mais instigantes pelos mais diferentes jardins, é uma planta herbácea, bulbífera, da família Iridaceae, de 50 a 70 cm de altura, nativa da África do Sul. Hibrído entre Tritonia potsii e Tritonia aurea, a crocosmia crocosmiiflora apresenta inflorescências longas, com flores pequenas de coloração vermelho-alaranjadas ou amarelas. As flores se formam principalmente no verão. É uma planta invasora, que se desenvolve em ambientes de sombra e meia-sombra, formando densos maciços floridos. Esse tipo de planta há muito que está inscrito no panteão dos grandes investigadores da natureza, pois detetives da mesma família já desvendaram, por exemplo, a pétala roubada da última flor de Julieta, o espinho venenoso na rosa que Tristão ia oferecer a Isolda, o caso do espinho de quipá que furou o olho de Lampião, o tipo do veneno contido na maçã que Eva mordeu no Paraíso e o mistério das flores suicidas do jardim suspenso da babilônia...".

"Está vendo, doutor Paulo, quanta capacidade investigativa possui aquela planta ali? Pois vai ser ela que vai trazer a paz novamente a esse jardim e consequentemente o sorriso e alegria na face de Lucinha!". Falou todo animado o jardineiro, antes mesmo que Paulo tivesse terminado a leitura daquele histórico maluco.

"Mas o que eu estou fazendo aqui meu Deus, aonde vim me meter, será que estou enlouquecendo? Não acredito aonde eu vim me meter. Se eu contar a alguém certamente que vão me internar no mesmo instante. Quem iria acreditar em planta, bicho e flor que fala? Quem de sã consciência iria acreditar que umas flores malvadas roubaram o sorriso de minha filha? Quem iria crer nessa vida que no meu jardim, na minha casa, está morando uma planta que é detetive?". E Paulo começou a sorrir bem alto, de espantar o jardim em peso.

Entregou o papel ao jardineiro e deu a volta ainda gargalhando, seguindo para dentro de casa como se não tivesse com o juízo aprumado. E Seu Heleno, sem saber o que fazer diante dos gestos estranhos do patrão, achou melhor simplesmente dizer:

"Pois é. E o pior é que ainda não vimos nada!".

continua...

Poeta e cronista

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