A Dama da Filosofia

Acabara de fazer 20 anos, era alto, bonito, magro, cabelos e olhos castanhos, inteligente e dotado de uma curiosidade pela vida muito maior que o de qualquer pessoa comum.

Tinha esses 20 anos e não sabia o que fazer da vida ainda. Queria estudar, mas ainda não tinha decidido o que. Até que decidiu, depois de muito pensar, em fazer filosofia.

Acreditava ele que iria conseguir suas respostas com ela, sempre ouviu dizer que a filosofia dava muitas respostas, mas dava outro tanto perguntas também, mas isso não era problema, o importante, pensava ele, era arrumar as respostas.

Iria estudar durante quatro anos. E assim eles se foram, passou o primeiro, passou o segundo, chegou no terceiro ano. Ele continuava bonito, inteligente, e cada vez mais curioso. Até que ele a viu.

Ela mal tinha 30 anos, era loira, divina, perspicaz, rápida nos movimentos, inteligente e racional. Sua aparência era quase a de uma deusa grega. Tinha tatuagens, era toda diferente, e isso o agradava muito. Nos seus pulsos estavam escritos “Teoria” e “Prática”, em um calcanhar “Guerra” e no outro “Amor”, e bem pequena, o símbolo da filosofia atrás da orelha direita, e a maior de todas, a grande roda da fortuna em suas costas, não havia um pequeno espaço em branco sequer naquela coluna que parecia deliciosa.

Ele estava encantado por ela, afinal, era divina demais pra ser real.

Veio transferida, apenas um ano atrás dele, mas era uma pequena gênia, sabia falar de quase tudo com propriedade, sabia escolher muito bem as palavras.

Demorou um pouco, mas se conheceram depois de uns dois meses desse fatídico ano. Começaram a sair juntos, não se separavam por nada, como se fosse uma peça encaixada em outra.

Assim passou mais dois anos, ele já estava para se formar no seu bacharel em filosofia, e ela no de licenciatura.

Ele estava um pouco apreensivo, pois nos últimos dias ela não via agindo de maneira normal, estava fria, mais racional do que nunca, calculista demais. Enquanto ele continuava cheio de curiosidades sobre o mundo, mas estava sofrendo por causa dessa distância.

Até o momento em que ela da um ultimato nele, sem mais nem menos, de maneira grossa, pesada, dura, mas ainda assim, com respeito, e amor ela diz:

- Você não deseja o conhecimento da mesma forma que eu, você, para a filosofia não é nada, é trivial tudo aquilo que você faz, suas idéias estão todas foras do lugar! Mas ainda assim... Ainda assim eu te amo, e amo muito! Mas não sei se consigo continuar com alguém tão limitado nisso como você, quero me casar, ser mestra, mas você me atrapalha! Suas limitações me atrapalham! Quero que você abandone isso tudo agora!

Ele, entristecido e magoado, decide depois de alguns dias terminar com sua pequena prodígio, e com muito pesar, deixou seu amor por ela morrer depois disso, e tudo para ele perdeu sentido, algo havia morrido nele.

Tudo o que ele era morreu com ela nesse dia.

E ele foi seguindo, sem sentido, sem amor, sem vida. Até que virou mestre, doutor. Já dava aulas em faculdade renomada com apenas 30 anos, mas ainda assim nunca voltou a ser o que era. Ele perdeu sua beleza, seus cabelos de tanto estudar já tinham alguns fios brancos, andava sempre um pouco abatido, e nunca mais foi tão curioso assim.

Até que no auge do seu doutorado, no ápice dos 30 anos, no meio de uma palestra, ele a vê novamente.

Ela estava exatamente igual, continuava uma verdadeira deusa, e com isso, depois de tanto tempo, ele sorri. Mostrando seu sorriso que refletia no holofote que o marcava na palestra, e essa luz, foi tão forte que o ofuscou, deixando ele ver apenas ela, que lhe disse coisas que ele já não se lembra, ou que ele não ouviu, mas compreendeu.

Compreendeu que havia visto a Dama da Filosofia.

Nesse momento ele progride, de certa forma, depois de vê-la, tudo voltou a ganhar cor, vida, alegria... Descobriu que sua vida só era daquele modo porque ele tinha esquecido esse amor pela filosofia, pela pequena prodígio. Ela fez parte dele, e parte de toda a sua historia, de toda sua vida acadêmica, e até mesmo antes, quando apenas perguntava por ai qual era o sentido da vida. A filosofia estava sempre com ele, mesmo ele sem saber.

E ela, sentada no meio do publico, aplaudindo um grande mestre na filosofia, um doutor renomado, se tornar feliz por finalmente entender qual é o seu próprio sentido da vida, sorri pra ele, e o observa subir cada vez mais degraus, e pensa consigo mesma:

- Não largou os estudos, continuou caminhando mesmo sem saber qual era a sua motivação, mas nunca deixou de crescer. Ele não pode esquecer da filosofia, ninguém pode, ela esta presente em tudo e todos. Ele soube muito bem como viver essa vida, essa vida que eu não tive, e sempre quis ter, ele soube usar da filosofia muito bem, isso sim é mostrar sua teoria, sua originalidade. Ele só havia perdido o significado dessas coisas, mas hoje, hoje sim ele recuperou tudo o que era significativo para ele. Ele interpretou o mundo aos seus olhos.

Então ele lhe sorri, agradece a presença de todos, e começa a caminha devagar, de costas para o publico, olhando para ela, que continua radiante.

E a Dama da Filosofia feliz, lhe devolve o sorriso, e desaparece.

Minari
Enviado por Minari em 27/08/2010
Reeditado em 27/08/2010
Código do texto: T2461967
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