NO REINO DO REI MENINO – LVII
NO REINO DO REI MENINO – LVII
Rangel Alves da Costa*
Os mercenários enviados pela Ordem dos Rebeldes para aumentar ainda mais o poder de destruição das forças de Otnejon já estavam causando problemas para o próprio baixinho, que não sabia mais o que fazer para alimentar tanta gente e já havia mandado tomar à força toda alimentação que havia na casa das pessoas.
Antes que esses homens famintos se rebelassem contra o seu reino e colocassem em risco sua vida, ordenou aos seus homens que se fosse necessário esvaziassem cada quintal, cada plantação e matassem as galinhas, porcos, carneiros e ovelhas que encontrassem pela frente. E reafirmou que matassem também todo aquele habitante que quisesse se insurgir contra suas ordens.
O baixinho achou mais seguro antecipar os seus planos de ataque, de modo que após a vitoriosa operação todos aqueles estrangeiros retornassem para os seus lugares de origem. Ademais, depois de destroçarem as defesas de Oninem, podiam saciar sua fome como bem entendessem dentro do reino conquistado. Assim, chamou os comandantes de suas tropas e avisou que o ataque se daria no dia seguinte. Desse modo, durante toda a noite as tropas já deveriam se deslocar para as proximidades da fronteira, aguardando somente o aviso para o início da grande cavalgada invasora.
Deveriam se instalar nos locais determinados, mas não poderiam, sob hipótese alguma, iniciar qualquer avanço sem a ordem do comandante maior, que era o próprio baixinho. E ele deveria chegar logo ao amanhecer na primeira fileira de combatentes levando consigo o casal de prisioneiros, Lucius e Lize, pais do rei Gustavo, que certamente seria uma das vítimas fatais da invasão. Só não seria assim se este atendesse ao ultimato, à derradeira exigência que ele, Otnejon, mandaria fazer a um quilômetro das terras de Oninem.
Assim, com todas as tropas posicionadas e prontas para a cavalgada destruidora, um emissário seguiria alguns metros adiante com o casal e nesta posição chamaria um dos guardas da fronteira para enviar o último aviso: ou o rei enviaria naquele mesmo instante a coroa real em troca dos dois prisioneiros ou as tropas ali estacionadas entrariam nas terras do reino destruindo tudo que encontrasse pela frente.
Contudo, mesmo que o pequeno rei aceitasse essa última chance de evitar o ataque, enviando prontamente a coroa, ainda assim o destino de Oninem já estava traçado nas pretensões do baixinho, pois não ia ter aquele trabalho todo nem as despesas demasiadas que estava tendo para se contentar somente com uma coroa. De qualquer modo, fosse como fosse, invadiria o reino, massacraria todos os seus habitantes e tomaria posse, como troféu de guerra, de tudo aquilo que dentro de suas fronteiras houvesse. Não existiriam prisioneiros para cuidar, pois todos estariam mortos, inclusive o rei e os seus pais.
Ao menos era esse o plano do baixinho e tudo daria certo se ele não estivesse considerando que no outro lado também havia uma rei, com suas tropas e estratégias de defesa e ataque. Na sua loucura, que se acentuava ainda mais a cada instante próximo da contenda final, era como se tudo estivesse à mercê do seu poder, da sua força e da sua vontade, pois continuava se achando o mais esperto, o mais inteligente e o mais tudo. Na verdade, ele era apenas o mais insano, indiscutivelmente.
Nesse seu afã de querer ter tudo ao seu modo, não sabia, por exemplo, que o menino rei já sabia que tudo iria acontecer exatamente como estava planejando. Assim, o pequeno rei, por já ter conhecimento e certeza de tudo, sabendo que logo ao amanhecer as tropas inimigas estariam na sua fronteira e que receberia o ultimato em seguida, é que, até mesmo de modo estranho e contraditório para alguns, não ficou nem um pouco preocupado.
Numa situação como tal, as providências que tomou foram as de praxe: ordenou que os seis pequenos cavaleiros colocassem em prática suas estratégias e ele mesmo ficaria aguardando o momento adequado para agir. Nesse instante é que Otnejon realmente tomaria conhecimento da capacidade que tinha o rei que estava no outro lado, muito diferente do fracote, do moleque chorão, segundo o próprio baixinho vivia alardeando.
Diante dessa iminente situação de perigo, Bernal ficava todo nervoso e agitado, até raivoso com a passividade e a calma demonstradas pelo menino. Ora, não seria possível que todos podendo ter suas vidas ceifadas a qualquer instante, o pequeno rei ainda continuasse com aquela calma toda, brincando com o seu camaleão e sem sequer tomasse decisões drásticas para evitar que corressem qualquer tipo de perigo, falava pelos cantos.
O feiticeiro chegou a dizer ao amigo que era preciso que tomasse providências urgentes, pois todos sabiam que as forças inimigas estariam a qualquer momento marchando em direção ao reino. Como resposta simplesmente ouviu: "Os nossos homens já estão preparados e prontos para nos defender, as fronteiras estão mais que seguras, e eu estou esperando somente o momento de enviar para aquele maldito o que ele vai querer em primeiro lugar, que é a coroa. E irei enviá-la em forma de presente. E é isto que basta para se fazer".
Nessa noite, quando todos achavam que estavam prestes ao fim do mundo, o menino rei dormiu como um anjinho, calmo, sorridente e feliz. Sonhou com sua mãe retornando ao castelo toda feliz e ele próprio passeando pelas florestas e campos, pulando, correndo e tomando banho nos regatos, tendo por companhia os seis cavaleiros meninos e os seres verdes e orelhudos da magia.
Dormiria até muito tarde, se não fosse acordado por Bernal, que foi lhe dizer aos gritos que as forças inimigas já estavam se dirigindo para próximo das fronteiras de Oninem.
continua...
Advogado e poeta
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