Cilada

O copo cintilava em cima da pia. Veneno de rato dissolvido em suco de laranja. Que idiotice! Que importava o gosto? Eu ia morrer mesmo. O telefone me tirou dos pensamentos.Guardei o copo rapidamente no armário.

-Alô. Querida? Fui promovido!Vamos comemorar... Era Roberto, meu marido.

Conversei com naturalidade, não podia decepcioná-lo, em seguida, desliguei. Ia preparar um jantar de comemoração. O suicídio ia ficar para amanhã.

Desde que descobri que tinha Aids minha vida virou um inferno.Não podia ser um transtorno para a família. Roberto era um marido exemplar, meu filho Douglas, uma criança adorável e meu pai, o velho Alfredo, homem íntegro e amigo. Novamente o telefone.

-Alô.Dona Sonia Rebelo?

-Sim, eu mesma.Quem fala?

-Aqui é do laboratório Brasil. A senhora fez um exame de sangue há três dias. Os resultados foram trocados por um funcionário inexperiente. A senhora não está doente. Seu exame deu negativo.

Não escutei mais nada. Eu não ia morrer! Deus! Foi Deus que tirou aquele copo de minhas mãos.

Fiz um jantar inesquecível.Filé a milanesa como Douglas gostava.Arroz de forno, batatas grelhadas, vinho tinto e musica romântica.Eram 23 horas quando finalmente eu e Roberto ficamos a sós.Olhares cúmplices, atrevidos, correria, nosso joguinho começara. Pega-pega, roupas pelos cantos, gemidos.Parecia a melhor de todas as noites. Nossa melhor performance!

Amanheceu! Era domingo e o relógio batia dez badaladas. Olhei para o lado, Roberto já tinha levantado. Vesti o roupão branco e fui até a cozinha.

-Bom dia amor. Dormiu bem? Ele me deu seu melhor sorriso.

Meus três amores sentados à mesa do café.

-Olá papai, que bom vê-lo. Querido, por que não me acordou? Eu faria o café de vocês.

-Nada disso. Fizemos um bolo de chocolate. Venha, experimente. Está delicioso.

-Mamãe. Eu arrumei a mesa. É a toalha que você gosta.

-Senta filha, antes que o café esfrie.

Os copos limpos no armário.O armário...aberto. O copo. Deus! O copo de veneno em cima da mesa... Um restinho de líquido amarelo... Quase vazio... Vazio...

Me