DESTA VEZ NÃO DEU

Nosso caso pegava fogo: um tórrido romance virtual de 3 meses. Eu já recebera fotos, ela era uma belezura, inteligente, querida, tudo de bom. Chamava-se Trícia – diferente e emocionante. Era dia de conhecê-la. Fui buscá-la às 21 horas em ponto. Ela se atrasou só 10 minutos e apareceu como num videoclipe, vaporosa, vestido curto e pernas longas. Meu olho grudava na sua pele, mas logo me recuperava e me fazia apenas de simpático. Não queria parecer ansioso, muito menos agressivo. Fomos beber uns drinques, jantar, depois dançar. Como manda o figurino. Acho que bebemos demais: ela ficou indisposta e eu, mais ainda. Tentei atraí-la ao meu apartamento, creio que para cumprir o regulamento masculino, mas preferiu recolher-se. Voltamos a sair no sábado à noite, um cineminha básico. Um filme intimista francês. Adorei, mas ela odiou. Discutimos e tentei mudar de assunto. Sobre futebol, nem pensar: seu irmão jogava no Flamengo e sou Fluminense doente. Sobre trabalho, rápidas palavras – quase em fuga. Ela assessorava um deputado do PSTU e eu, filho único de fazendeiros, advogava para a UDR. Trícia detestava a vida do campo, curtia praia. Odeio calor e areia, passo os fins de semana na serra. A coisa toda estava ficando desconfortável. Ela já nem me parecia tão bonita, talvez lhe faltasse charme ou lhe sobrasse corpo, sei lá. Nem era muito inteligente. Aquele olhar escaldante de bela adormecida parecia agora estrábico e sua voz desafinava. Mas e os incansáveis papos virtuais que varavam as madrugadas? E a aquele impacto do encontro inaugural? Tentamos outra vez, alguns drinques, bocejos e nenhuma dança. Ficamos de nos mandar email, e, na despedida, um selinho insosso. Senti muita saudade da minha ampla cama de solteiro e corri ansioso para seu aconchego. No caminho, comprei duas latas de Coca light para aliviar a secura e loquei um filme americano de ação. Bem que eu achara que Trícia era um nome truncado.