NO REINO DO REI MENINO – XII

NO REINO DO REI MENINO – XII

Rangel Alves da Costa*

A Coroa Real do Reino de Oninem estava lá fulgurante, irradiando história e riqueza, a mais perfeita demonstração de poder, toda feita de ouro escocês, pesando 910 gramas, com 31,5 centímetros de altura e possuindo ao todo mais de 3000 jóias, entre os quais a safira, o rubi "Príncipe Negro"; e o mais precioso de todos, o diamante africano "Collinan II". Havia ainda nesta coroa outras 2800 gemas entre pedras preciosas e pérolas. Repousavam sobre ela pérolas brancas, jacintos, topazes brancas, carbúnclos, quartzos, ametistas e diamantes.

Nos preparativos para uma eventual necessidade de fuga, o então rei Lucius sempre priorizou a coroa real como o seu mais precioso troféu. Estava tão bem escondida junto às outras jóias e preciosidades e em local tão estratégico, que não haveria como esquecê-la no momento que fosse embarcar sua fortuna. No instante da partida, para que não restasse dúvida, decidiu colocá-la ao seu lado na carruagem. Chegando aos tropeços e atropelos ao seu destino, num pequenino reino de um amigo reconhecidamente mal-afamado, desembarcou feliz com suas preciosidades. No entanto, não durou muito e o pequeno baú onde se encontrava a coroa foi encontrado aberto e nada dentro dela foi encontrado. A coroa havia simplesmente sumido. Virou e revirou seus aposentos e nada de encontrá-la, até que entrou pela janela um pequeno bilhete, trazido pelo vento, com os seguintes dizeres: Não adianta procurar. A coroa é do rei e o rei a usará. Logo imaginou que aquilo tudo era armação do seu amigo mal-afamado, e desde então passou a ter como seu principal objetivo recuperar, onde estivesse e com quem estivesse, a fortuna representada na coroa.

Mas a coroa agora estava ali, no seu devido lugar, à espera do momento em que o seu legítimo detentor celebraria o alcance maior do poder real, que era a coroação. Mais uma vez Bernal sabia quem estava por trás da aparição repentina daquela preciosidade, pois pôde enxergar no espelho as figuras sorridentes de Igor, um dos mais poderosos gnomos, e Rimon, um duende que habita as margens dos rios. Melhor assim, pensou.

Ao redor do castelo e nas proximidades da igreja a agitação era uma só, tamanho era o número de pessoas indo e vindo, com feições alegres e ares de contentamento. O branco e o lilás ornamentavam o castelo e a igreja. As bandeirolas tremulando nos mastros por toda parte davam a impressão de que o Reino de Oninem retomava de vez o respeito por suas tradições.

A igreja, construída ao lado e no mesmo período do castelo, era pequena, porém de uma arquitetura magistral, toda ornada com objetos semipreciosos e trabalhada com madeira de cedro. Não haviam imagens sacras espalhadas pelo seu interior ou no púlpito, pois todos os santos reverenciados estavam esculpidos na madeira e tomando conta das paredes, da abóbada e do altar. No centro deste, uma cruz imponente com o brasão do reino esculpido logo abaixo da imagem também esculpida de Cristo. Era a encarnação da fé que também daria uma nova vida a Oninem.

O lugar escolhido para a cerimônia, a capela real, garante, através da Igreja, a legitimidade da sagração e da coroação. Por meio da igreja, o soberano adentra o universo mítico-sobrenatural, tornando sacralizada a transmissão do poder. Por ser considerada um espaço sagrado e propício à comunicação divina, a igreja deve ser vista como autoridade na legitimação dos rituais. Assim era também em Oninem.

Na hora marcada, o pequeno Gustavo surgiu na porta principal do castelo, acompanhado somente de duas criadas. Havia sido um pedido seu, vez que Bernal afirmou categoricamente que não poderia acompanhá-lo naquele cortejo, pois teria que se ausentar por um breve momento. E assim seguiu o futuro rei, calmo e sorridente, acenando para a multidão que se aglomerava, no curto percurso entre a casa real e a casa que lhe eternizaria como soberano, que era a igreja.

Um velho serviçal de Deus fora chamado de muito longe, na arquidiocese-geral do País dos Voantes, para realizar a cerimônia de coroação de Gustavo Adnia Oneuqep, a partir de então chamado Gustavo de Oninem. Ao iniciar a cerimônia litúrgica, primeiro passo do ritual de coroação, a autoridade religiosa relatou apaixonadamente sobre as qualidades e virtudes do Reino de Oninem, seus corajosos soberanos e seu povo incansavelmente trabalhador. Diria isso em qualquer lugar que fosse e em qualquer cerimônia que realizasse. Contudo, no instante em que se daria o ato da coroação, o velho sacerdote se absteve de realizá-la e pediu para que chamassem o homem mais idoso daquele reino. E assim, ao chegar amparado por parentes, com um intenso brilho de alegria no olhar, não demorou muito e o velho Remígio estava pronunciando as seguintes palavras:

“Pela graça divina, pela eterna fé em Deus que sustenta e sustentará o Rei de Oninem, consagro-te, neste momento e que perdure por longos e longos anos, Gustavo Adnia Oneuqep, doravante Gustavo de Oninem, nosso rei e nosso protetor”.

Após fazer o juramento de fidelidade ao reino e ao seu povo, o pequeno rei começou a surpreender a todos. Decidiu não receber as insígnias reais, que eram a espada, representando a defesa da Igreja, a coroa, que simboliza a glória e a santidade, e o manto, simbolizando a proteção da realeza, e subiu no altar para falar. O velho sacerdote teve de ser amparado para não desmaiar; o povo ficou boquiaberto e de ouvidos atentos. Bernal, que estava na igreja mas ninguém podia ver, quase perde seu encantamento. O novo rei iria falar.

continua...

Advogado e poeta

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