NO REINO DO REI MENINO – XLII
NO REINO DO REI MENINO – XLII
Rangel Alves da Costa*
Gustavo desceu apressado, quase correndo, com Bernal vindo logo atrás esbaforido. Tinha imenso interesse em saber o que o seu enviado a Edravoc tinha tomado conhecimento na sua breve estadia por lá, em missão pra lá de especial e arriscada. Sorte ele ter retornado com vida, e mais sorte ainda seria se o mesmo tivesse cumprido as tarefas segundo o planejado e obtido as informações que o pequeno rei tanto necessitava.
O menino rei lembrava bem ter ordenado ao enviado que obtivesse as maiores informações possíveis sobre aquele reinado e o seu rei, sobre a situação de seus pais enquanto prisioneiros de Otnejon, sobre quais as medidas que este poderia tomar em relação a eles, e ainda procurar saber qual era a segunda mais importante do reino, com suas características e tendências.
Assim que pôs os pés na sala de recepção, Gustavo foi logo dizendo em tom animador: "Folgo em vê-lo meu rapaz, todo inteiro, sem ter deixado um pedaço sequer naquele maldito lugar. Pelo visto é um excelente cumpridor de ordens, tendo se desincumbido das tarefas antes mesmo do que eu esperava. Será recompensado por isso. Mas espero que tenha trazido novidades boas, coisas interessantes, pois hoje não marquei no meu calendário nenhuma preocupação maior não. Sente-se e vamos ao que nos interessa".
Após as palavras do rei o rapaz ficou num misto de contentamento e preocupação. De um lado estava muito agradecido pela calorosa recepção, mas por outro lado temia que o que tinha a relatar não fosse muito do agrado do pequeno soberano. Isto se veria depois, pensou, e em seguida tirou do bornal um manuscrito contendo uma espécie de relatório de sua viagem. Não foi possível entregá-lo porque foi avisado que aquele procedimento seria totalmente desnecessário, vez que ele queria ouvir tudo o que havia se passado no reino do baixinho mal-afamado pela sua própria boca, de viva voz. E assim começou o rapaz:
- Senhor rei, todas as ordens foram cumpridas, mesmo que a duras penas, e sobre todas elas trago alguma resposta, sendo algumas mais alentadoras e outras mais preocupantes, para não dizer doloridas. Em primeiro lugar, aquilo ali que se chama Edravoc não é nem nunca será um reino, parecendo mais um pandemônio, umas esquisitas construções abrigando um povo empobrecido, na maior miséria do mundo, vivendo nos arredores de um suntuoso palácio para o lugar. É numa mistura de palácio e fortaleza onde se esconde o maldito Otnejon, indivíduo asqueroso e nojento, com cerca de um metro de altura com rabo e tudo, meio gorducho e barrigudo. A cor de sua pele é difícil dizer com precisão, pois o nojento muda de cor segundo seu humor. Infelizmente tive a oportunidade de estar cara a cara e até conversar com ele...
- Como foi, como foi? Diga, diga – Animava-se Gustavo, interessado no relato.
- Eu estava do lado de fora do palácio, espionando como se não quisesse nada, quando fui levado à força até a presença do tal Otnejon. Que homem mais esquisito aquele. Então ele disse que sabia que eu estava espionando o seu palácio e a mando de quem, e foi quando falou em vossa pessoa com ar de desdém, dizendo que aqui era um reino de brincadeira e que iria invadir se o pequeno rei não fizesse o que ele queria...
- Já sei, ele quer a coroa não é mesmo? – Interrompeu Gustavo, indagando.
- Isso mesmo, mas ele disse mais. Disse que os seus pais estão presos no castelo e somente serão libertados em troca da coroa. Além disso – Ficou totalmente nervoso sobre o que iria falar, mas havia decidido que não mostraria a porção de cabelos de sua mãe enviada por Otnejon como presente -, ele afirma que se não aceitar a proposta os seus pais correm um grande risco de vida.
As feições de Gustavo mudaram totalmente. Ficou com aspecto sério, fechado, passando depois a demonstrar entristecimento. Enquanto levantava para ir até uma das janelas, de modo a tentar esconder um pouco a repentina mudança no semblante, foi falando de costas para o rapaz:
- Chantagens, chantagens e mais chantagens, é somente isso que esse maldito sabe fazer, como se eu tivesse um pingo de medo de suas ameaças. Ele verá mais cedo do que pensa que eu não ameaço, mas ajo com o rigor que os bandidos e covardes merecem. E garanto que tirarei os meus pais de lá sem que eles tenham perdido um fio de cabelo sequer.
Quando ouviu tais palavras, mesmo sentado o rapaz estremeceu dos pés a cabeça. Uma mecha dos cabelos da mãe do pequeno rei estava com ele, dentro de um pequeno embrulho. Não sabe qual seria a reação do menino se ao menos desconfiasse do conteúdo que carregava. Por isso mesmo decidiu não entregá-lo de jeito nenhum. Contudo, nesse nervosismo todo o embrulho caiu bem no momento que o pequeno rei estava retornando.
- O que é isto que caiu meu rapaz, será um presente que me trouxe daquele maldito reino? Deixe-me ver – E se encaminhou com a mão estendida até o rapaz.
continua...
Advogado e poeta
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