Que presente!

Marcos estudou em colégio Salesiano. Após a morte do pai, a família transferiu-se para lugar distante da terra natal. A mudança afastou-o de suas primeiras amizades, das lembranças da infância e dos colegas de colégio, com quem dividia as horas a jogar futebol, seu passatempo predileto.

Sem o pai a garantir o sustento seu, da mãe e dos irmãos mais novos, assumiu a responsabilidade de manter a família. Foi obrigado a trabalhar ainda muito jovem. Tinha treze anos quando iniciou sua vida laboriosa, remunerada franciscanamente.

Trabalhava duro, porém se sentia dono de suas vontades, nem sempre exercidas como gostaria, pois a mãe era rígida na criação imposta aos filhos.

Passado algum tempo, já aos dezessete anos, idade em que Cupido influencia os corações jovens, ele conheceu Manuela, garota bonita, de porte delgado, filha de pequeno comerciante da cidade vizinha à sua.

O amor do casal era sólido, construído sobre fortes sentimentos de fidelidade e compreensão. O respeito mútuo marcava aquele enlace amoroso de maneira sublime, sem nada dever a paixão vivida por grandes amantes.

Por desejar firmar-se na vida, Marcos resolveu trabalhar em uma cidade maior, onde seriam oferecidas melhores oportunidades. Voltaria a estudar, pois pretendia obter diploma universitário, com o qual alcançaria a vitória.

A ausência imposta pelas circunstâncias provocava muita saudade, um sentimento melancólico que o fazia sofrer bastante. O rapaz sentia falta dos carinhos, da presença altiva e incomparavelmente bela da noivinha querida.

Próximo ao aniversário de Manuela, a saudade apertou-lhe o peito com maior intensidade. Esse sentimento de incompletude forçava a memória a relembrar momentos felizes, diferentes da angústia agora sentida pela privação da presença da futura esposa.

Marcos desejava ardentemente sentir-lhe o calor do corpo, o hálito quente e perfumado, as mãos macias a tocar-lhe a pele.

Para remediar a dor intensa, motivada pelo desejo não realizado, iria a uma loja comprar-lhe um presente de aniversário. A encomenda seria enviada pelos Correios, acompanhada de carta tão amorosa quanto verdadeira.

O rapaz foi à casa de modas e comprou um finíssimo lenço de seda italiana, bastante usado à época, peça de bom gosto que ornamentava o pescoço de jovens senhoritas e de senhoras de pouca idade.

Pediu à vendedora para colocá-lo em si mesma, para que pudesse imaginá-lo no lindo pescoço da noiva. O embrulho deveria ser feito com vistoso papel, ricamente colorido, com fios a ouro, de tal forma que impressionasse a amada e refletisse o amor que lhe dedicava.

De volta ao quarto da pensão, o enamorado rapaz apressou-se em redigir a cartinha que acompanharia o presente.

Dizia a missiva:

"Minha querida e inesquecível noiva, sendo hoje o dia de teu aniversário, não poderia deixar de enviar-te um presente, demonstrando o valor de nossa amizade. Meus olhos só vêem a ti em todas as horas da minha vida. Tua lembrança não se afasta de mim um só minuto. Receba este presente como prova do nosso infinito amor. Embora o que te mando não seja de teu costume usar, não tenho dúvidas de que ficará muito bem em ti. A vendedora experimentou-o em minha presença e, francamente, lhe ficou muito bem. Brevemente estaremos juntos e, então, confirmarei a deslumbrante visão que tenho de ti trajando esse lindo acessório. Abraço-te, com todo carinho e respeito. Teu noivo, perdidamente apaixonado: Marcos".

Manuela recebeu a correspondência e o presente. Abriu primeiramente a carta. Leu a missiva e tomou conhecimento do que dizia o noivo. Emocionada, secou duas lágrimas, levou o dedo indicador da mão direita ao nariz, inspirou profundamente, e abriu o pacote.

A surpresa a fez desmaiar.

Dentro da caixa, devidamente dobrada, uma linda calcinha de mulher exalava um perfume suave, de agradável doçura.

A vendedora enganara-se ao fazer o pacote.