NO REINO DO REI MENINO – LI

NO REINO DO REI MENINO – LI

Rangel Alves da Costa*

Nesses dias de crescentes insanidades no castelo de Edravoc, os prisioneiros de Otnejon, se por um lado haviam sido poupados um pouco de sua fúria, por outro só não haviam morrido de fome porque os dois duendes se encarregavam de trazer-lhes alimentos e água subtraídos ardilosamente da cozinha. Antes que os orelhudos viessem em auxílio, pensaram até mesmo em ver se conseguiam pegar uma daquelas cobras, esganá-la e encontrar alimento.

Segundo os duendes, não puderam estar ali presentes o tempo todo porque andaram muito ocupados, principalmente dando uma destinação segura aos objetos retirados do buraco na gruta antes que o baixinho e seus homens chegassem. Agora estavam escondidos em outro lugar tão seguro que nem mesmo o casal poderia ficar sabendo, ao menos por enquanto.

Lucius, o rei fujão e covarde, vivia o tempo todo de cabeça baixa, falando o mínimo possível com a esposa e até evitando olhar para os dois seres das florestas. Estes, brincalhões como eram, diziam que ele deveria se animar para pensar num modo de fugir dali. E foi num desses momentos de conversa para aliviar o sofrimento que um dos duendes lançou uma pergunta que ficou martelando em sua mente e fez com que a debilitada Lize se derramasse em prantos por um longo tempo.

"Talvez seja o seu filho, o menino rei, o único que possa salvar vocês das mãos desse tirano. Mas já pensou, Lucius, como irá ficar diante do seu filho, que ficou abandonado pela sua desenfreada ambição, e olhá-lo olhos nos olhos, agora que não é mais nada e ele é um grande rei?", tal foi a pergunta duende. Ninguém nem sonhava o que se passava na mente e no coração do ex-soberano.

Em Oninem, o menino rei, agora com os cofres do reino novamente abastecidos por algum tempo, mandou que os seis cavaleiros providenciassem imediatamente a aplicação de recursos para melhorar a qualidade de vida da população, fazer melhorias no campo e aumentar a produtividade, bem como garantir alimentação de qualidade e educação para as crianças e meios de proteção aos idosos e enfermos. Gostaria de fazer uma grande reforma no castelo, mas isto ficaria para depois. Entretanto, ele mesmo chamou para si a responsabilidade pelos investimentos na defesa do reino, e tanto era assim que já estava aguardando respostas do velho sacerdote sobre as negociações acertadas.

Mesmo com esse clima de prosperidade prevalecendo no reino, o que logicamente dava uma nova feição e mais alegria ao coração do pequeno rei, o feiticeiro Bernal parecia que não estava nem aí para todas essas mudanças positivas. Andava de cabeça baixa, pouco conversava e ficava a maior parte do tempo lá em cima na torre.

Quando os emissários fizeram o pagamento pela coroa ele nem por perto estava para bisbilhotar, do mesmo modo não deu as caras quando a cópia perfeita da coroa foi entregue. E o mais estranho: ele não estava escondido detrás das cortinas enquanto Gustavo conversava com o velho sacerdote. Chegaram até mesmo a insinuar que ele estava assim todo cheio de não me toque porque o menino estava acolhendo ali no castelo a mãe do seu maior inimigo. Era ciúme, diziam, e tudo porque acha que Gustavo vai dividir sua atenção com a velha senhora.

Gustavo nem tinha pensado nessa mudança de comportamento de Bernal, tanto é assim que deu um grito mandando que ele descesse rapidamente que teriam um assunto muito importante para conversarem. Assim que o feiticeiro chegou todo triste, o menino perguntou se ele tinha visto o próprio rosto no espelho para ficar assim. Não teve jeito, o feiticeiro continuou do mesmo modo, pesaroso.

Gustavo não gostava de vê-lo assim e por isso mesmo começou a indagar sobre os reais motivos de estar daquele jeito. "Pode abrir seu coração, velho feiticeiro, diga tudo que está sentindo", afirmou o menino. E foi quando o amigo começou a dizer tudo que estava remoendo por dentro:

- Estou triste por você, meu rei, e minha tristeza é maior por dentro. Tenho andado fazendo meus encantos e minhas magias e o que sempre tenho tido como respostas não são coisas nada boas. Hoje mesmo o espelho das águas na bacia estava totalmente enegrecido, sem mostrar nada, o que é um extremo sinal de coisa ruim, de que algo muito cruel está para acontecer. Insisti, insisti, e como resposta as águas apenas ficaram em rebuliço. Invoquei aos seres superiores, aos grandes senhores da magia, e como resposta obtive algo que não consigo decifrar de jeito nenhum, só sei que envolve uma coroa. Mas o problema da coroa já está resolvido, e o que será?

Gustavo deu um salto, sorridente, festivo, esfregando as mãos, o que fez Bernal achar que estivesse com o juízo fraco diante do que tinha ouvido.

- Já sei. Era essa a resposta que eu estava esperando, agora já sei... – Falou o irrequieto menino.

- Sabe o quê? – Indagou o feiticeiro assustado.

- Já sei como destruir aquele reino maldito sem precisar travar batalhas sangrentas com as tropas daquele infeliz. É isso mesmo. A coroa, a palavra é a coroa, que sábia resposta dos seus amigos encantados – Falava cada vez mais entusiasmado o menino rei – Eu sabia Bernal que somente você para aparecer com essa excelente ideia...

- Mas Gustavo, está sentindo alguma coisa, está com febre, está sentindo o juízo amolecendo? – Perguntou Bernal, se levantando e procurando ficar atrás de um móvel, assustado.

- Venha cá seu medroso, leve agora mesmo a coroa original para a floresta e peça, implore ou faça qualquer coisa para que aqueles seres maravilhosos façam outra cópia, como fizeram da outra vez, corra...

- O que?

- É isso mesmo que você ouviu meu amigo, agora vá que depois eu explico tudo direitinho – E correu dando voltas no salão de braços abertos.

continua...

Advogado e poeta

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