NADA COMO UM SUSSURRO NO OUVIDO CERTO - sequência I

 

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Tantas foram as vezes que Rose Blue Thompson escreveu para Loretta, que até os seus serviçais já haviam aprendido aquela língua estranha, mas, eram ávidos por saber e Rose nunca escondeu seu passado deles, há que se saber que no início acharam um absurdo, uma safadeza a vida da patroa, mas, ela pagava muito bem e era extremamente adorável com eles. Também no fundo, no fundinho mesmo, Vitorina a mais nova das duas criadas bem queria ter a vida que Rose tivera, passou uns maus bocados, mas, foi muito valorizada, obteve poder e riqueza através de prazer e uma cabeça muito pensante uma vida assim lhe cairia muito bem.

Vitorina era bem fogosa e na sua brejeirice mineira, já havia dado um trato bem dado no jovem cavalariço Tonho Del, o nome na verdade era Antonio, mas, todos de onde eles vinham o chamavam assim, então, o apelido pegou. Caso Rose Blue não tivesse segurado as suas rédeas, Vitorina já estaria falada pelas estâncias da região, a bichinha só não ficava ruborizada quando aprontava alguma, porque era bem moreninha, quase cor de índia, bonitinha a danada. Já Tonho Del era belo, embora xucro como uma mula, mas, mais leal e vigilante do que um cão, tinha o corpo forte, a altura era acima do normal para os seus dezoito anos, uma verdadeira parede de músculos com cérebro pequeno, mas, Rose poderia ter contado com ele, como segurança, mas, não houve necessidade, sua vida em Minas Gerais fora contemplativa e calma.

Vitorina, sempre se correspondia com Loretta, a madame lhe orientava, pois recebera uma  dinheirama e ela, Tonho Del e Bené (Benetida a outra criada), ficaram morando na casa, meio que sem saber o que fazer com a herança recebida através de Rose Blue Thompson. Loretta ajudava como podia, mas, algumas notícias do Brasil que chegaram aos seus ouvidos, acenderam um luzinha dentro de sua cabeça efervescente, terras de muito ouro, café, novas estradas de ferro, trens luxuosos, muitas águas, ambiente prazeroso e crescente, prosperando a passos largos...um filial do Solar Blue no Brasil, em Minas Gerais...não seria uma má ideia, prazer com prazer, mas, para isso, precisava conhecer e sondar o lugar, pois sussurros precisam de ouvidos certos rssss...

Loretta combinou tudo com Vitorina, iria para Minas Gerais e lá conversariam, se organizou, deixou Suelen no comando de tudo, a garota fora bem treinada e já dera muitas provas de que se podia confiar nela, o legado de Rose estava se perpetuando. Fez as malas, mandou dinheiro para um correspondente bancário em Minas Gerais, separou os valores necessários para a viagem consigo, roupas para várias ocasiões, marcou a data e no dia, se vestiu com o melhor sorriso seguindo para o navio. A se julgar pelos olhares famintos do comandante e dos marujos, Loretta no auge dos seus quarenta e seis anos, estava gloriosa e ela tinha certeza disso.

A viagem demorada foi agradabilíssima, conheceu um abastado cafeicultor muito interessante, com uma esposa muito chata e carente, mas, a cabine de Loretta lhe trouxe uma calmaria relaxante na madrugada, por coincidência ele ia para uma cidade próxima a da saudosa Rose Blue, Loretta pensou...coincidência ou destino, um pequenino sussurro, uma inexperiência administrativa fingida e o primeiro elo ficou em stand by. O homem indicou o local de sua propriedade e Loretta disse onde iria visitar uma amiga. Quando saiu às escondidas da cabine, ele deixou na cabeceira dela um pepita de ouro do tamanho de uma noz, Loretta adorou e o achou bem generoso. Recusou à princípio, mas, ele insistiu tanto porque não aproveitar e agradecer com a carinha mais doce do mundo. Loretta sabia português o suficiente, então, logo que chegasse mandaria avaliar aquela pepita.

Vitorina estava aflita pela chegada de Loretta, enviara Tonho Del para encontrar com ela na estação de trens e já estava demorando um pouco para ele retornar, mas, logo avistou o carro. Loretta era realmente deslumbrante, será que um dia com um certo trato poderia ficar assim?

As duas se abraçaram, Vitorina fez uma bebida gelada para Loretta que por certo estaria afogueada, o clima em Londres era bem diferente. Assim que relaxou, ela quis conhecer a casa e Bené, porque em Tonho Del ela já tinha dado uma bela e demorada olhada, que pedaço de mau caminho!

A casa era grande com muitos quartos, toda avarandada, bem confortável, não tinha glamour como Londres, mas, não necessitaria de grandes reformas, só mesmo uma adequação ao negócio, caso fosse viável investir naquela região. O luxo ela mandaria vir de Londres, junto com duas das suas meninas, elas treinariam garotas da região, primeiro de tudo era conhecer a região, as pessoas certas e convencer Vitorina, Bené e Tonho Del a embarcarem na ideia dela, juntos eles poderiam ganhar muito com isso. A viagem fora longa, então, era melhor descansar pois o dia seguinte, seria de muitos passeios e observações.

A cidade era adorável, o café da manhã com pães de queijo e goiabada, doce de leite e um café delicioso, nada parecido com o que já experimentara, foi saboroso. Os petiscos da terra e algumas iguarias mais refinadas, cobradas a peso de ouro fariam um cardápio delicioso, tal qual o ‘menu’ de ‘serviços adicionais’ das meninas. A beleza e a imponência de Loretta atraiu olhares e logo um prefeitinho nervoso e suarento, curioso com a recém chegada, se apresentou. A londrina sagaz, no mesmo instante enxergou ali um aliado, forte para os seus propósitos e fraco, para aceitar facilmente os sussurros.

Quando a cidade é pequena um fato pequenino vira notícia instantaneamente, apareceu o delegado, o pároco e a esposa do juiz que mais parecia uma árvore de natal, por ter sobre o corpo muitas joias brilhantes, seu gosto farto por poder e dinheiro poderia ser útil para Loretta. O delegado era do tipo que não podia ver uma mulher bonita, rodeou a forasteira e Vitorina que estava muito bem vestida, parecia um galo cercando as galinhas no terreiro, o sujeitinho iria precisar de um trato bem dado por suas meninas, depois viraria um alvo de sussurro bem domesticado. O pároco talvez fosse um problema, mas, os segredos de confissões são sagrados e recebendo generosas contribuições mensais para a igreja, fariam com que ele esquecesse todos pecados confessados por Loreta, com crédito para os que se seguiriam.

A tardinha chegou rápido, voltaram para casa, Loreta queria conhecer quem administrava a estrada de ferro, talvez alguns cafeicultores e pelo menos um garimpo, tinha muitos planos fervilhando na cabeça e Vitorina já estava se inteirando do que ela iria propor, por dentro já tinha aprovado, mas, esperaria para saber a ideia completa. Voejava em sua cabeça um nome para o lugar, Solar D’Ouro Negro, afinal o café era considerado ouro negro.

 

 

 

 

 

 

 

* A primeira parte deste conto tem o mesmo nome e indico a leitura para melhor entendimento, serão três partes.

 

* imagem de    www1.folha.uol.com..br

Cristina Gaspar
Enviado por Cristina Gaspar em 04/02/2022
Reeditado em 06/02/2022
Código do texto: T7444961
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