NO REINO DO REI MENINO - XIV
NO REINO DO REI MENINO – XIV
Rangel Alves da Costa*
O velho sacerdote ficou encarregado de espalhar por todo o País dos Voantes que a coroa do Reino de Oninem estava à venda. Só aceitou o encargo a duras custas e somente depois que o rei Gustavo lhe cochichou algo no ouvido. Já estavam na casa real, onde o novo soberano havia mandado servir assados com um bom vinho da própria e quase vazia adega do castelo. Enquanto o serviçal de Deus e outros convidados se esbaldavam com os quitutes e a bebida, o rei conversava separadamente com Bernal. Parecia gente grande, se poderia dizer.
- Bernal, amanhã de manhã quero que me faça um favor. Preciso que você faça um daqueles truques, magias ou encantamentos, ou qualquer coisa parecida, para trazer até o castelo um daqueles duendes que vivem na floresta...
- Mas por que, o que é que tá pensando fazer dessa vez? – Perguntou o feiticeiro do bem.
- É simples. Quando os meninos chegarem amanhã, aqueles dentre os quais vou escolher os melhores para serem meus auxiliares, quero que deixe eles sozinhos comigo nesta sala. Quando todos eles estiverem em pé à minha frente, quero que o duende apareça do nada pulando e fazendo estripulias. Os que não tiverem medo ficam, são escolhidos; os que se mostrarem amedrontados ou correrem serão eliminados. Só isso – Concluiu o menino rei.
Bernal aproveitou a oportunidade para tecer comentários e fazer algumas perguntas:
- Majestade, já que tocou nessa questão vou logo dizer o que penso. Sem querer ir de encontro ao seu pensamento e à sua decisão, tenho a humilde opinião que é uma atitude por demais arriscada, não porque meninos não sejam capazes de dar conta do recado quando exigidos. Nosso rei é o maior exemplo. Só que não sei como todo o País dos Voantes e o resto do mundo irão reagir quando souberem que um rei menino vai reinar tendo outros meninos como seus principais auxiliares, certamente irão dizer que é um reino de brincadeira. Acho que conselheiros experientes, escolhidos dentre aqueles que prestavam bons serviços ao reino, devem continuar, até mesmo para repassar suas experiências para os que estão chegando. Ademais, meu rei, o que realmente cada um dos escolhidos fará, poderá decidir sobre o quê e até que ponto? Outra questão é saber se, por exemplo, o rei tem consciência de que tem situações que somente um adulto experiente pode se envolver. Disso vem uma pergunta: será que pensa em deixar um menino comandando nosso exército, tendo a responsabilidade de comandar adultos guerreiros para nos defender?
- Asneiras, asneiras Bernal, um feiticeiro como você não poderia falar tantas bobagens, pois até eu, que ainda sou menino, sei que as coisas podem ser diferentes. Em primeiro lugar, é você que terá a responsabilidade de comandar todos esses meninos. Não você dando ordens, mas agindo por trás, às escondidas para que tudo dê certo. E isso é muito fácil e á assim que vai funcionar: Use de suas forças e poderes mágicos para ter sempre ao seu lado, lá na torre, aqueles seres mágicos ou encantados que você tanto conhece. Esses danadinhos, que são muito afoitos e brincalhões, porém destemidos, acompanharão meus auxiliares, com cada um acompanhando um menino, de modo que os menores não percebam que suas ações são influenciadas e até comandadas por outros seres. De repente, cada um vai ficar até mesmo surpreso com o que é capaz de fazer e tomará coragem para fazer muito mais. É assim que deve funcionar. Em segundo... – E foi interrompido por Bernal, que estava inquieto.
- Mas isso é loucura pequeno rei. Às vezes esses seres mágicos são incontroláveis e podendo comandar as ações de um menino certamente que farão muito mais maluquices do que a gente pode imaginar, colocando até mesmo o reinado em risco. Certa vez....
- Está decido e vai ser assim, palavra de rei, e nem pense em fazer diferente do que estou mandando. Mas, em segundo lugar, quero que me traga aquele presente estranho que me foi enviando por não sei quem. Traga agora mesmo porque quero abrir aquela caixa pra ver o que tem dentro. Leve para a sala dos despachos ao lado, aqui não, que não é pra atiçar a atenção desses bisbilhoteiros beberrões.
Não demorou dois minutos e o feiticeiro já estava na sala indicada acenando para o rei, que havia acabado de dar um murro nas costas do velho sacerdote, que estava se engasgando com a boca cheia de pernil. Assim que o homem da igreja se recuperou do susto e já ia cambaleante novamente em direção aos assados e ao vinho, Gustavo correu em direção ao feiticeiro. Seria o momento de desvendar o que significava aquele inesperado presente.
continua...
Advogado e poeta
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