Minha estória não é nada feliz. 
 
 
Na noite seguinte, fiz minha meditação e me veio a seguinte intuição:
“A pessoa a ser atendida não está conseguindo se expressar agora. Pedimos que deixe um papel e lápis ao lado de sua cama: poderemos acordá-la a qualquer momento.”

Fui então me deitar no horário de sempre e levei meu caderno e o lápis.
Acordei com uns estralinhos na cortina! O Jerry não estava. Acendi a luz de cabeceira e lembrei-me do caderno.
Que sono, meu Deus!
Mas senti que alguém precisava se expressar:
 
“Sofri e sofro ainda.
Não posso esquecer os momentos de dor pelos quais passei.
Eles voltam e voltam outra vez a repassar em minha memória.
Foram noites e noites mal dormidas, cheias de susto, medo e escuridão.

E agora dizem que morri, que não posso mais continuar a morar na minha casa, que há outra pessoa dormindo na minha cama, ao lado do meu marido.
Não posso acreditar, pois que aqui estou, viva como sempre e sentindo as mesmas dores.

Claro que ele continua o mesmo de sempre: insensível e mentiroso.
Não se engane: ele não é nada disso que aparenta ser.
Ele não é bonzinho, ele é duro!
Ele não gosta de ninguém, só dele mesmo!
E está contigo somente pelo prazer próprio.

Só depois de falar tudo isso sinto que posso acompanhar essa Luz que me atrai cada vez mais.
Vejo uma estrada iluminada; ela está me chamando, como se me atraísse.
Eu aqui sou a primeira de uma fila enorme, cujo fim não consigo ver.

Desculpe se a assustei, fazendo aqueles barulhinhos, mas foi o único jeito de você perceber a minha presença.
É estranho porque eu nunca aprendi esta Língua em que estamos escrevendo, mas tudo é muito estranho agora.

Não estou morta!
Mas também não estou viva, porque não consigo fazer as coisas que eu fazia antes, nem consigo encontrar meus familiares.

Aos poucos estou entendendo: estou numa situação intermediaria, entre o lá e o aqui; entre os dois mundos em que vivemos.

Aqui eu percebo tudo o que acontece aí: basta prestar atenção.
Mas a maior parte do tempo eu durmo e sinto que há pessoas cuidando de mim em um hospital diferente: não há paredes, estamos no meio de muitas plantas, como se fosse um campo de flores, ao ar livre.
Posso respirar um ar delicioso e perfumado.
E as enfermeiras não andam: deslizam.

Quando acordo e abro os olhos elas já vêm com grandes copos cheios de um líquido esfumaçante e borbulhante; dizem que é Suco Vital e me dão pequenos goles.
Então eu me levanto e vou caminhar entre as flores.
É lindo aqui, mas sinto a falta de tudo o que eu fazia aí, principalmente do jogo.

Então fico pensando na minha casa para ver se consigo retornar.

E quando menos espero estou aqui na cortina e tem alguém estranho dormindo na minha cama! Que esquisito! E quando eu me mexo, essa pessoa se assusta, acorda, fica muito nervosa e começa a rezar e chamar por ajuda.
Eu não quero assustar ninguém, só estou perdida: não sei para onde ir, nem o que fazer.

Mas agora estou vendo aquela Luz e parece que estão me chamando, como se pessoas muito queridas estivessem lá, me esperando com carinho.

Penso em ir, mas ao mesmo tempo alguma coisa ainda me prende aqui; penso no Jerry, penso nos meus filhos, netos, e em toda a família que ainda está deste lado.

Mas o que eu posso fazer por eles?

Estão me dizendo aqui que se eu for para o lado de lá, para onde me chamam, eu ficarei cada vez melhor e aí sim, quando eu vier para este lado de cá, poderei visitá-los e eles sentindo que estou bem, ficarão cada vez melhores. Só assim estarei ajudando-os: cuidando de ficar melhor comigo mesma.

Sim, estou entendendo melhor agora!

E sei que você que está ai na minha cama, escrevendo, que você pode ser minha amiga e que você pode ser boa para o Jerry também.

Desculpe-me se te perturbei; eu ainda estou toda atrapalhada, mas vou melhorar!

Vou tentar seguir por aquele caminho: estão me dizendo que se eu for logo poderei encontrar minhas irmãs!

Obrigada por escrever minhas palavras nessa sua linguagem estranha!
Você me ajudou!
Olivia.

Las Vegas, sexta-feira, 18 de setembro de 2009.
5h da manhã.

 continua...         

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Malu Thana Moraes
Enviado por Malu Thana Moraes em 27/10/2009
Reeditado em 18/04/2017
Código do texto: T1890662
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